“ENFRENTAR AS MILICIAS É DEFENDER A DEMOCRACIA. “
Marcelo Freixo
Deputado Estadual (PSOL-RJ)
"UMA IDEIA TORNA-SE UMA FORÇA MATERIAL QUANDO GANHA AS MASSAS ORGANIZADAS".
Karl Marx
terça-feira, 23 de novembro de 2010
Por que as UPPs não chegam para todos?
Segurança Pessoal e Direitos Humanos
Marcelo Freixo
Sex, 12 de novembro de 2010 11:05
Marcelo Freixo
O que me traz a essa tribuna é um tema que voltou à pauta. Mas não voltou à pauta em função das políticas públicas, em função das ações de Governo. Voltou à pauta em função de um filme que faz muito sucesso hoje nos cinemas.
O tema das milícias, antes esquecido e, durante as eleições, pouco lembrado, voltou à pauta da sociedade. O filme Tropa de Elite 2 traz o tema da milícia novamente ao debate do Rio de Janeiro e agora para o Brasil inteiro. Mais de oito milhões de espectadores já assistiram ao filme. É um recorde e, provavelmente, o será de todos os tempos se atingir 12 milhões de espectadores. Parabéns ao Padilha, aos atores e todos da produção, foi um belíssimo filme e uma belíssima contribuição.
Senhores Deputados, quero dizer que o tema das milícias foi muito discutido nesta Casa no ano de 2008. Em 5 de fevereiro de 2007 eu apresentei um requerimento para abertura de uma CPI para investigar a ação das milícias. Fevereiro de 2007. Nós só conseguimos abrir essa CPI em junho de 2008. A CPI sequer havia sido publicada nesta Casa, aliás, como está acontecendo agora com o meu pedido de CPI da área de Saúde que também não publicam. A Mesa Diretora atribui a si um papel que não tem: o de não publicar o pedido de um deputado feito nos trâmites legais da Casa.
Nós só conseguimos abrir a CPI que investigou a ação das milícias, depois que uma equipe do jornal O Dia foi barbaramente torturada na Favela do Batan. Depois que isso ocorreu, nós conseguimos, diante de uma pressão muito forte, principalmente dos meios de comunicação, abrir a CPI das Milícias.
Essa CPI levou seis meses. Nós a concluímos no dia 10 de dezembro de 2008. Nesse sentido, está aqui na minha mão um relatório, que e eu o trago a fim de retomar a memória do Parlamento. Tal relatório foi aprovado por unanimidade nesta Casa e tem, não apenas o mapa das milícias ou como elas funcionam, mas também quais são os seus braços econômicos, a relação do braço político com o braço econômico, o domínio de território.
É um relatório que foi uma belíssima contribuição do Poder Legislativo - não é do deputado a, b, ou c - para a sociedade. Não é à toa que é uma CPI que entra para a história do Parlamento, porque se nós pegarmos o cronograma das prisões dos milicianos, a CPI ganha muito valor.
No ano de 2006 foram presos cinco milicianos apenas. No ano de 2007, já no Governo Sérgio Cabral, foram presos apenas 24 milicianos, um número muito tímido para o primeiro ano de Governo. O ano de 2008 foi o ano da CPI, principalmente no segundo semestre o aumento de prisões é considerável, chegando a 78 no ano de 2008.
No ano de 2009, com o relatório já concluído e com a mudança muito substancial do olhar da opinião pública, esse número de prisões vai para 275. Então, saímos de 2007 com 24 para 275 prisões em 2009. É evidente o que muda a opinião pública, o que muda a situação das milícias no Rio de Janeiro é o trabalho feito pelo Poder Legislativo; foi a CPI, não foi um estalo de luz do Governador, não foi nenhum momento iluminado do Governador em que ele resolveu enfrentar as milícias. Ele foi levado a isso. Que bom!
A Draco, principalmente a Draco - Delegacia de Repressão do Crime Organizado - fez um belíssimo trabalho no enfrentamento às milícias, na investigação, valendo-se do relatório feito por este Parlamento.
Pois bem, desde o início avisávamos que as milícias tinham uma estrutura de máfia no Rio de Janeiro. Por quê? Agentes públicos dominando territórios, fazendo com que a sua lucratividade fosse enorme. Para que tenha uma ideia, só no domínio das vans, uma das milícias que conseguimos quebrar o sigilo e investigarmos, o faturamento era de 170 mil reais por dia - 170 mil reais por dia de faturamento de uma única milícia. Esse é o dinheiro que compra armas e que compra gente, que compra pessoas. O poder dessas milícias era crescente. E avisávamos desde aquele momento que não bastaria a prisão dos seus líderes, mesmo que fossem líderes importantes - um deputado, alguns vereadores.
Sabemos que as prisões foram prisões significativas dos líderes milicianos. Mas a milícia é uma estrutura de máfia, a milícia domina territórios e tem braços por dentro do Estado. Cansaram de nomear diretores de escolas, quem controlava Posto de Saúde. A milícia é o crime organizado por dentro do Estado. Aliás, crime organizado em qualquer lugar do mundo é sempre dentro do Estado, não é fora. E nesse sentido apontávamos que não bastaria a prisão dos líderes.
Esse relatório da CPI, o relatório aprovado aqui na Assembleia Legislativa tem 58 propostas concretas para o enfrentamento das milícias. Cinquenta e oito propostas! Esse é um documento que pertence a todos os deputados, esse documento pertence ao Estado, é um documento do Poder Legislativo aprovado nesta Casa. Essas 58 propostas não foram cumpridas pelo governo estadual.
Não adianta o Governador Sérgio Cabral dizer que enfrenta as milícias, que enfrentou as milícias, que o filme Tropa de Elite 2 não é dos dias de hoje e sim dos dias de ontem porque os líderes foram presos. É verdade que os líderes foram presos, mas isso não basta e as milícias continuam crescendo. O número de milícias hoje no Rio de Janeiro é maior do que havia na época da CPI. O número de territórios dominados por milícias hoje é maior do que o número de territórios dominados pelo varejo da droga. A milícia é o que há de mais organizado em termos de crime que está colocado nas ruas do Rio de Janeiro. É máfia, é estrutura de máfia, tem projeto de poder. É verdade que não conseguiram ter bom resultado nessa eleição porque a sua imagem pública foi muito desgastada, porque o discurso moralista do mal menor se desfez, mas os seus braços econômicos continuam mantidos.
Este relatório foi entregue pelos membros da CPI, Deputado Luiz Paulo, nas mãos do Prefeito Eduardo Paes. Solicitamos ao Prefeito Eduardo Paes que a licitação das vans fosse feita individualmente e não por cooperativas. O Prefeito acaba de fazer licitação por cooperativas e não individualmente.
Solicitamos que a Agência Nacional de Petróleo que é responsável pela fiscalização da distribuição do gás ampliasse a sua rede de fiscais.
Deputados Rodrigo Neves e Luiz Paulo, sabem quantos fiscais da Agência Nacional de Petróleo trabalham no Rio de Janeiro? Cinco. Cinco fiscais! Isso é uma piada. A Agência Nacional de Petróleo tem enorme responsabilidade sobre o crescimento das milícias porque, afinal de contas, o braço do controle, da distribuição e da venda dos botijões de gás é importantíssimo.
A milícia é um projeto econômico, a milícia é um projeto financeiro, não é um grupo de justiceiros. Nesse sentido se não cortarmos os braços econômicos eles não serão vencidos, vão continuar crescendo e não adianta o Governador falar meia verdade, dizendo que os líderes foram presos. Foram presos e as milícias continuam muito bem, obrigado. Continuam funcionando, continuam ampliando nos territórios, continuam matando gente à luz do dia. As Zonas Oeste e a Norte estão completamente dominadas pelas milícias.
Nesse sentido acho que a responsabilidade da cobrança sobre o Governador é de todo Parlamento, porque esse é um relatório que não pertence aos deputados que fizeram parte da CPI. Esse relatório pertence ao Poder Legislativo, foi aprovado por todos os deputados desta legislatura. Por todos: não houve qualquer voto contrário. Então, nesse sentido nós, do Poder Legislativo, temos que cobrar do Governador, para o bem da democracia e para o bem do estado democrático de direito.
É inadmissível o que está acontecendo, enquanto o Governador finge que as milícias não existem e diz que isso é coisa do passado, porque suas lideranças foram presas. Foram presas porque houve um belo trabalho do Parlamento e porque houve um belo trabalho da Delegacia de Repressão ao Crime Organizado. Mas continuam funcionando. E vão crescer e vão voltar a eleger pessoas no Rio de Janeiro. Vão voltar a eleger pessoas no Rio de Janeiro. Não conseguiram desta vez porque o desgaste ainda é muito recente. Mas vão voltar a eleger políticos no Rio de Janeiro. É uma questão de tempo.
E nesse sentido é bom dizer que o projeto das UPPs de longe não resolve o problema. E me estranha muito o Governador tentar simplificar o debate sobre Segurança Pública, dizendo que o Rio de Janeiro é outro porque tem UPPs. São mais de mil favelas no Rio e as UPPs não chegam a 13 delas.
Eu estive hoje no Chapéu Mangueira e na Babilônia. Além da polícia, não há lá qualquer braço do Estado. A creche mal funciona, com o salário atrasado das professoras, o que a Prefeitura não assume. O posto de saúde não tem nenhum médico, nenhum dentista da rede pública do Estado. É mais uma vez a lógica exclusiva da polícia nas favelas - e somente a polícia.
O mapa das UPPs é revelador, o setor hoteleiro da Zona Sul, o entorno do Maracanã, a Zona Portuária e a Cidade de Deus - única área dominada pelo tráfico em toda Jacarepaguá, que tem o domínio hegemônico das milícias.
A UPP é um projeto de cidade. A UPP é um projeto que viabiliza um Rio de Janeiro desejado para os Jogos Olímpicos, onde determinados territórios são escolhidos para um projeto de cidade. Não é um projeto de Segurança Pública! E eu estranho o silêncio desse governo em relação às milícias, dizendo que o Rio está pacificado, diante do crescimento das milícias.
E por quê? Por que, indiretamente, nas entrelinhas, o Governador voltou a acreditar que as milícias representam um mal menor? É isso que está sendo dito, porque as UPPs não chegaram às áreas de milícia? Isso o Governador vai ter que explicar. E a gente está aqui para cobrar.
[Pronunciamento de Marcelo Freixo no plenário da ALERJ na terça-feira, 9 de novenbro de 2010]
Marcelo Freixo é professor e deputado estadual (PSol-RJ)
Marcelo Freixo
Sex, 12 de novembro de 2010 11:05
Marcelo Freixo
O que me traz a essa tribuna é um tema que voltou à pauta. Mas não voltou à pauta em função das políticas públicas, em função das ações de Governo. Voltou à pauta em função de um filme que faz muito sucesso hoje nos cinemas.
O tema das milícias, antes esquecido e, durante as eleições, pouco lembrado, voltou à pauta da sociedade. O filme Tropa de Elite 2 traz o tema da milícia novamente ao debate do Rio de Janeiro e agora para o Brasil inteiro. Mais de oito milhões de espectadores já assistiram ao filme. É um recorde e, provavelmente, o será de todos os tempos se atingir 12 milhões de espectadores. Parabéns ao Padilha, aos atores e todos da produção, foi um belíssimo filme e uma belíssima contribuição.
Senhores Deputados, quero dizer que o tema das milícias foi muito discutido nesta Casa no ano de 2008. Em 5 de fevereiro de 2007 eu apresentei um requerimento para abertura de uma CPI para investigar a ação das milícias. Fevereiro de 2007. Nós só conseguimos abrir essa CPI em junho de 2008. A CPI sequer havia sido publicada nesta Casa, aliás, como está acontecendo agora com o meu pedido de CPI da área de Saúde que também não publicam. A Mesa Diretora atribui a si um papel que não tem: o de não publicar o pedido de um deputado feito nos trâmites legais da Casa.
Nós só conseguimos abrir a CPI que investigou a ação das milícias, depois que uma equipe do jornal O Dia foi barbaramente torturada na Favela do Batan. Depois que isso ocorreu, nós conseguimos, diante de uma pressão muito forte, principalmente dos meios de comunicação, abrir a CPI das Milícias.
Essa CPI levou seis meses. Nós a concluímos no dia 10 de dezembro de 2008. Nesse sentido, está aqui na minha mão um relatório, que e eu o trago a fim de retomar a memória do Parlamento. Tal relatório foi aprovado por unanimidade nesta Casa e tem, não apenas o mapa das milícias ou como elas funcionam, mas também quais são os seus braços econômicos, a relação do braço político com o braço econômico, o domínio de território.
É um relatório que foi uma belíssima contribuição do Poder Legislativo - não é do deputado a, b, ou c - para a sociedade. Não é à toa que é uma CPI que entra para a história do Parlamento, porque se nós pegarmos o cronograma das prisões dos milicianos, a CPI ganha muito valor.
No ano de 2006 foram presos cinco milicianos apenas. No ano de 2007, já no Governo Sérgio Cabral, foram presos apenas 24 milicianos, um número muito tímido para o primeiro ano de Governo. O ano de 2008 foi o ano da CPI, principalmente no segundo semestre o aumento de prisões é considerável, chegando a 78 no ano de 2008.
No ano de 2009, com o relatório já concluído e com a mudança muito substancial do olhar da opinião pública, esse número de prisões vai para 275. Então, saímos de 2007 com 24 para 275 prisões em 2009. É evidente o que muda a opinião pública, o que muda a situação das milícias no Rio de Janeiro é o trabalho feito pelo Poder Legislativo; foi a CPI, não foi um estalo de luz do Governador, não foi nenhum momento iluminado do Governador em que ele resolveu enfrentar as milícias. Ele foi levado a isso. Que bom!
A Draco, principalmente a Draco - Delegacia de Repressão do Crime Organizado - fez um belíssimo trabalho no enfrentamento às milícias, na investigação, valendo-se do relatório feito por este Parlamento.
Pois bem, desde o início avisávamos que as milícias tinham uma estrutura de máfia no Rio de Janeiro. Por quê? Agentes públicos dominando territórios, fazendo com que a sua lucratividade fosse enorme. Para que tenha uma ideia, só no domínio das vans, uma das milícias que conseguimos quebrar o sigilo e investigarmos, o faturamento era de 170 mil reais por dia - 170 mil reais por dia de faturamento de uma única milícia. Esse é o dinheiro que compra armas e que compra gente, que compra pessoas. O poder dessas milícias era crescente. E avisávamos desde aquele momento que não bastaria a prisão dos seus líderes, mesmo que fossem líderes importantes - um deputado, alguns vereadores.
Sabemos que as prisões foram prisões significativas dos líderes milicianos. Mas a milícia é uma estrutura de máfia, a milícia domina territórios e tem braços por dentro do Estado. Cansaram de nomear diretores de escolas, quem controlava Posto de Saúde. A milícia é o crime organizado por dentro do Estado. Aliás, crime organizado em qualquer lugar do mundo é sempre dentro do Estado, não é fora. E nesse sentido apontávamos que não bastaria a prisão dos líderes.
Esse relatório da CPI, o relatório aprovado aqui na Assembleia Legislativa tem 58 propostas concretas para o enfrentamento das milícias. Cinquenta e oito propostas! Esse é um documento que pertence a todos os deputados, esse documento pertence ao Estado, é um documento do Poder Legislativo aprovado nesta Casa. Essas 58 propostas não foram cumpridas pelo governo estadual.
Não adianta o Governador Sérgio Cabral dizer que enfrenta as milícias, que enfrentou as milícias, que o filme Tropa de Elite 2 não é dos dias de hoje e sim dos dias de ontem porque os líderes foram presos. É verdade que os líderes foram presos, mas isso não basta e as milícias continuam crescendo. O número de milícias hoje no Rio de Janeiro é maior do que havia na época da CPI. O número de territórios dominados por milícias hoje é maior do que o número de territórios dominados pelo varejo da droga. A milícia é o que há de mais organizado em termos de crime que está colocado nas ruas do Rio de Janeiro. É máfia, é estrutura de máfia, tem projeto de poder. É verdade que não conseguiram ter bom resultado nessa eleição porque a sua imagem pública foi muito desgastada, porque o discurso moralista do mal menor se desfez, mas os seus braços econômicos continuam mantidos.
Este relatório foi entregue pelos membros da CPI, Deputado Luiz Paulo, nas mãos do Prefeito Eduardo Paes. Solicitamos ao Prefeito Eduardo Paes que a licitação das vans fosse feita individualmente e não por cooperativas. O Prefeito acaba de fazer licitação por cooperativas e não individualmente.
Solicitamos que a Agência Nacional de Petróleo que é responsável pela fiscalização da distribuição do gás ampliasse a sua rede de fiscais.
Deputados Rodrigo Neves e Luiz Paulo, sabem quantos fiscais da Agência Nacional de Petróleo trabalham no Rio de Janeiro? Cinco. Cinco fiscais! Isso é uma piada. A Agência Nacional de Petróleo tem enorme responsabilidade sobre o crescimento das milícias porque, afinal de contas, o braço do controle, da distribuição e da venda dos botijões de gás é importantíssimo.
A milícia é um projeto econômico, a milícia é um projeto financeiro, não é um grupo de justiceiros. Nesse sentido se não cortarmos os braços econômicos eles não serão vencidos, vão continuar crescendo e não adianta o Governador falar meia verdade, dizendo que os líderes foram presos. Foram presos e as milícias continuam muito bem, obrigado. Continuam funcionando, continuam ampliando nos territórios, continuam matando gente à luz do dia. As Zonas Oeste e a Norte estão completamente dominadas pelas milícias.
Nesse sentido acho que a responsabilidade da cobrança sobre o Governador é de todo Parlamento, porque esse é um relatório que não pertence aos deputados que fizeram parte da CPI. Esse relatório pertence ao Poder Legislativo, foi aprovado por todos os deputados desta legislatura. Por todos: não houve qualquer voto contrário. Então, nesse sentido nós, do Poder Legislativo, temos que cobrar do Governador, para o bem da democracia e para o bem do estado democrático de direito.
É inadmissível o que está acontecendo, enquanto o Governador finge que as milícias não existem e diz que isso é coisa do passado, porque suas lideranças foram presas. Foram presas porque houve um belo trabalho do Parlamento e porque houve um belo trabalho da Delegacia de Repressão ao Crime Organizado. Mas continuam funcionando. E vão crescer e vão voltar a eleger pessoas no Rio de Janeiro. Vão voltar a eleger pessoas no Rio de Janeiro. Não conseguiram desta vez porque o desgaste ainda é muito recente. Mas vão voltar a eleger políticos no Rio de Janeiro. É uma questão de tempo.
E nesse sentido é bom dizer que o projeto das UPPs de longe não resolve o problema. E me estranha muito o Governador tentar simplificar o debate sobre Segurança Pública, dizendo que o Rio de Janeiro é outro porque tem UPPs. São mais de mil favelas no Rio e as UPPs não chegam a 13 delas.
Eu estive hoje no Chapéu Mangueira e na Babilônia. Além da polícia, não há lá qualquer braço do Estado. A creche mal funciona, com o salário atrasado das professoras, o que a Prefeitura não assume. O posto de saúde não tem nenhum médico, nenhum dentista da rede pública do Estado. É mais uma vez a lógica exclusiva da polícia nas favelas - e somente a polícia.
O mapa das UPPs é revelador, o setor hoteleiro da Zona Sul, o entorno do Maracanã, a Zona Portuária e a Cidade de Deus - única área dominada pelo tráfico em toda Jacarepaguá, que tem o domínio hegemônico das milícias.
A UPP é um projeto de cidade. A UPP é um projeto que viabiliza um Rio de Janeiro desejado para os Jogos Olímpicos, onde determinados territórios são escolhidos para um projeto de cidade. Não é um projeto de Segurança Pública! E eu estranho o silêncio desse governo em relação às milícias, dizendo que o Rio está pacificado, diante do crescimento das milícias.
E por quê? Por que, indiretamente, nas entrelinhas, o Governador voltou a acreditar que as milícias representam um mal menor? É isso que está sendo dito, porque as UPPs não chegaram às áreas de milícia? Isso o Governador vai ter que explicar. E a gente está aqui para cobrar.
[Pronunciamento de Marcelo Freixo no plenário da ALERJ na terça-feira, 9 de novenbro de 2010]
Marcelo Freixo é professor e deputado estadual (PSol-RJ)
terça-feira, 9 de novembro de 2010
A herança de Dilma
Economia e Infra-Estrutura
Paulo Passarinho
Qui, 04 de novembro de 2010 16:43
Paulo Passarinho
"Rei morto, rei posto". A frase, pronunciada por Lula, foi dita pelo atual presidente para marcar a mudança que a vitória de Dilma Rousseff representa, e para afastar as especulações sobre opiniões que indicam que ele, Lula, poderia se comportar como uma espécie de "sombra" da presidente eleita.
É um esclarecimento importante, pois de fato as responsabilidades de Dilma são enormes, especialmente em decorrência da herança que Lula lhe deixa.
A principal questão emergencial a merecer a atenção de Dilma é a valorização do Real. Lula e Dilma, na recente entrevista coletiva que concederam, jogaram a responsabilidade pela tal "guerra cambial" nas costas dos Estados Unidos e da China. E afirmaram apostar na próxima reunião do G-20, em Seul, para procurar encontrar uma saída negociada e coordenada para a desvalorização acentuada do dólar, em relação às moedas de grande parte dos países.
Dilma foi além, e já declarou ser contrária a medidas unilaterais que desvalorizam artificialmente as moedas. A alternativa, em estudo pelo governo, caso a reunião do G-20 fracasse, seria a adoção de mecanismos de antidumping - de defesa comercial.
Seria bom à Dilma, e ao país, refletir com um pouco mais de profundidade sobre esse assunto. Até porque, isso lhe permitiria repensar o conjunto da política econômica.
Valorização de nossa moeda e juros reais elevados são características quase estruturais do modelo implantado na economia brasileira, desde os anos noventa. Apostar na abertura financeira, e ampliá-la, como feito por Lula, em um regime de câmbio flutuante, subordina a política monetária, e a política fiscal, aos humores e pressões do capital especulativo de brasileiros e de estrangeiros. Em um contexto de alta liquidez externa e de incertezas generalizadas nos países centrais do capitalismo, a periferia dócil e garantidora de lucros fáceis é mais do que uma opção de investimento, é uma verdadeira salvação. Para os capitais externos, bem esclarecido. Pois, para nós, brasileiros, a conta vai ficando insuportável.
O problema é que Dilma já repetiu o mantra mais ao gosto da piranhagem financeira: câmbio flutuante, equilíbrio fiscal e controle da inflação. Rei morto, rei posto, e a mesma dinastia a comandar os nossos destinos...
Enquanto a nossa presidente eleita aposta em soluções para o problema da nossa moeda em fóruns multilaterais, os Estados Unidos, de forma soberana, continuam a assumir medidas voltadas ao seu próprio interesse. É o caso, por exemplo, do anúncio feito pelo Banco Central americano de comprar US$ 600 bilhões em títulos, com o objetivo de irrigar a sua economia com mais dinheiro. Independentemente de ser essa uma medida adequada aos dilemas da maior economia do mundo, o problema é que possivelmente teremos uma pressão ainda maior de entrada de recursos em dólar, por aqui. E isso fará com que nossa moeda continue em sua trajetória de valorização...
Portanto, pensar em medidas unilaterais é uma necessidade premente para o país, caso Dilma queira enfrentar esse problema.
Mas, há outras armadilhas. Equilíbrio fiscal, por exemplo, poderia ser buscado através de um processo gradativo, mas contínuo e decidido, de redução das taxas reais de juros. Porém, essa hipótese - da redução da taxa de juros -, dentro da visão defendida até agora pelo governo, fica condicionada à prévia redução dos gastos públicos, especialmente dos gastos correntes, para que se abra espaço para a manutenção e ampliação dos gastos em investimentos. "Mas, recusamos as visões de ajustes que recaem sobre os programas sociais, os serviços essenciais à população e os necessários investimentos", afirmou Dilma. Cabe, então, a pergunta: onde poderiam ocorrer esses ajustes? Através de uma nova rodada de contra-reformas na área previdenciária? Em algum mecanismo voltado para a definição de metas de expansão dos gastos correntes, em particular nas despesas com o pagamento dos vencimentos do funcionalismo? Afirma-se que o governo Lula já recuperou as pesadas perdas salariais impostas aos servidores pelo governo FHC. Entretanto, além desse fato não ser confirmado para muitas categorias, há ainda a necessidade de se dar sequência à justa política de novos concursos, colocada em prática pelo atual governo. Como ficaria, então, os tais cortes de despesas que poderiam viabilizar, posteriormente, a redução da taxa de juros?
A saída poderia se situar na manutenção das atuais taxas de crescimento da economia, implicando elevação das receitas tributárias e uma maior folga orçamentária. Contudo, nesse ponto, voltamos ao problema externo. A atual dinâmica de crescimento da economia - com abertura financeira, câmbio flutuante, e altas taxas de juros - impõe a valorização do Real, o barateamento e crescimento das importações, e a perigosa redução do saldo comercial do país. O Brasil volta a ficar refém dos capitais externos para fechar as suas contas com o exterior, com mais desnacionalização do parque produtivo, maior participação de capitais especulativos na dívida pública e em bolsa de valores, e maior vulnerabilidade externa frente a qualquer turbulência financeira que estabeleça uma abrupta reversão de expectativas e uma rápida saída desses capitais para fora do país.
Por isso, caso Dilma queira superar a herança de Lula, enfrentar o que o seu criador não topou seria inevitável.
Para erradicar a miséria, conforme o seu desejo, e gerar empregos de qualidade no país, com ênfase em um projeto que de fato se assente em uma economia doméstica diversificada e sob comando de setores brasileiros - única forma de internalizarmos um processo virtuoso de geração de tecnologia e conhecimento científico, sob nosso controle, e com o aporte educacional necessário para um processo dessa natureza - somente com coragem para mudar o atual modelo econômico.
Para tanto, Dilma precisaria substituir o atual comando do Banco Central, adotar mecanismos de controle sobre a movimentação de capitais externos, abolir a política fiscal baseada nas metas de superávit primário e abrir espaço no orçamento público, através da redução da taxa de juros e da reestruturação dos termos de refinanciamento da dívida pública interna, para o aumento dos gastos públicos, em particular dos investimentos.
Poderia Dilma assumir um programa dessa natureza? Valter Pomar, dirigente nacional do PT, e líder de uma de suas correntes de esquerda, acredita que Henrique Meireles esteja com os seus dias contados, a frente do Banco Central. Em entrevista ao Programa Faixa Livre, ele declarou que Dilma irá compor uma equipe econômica mais homogênea, mais à feição da linha desenvolvimentista, existente hoje, segundo o próprio Pomar, na área do ministério da Fazenda.
Seria um primeiro passo, ainda que insuficiente. O problema não se situa apenas nos quadros dirigentes, mas na opção política a ser adotada. E, nesse caso, exorcizar o mantra financista, a verdadeira herança maldita que nos sufoca como nação independente, seria o mais relevante.
04/11/2010
Paulo Passarinho é economista e conselheiro do CORECON-RJ
Paulo Passarinho
Qui, 04 de novembro de 2010 16:43
Paulo Passarinho
"Rei morto, rei posto". A frase, pronunciada por Lula, foi dita pelo atual presidente para marcar a mudança que a vitória de Dilma Rousseff representa, e para afastar as especulações sobre opiniões que indicam que ele, Lula, poderia se comportar como uma espécie de "sombra" da presidente eleita.
É um esclarecimento importante, pois de fato as responsabilidades de Dilma são enormes, especialmente em decorrência da herança que Lula lhe deixa.
A principal questão emergencial a merecer a atenção de Dilma é a valorização do Real. Lula e Dilma, na recente entrevista coletiva que concederam, jogaram a responsabilidade pela tal "guerra cambial" nas costas dos Estados Unidos e da China. E afirmaram apostar na próxima reunião do G-20, em Seul, para procurar encontrar uma saída negociada e coordenada para a desvalorização acentuada do dólar, em relação às moedas de grande parte dos países.
Dilma foi além, e já declarou ser contrária a medidas unilaterais que desvalorizam artificialmente as moedas. A alternativa, em estudo pelo governo, caso a reunião do G-20 fracasse, seria a adoção de mecanismos de antidumping - de defesa comercial.
Seria bom à Dilma, e ao país, refletir com um pouco mais de profundidade sobre esse assunto. Até porque, isso lhe permitiria repensar o conjunto da política econômica.
Valorização de nossa moeda e juros reais elevados são características quase estruturais do modelo implantado na economia brasileira, desde os anos noventa. Apostar na abertura financeira, e ampliá-la, como feito por Lula, em um regime de câmbio flutuante, subordina a política monetária, e a política fiscal, aos humores e pressões do capital especulativo de brasileiros e de estrangeiros. Em um contexto de alta liquidez externa e de incertezas generalizadas nos países centrais do capitalismo, a periferia dócil e garantidora de lucros fáceis é mais do que uma opção de investimento, é uma verdadeira salvação. Para os capitais externos, bem esclarecido. Pois, para nós, brasileiros, a conta vai ficando insuportável.
O problema é que Dilma já repetiu o mantra mais ao gosto da piranhagem financeira: câmbio flutuante, equilíbrio fiscal e controle da inflação. Rei morto, rei posto, e a mesma dinastia a comandar os nossos destinos...
Enquanto a nossa presidente eleita aposta em soluções para o problema da nossa moeda em fóruns multilaterais, os Estados Unidos, de forma soberana, continuam a assumir medidas voltadas ao seu próprio interesse. É o caso, por exemplo, do anúncio feito pelo Banco Central americano de comprar US$ 600 bilhões em títulos, com o objetivo de irrigar a sua economia com mais dinheiro. Independentemente de ser essa uma medida adequada aos dilemas da maior economia do mundo, o problema é que possivelmente teremos uma pressão ainda maior de entrada de recursos em dólar, por aqui. E isso fará com que nossa moeda continue em sua trajetória de valorização...
Portanto, pensar em medidas unilaterais é uma necessidade premente para o país, caso Dilma queira enfrentar esse problema.
Mas, há outras armadilhas. Equilíbrio fiscal, por exemplo, poderia ser buscado através de um processo gradativo, mas contínuo e decidido, de redução das taxas reais de juros. Porém, essa hipótese - da redução da taxa de juros -, dentro da visão defendida até agora pelo governo, fica condicionada à prévia redução dos gastos públicos, especialmente dos gastos correntes, para que se abra espaço para a manutenção e ampliação dos gastos em investimentos. "Mas, recusamos as visões de ajustes que recaem sobre os programas sociais, os serviços essenciais à população e os necessários investimentos", afirmou Dilma. Cabe, então, a pergunta: onde poderiam ocorrer esses ajustes? Através de uma nova rodada de contra-reformas na área previdenciária? Em algum mecanismo voltado para a definição de metas de expansão dos gastos correntes, em particular nas despesas com o pagamento dos vencimentos do funcionalismo? Afirma-se que o governo Lula já recuperou as pesadas perdas salariais impostas aos servidores pelo governo FHC. Entretanto, além desse fato não ser confirmado para muitas categorias, há ainda a necessidade de se dar sequência à justa política de novos concursos, colocada em prática pelo atual governo. Como ficaria, então, os tais cortes de despesas que poderiam viabilizar, posteriormente, a redução da taxa de juros?
A saída poderia se situar na manutenção das atuais taxas de crescimento da economia, implicando elevação das receitas tributárias e uma maior folga orçamentária. Contudo, nesse ponto, voltamos ao problema externo. A atual dinâmica de crescimento da economia - com abertura financeira, câmbio flutuante, e altas taxas de juros - impõe a valorização do Real, o barateamento e crescimento das importações, e a perigosa redução do saldo comercial do país. O Brasil volta a ficar refém dos capitais externos para fechar as suas contas com o exterior, com mais desnacionalização do parque produtivo, maior participação de capitais especulativos na dívida pública e em bolsa de valores, e maior vulnerabilidade externa frente a qualquer turbulência financeira que estabeleça uma abrupta reversão de expectativas e uma rápida saída desses capitais para fora do país.
Por isso, caso Dilma queira superar a herança de Lula, enfrentar o que o seu criador não topou seria inevitável.
Para erradicar a miséria, conforme o seu desejo, e gerar empregos de qualidade no país, com ênfase em um projeto que de fato se assente em uma economia doméstica diversificada e sob comando de setores brasileiros - única forma de internalizarmos um processo virtuoso de geração de tecnologia e conhecimento científico, sob nosso controle, e com o aporte educacional necessário para um processo dessa natureza - somente com coragem para mudar o atual modelo econômico.
Para tanto, Dilma precisaria substituir o atual comando do Banco Central, adotar mecanismos de controle sobre a movimentação de capitais externos, abolir a política fiscal baseada nas metas de superávit primário e abrir espaço no orçamento público, através da redução da taxa de juros e da reestruturação dos termos de refinanciamento da dívida pública interna, para o aumento dos gastos públicos, em particular dos investimentos.
Poderia Dilma assumir um programa dessa natureza? Valter Pomar, dirigente nacional do PT, e líder de uma de suas correntes de esquerda, acredita que Henrique Meireles esteja com os seus dias contados, a frente do Banco Central. Em entrevista ao Programa Faixa Livre, ele declarou que Dilma irá compor uma equipe econômica mais homogênea, mais à feição da linha desenvolvimentista, existente hoje, segundo o próprio Pomar, na área do ministério da Fazenda.
Seria um primeiro passo, ainda que insuficiente. O problema não se situa apenas nos quadros dirigentes, mas na opção política a ser adotada. E, nesse caso, exorcizar o mantra financista, a verdadeira herança maldita que nos sufoca como nação independente, seria o mais relevante.
04/11/2010
Paulo Passarinho é economista e conselheiro do CORECON-RJ
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