quarta-feira, 30 de dezembro de 2009

POEMA DA SEMANA :

O ANALFABETO POLÍTICO


O pior analfabeto é o analfabeto político. Ele não ouve, não fala, nem participa dos acontecimentos políticos. Ele não sabe que o custo de vida, o preço do feijão, do peixe, da farinha, do aluguel, do sapato e do remédio dependem das decisões políticas.

O analfabeto político é tão burro que se orgulha e estufa o peito dizendo que odeia a política. Não sabe o imbecil que, da sua ignorância política, nasce a prostituta, o menor abandonado, e o pior de todos os bandidos, que é o político vigarista, pilantra, corrupto e lacaio das empresas nacionais e multinacionais.


Bertolt Brecht
Poeta e dramaturgo alemão

COP 15: Crônica de um fracasso anunciado

Ecologia
Fernanda Melchionna
Qui, 24 de dezembro de 2009 14:36


A Conferência de Copenhague foi acompanhada pelos povos do mundo inteiro com intensas expectativas, pois os prenúncios sobre o aquecimento global são dramáticos e suas conseqüências já podem ser sentidas na pele e na vida de milhões de pessoas. As inundações na África, os furacões nos EUA, os incêndios e as ondas de calor na Austrália, os vendavais, chuvas e estiagens no Brasil, o degelo das calotas polares do Ártico e da Antártida já são realidades em nosso planeta.

Apesar disso, a Conferência das Nações Unidas para as Mudanças Climáticas foi um fracasso. Nem mesmo produziu um documento para substituir o protocolo de Kyoto, que tem vigência até 2012 e ao qual os Estados Unidos não se submeteram, mesmo sendo este um tratado que considerava a poluição como mercadoria a ser comercializada, e tinha uma tímida meta de redução das emissões de gases poluentes (5,2% de diminuição em comparação com índices de 1990). Por outro lado, em Copenhague surgiu uma nova esperança, não dos governos capitalistas do Bella Center, mas das ruas da cidade. Todos os dias houve manifestações que possuíam como bandeira a luta em defesa do meio-ambiente combinada com a luta anticapitalista. No dia 12 de dezembro aconteceu a maior marcha, que reuniu em torno de 100 mil manifestantes, fazendo um necessário contraponto inoperância vista na COP-15. E esta é a novidade de Copenhague.

A depender dos governantes capitalistas que dominaram as decisões da cúpula, o futuro será ainda pior, com o desaparecimento de países inteiros (Tuvalu, ilha que fica no Sul do Oceano Pacífico, poderá ficar totalmente submersa em 8 anos), a falta de água potável para bilhões de pessoas, o sumiço de várias espécies, a savanização da Amazônia, o fim de diversos ecossistemas com sua biodiversidade e o aumento dos fenômenos de furacões, ciclones, chuvas etc.

A sede de lucro do capital e a crise ambiental

O capitalismo, além de calcar-se na exploração desumana dos trabalhadores, está destruindo o meio ambiente. Desde a revolução industrial, a acumulação desenfreada de capital está baseada no uso do carvão e do petróleo, ou seja, no uso de combustíveis fósseis que, ao queimar, geram a emissão de gases poluentes para atmosfera, causando o efeito estufa e, conseqüentemente, o aumento da temperatura da Terra.

A lógica do lucro do capital transforma os problemas da humanidade em mercadoria. Não é à toa que a poluição vem sendo tratada como "direito" por alguns países. Agora, com o pífio acordo do COP15, desenha-se um fundo de 30 bilhões de dólares que, pelo que se viu em Copenhague, será disputado por multinacionais e grandes corporações e, evidentemente, não será destinado ao pagamento de uma dívida ambiental com a humanidade. Eles vão ter direito a poluir bastando para tanto pagar insignificantes quantias para um fundo sem controle público Além disso, a conferência definiu incentivos financeiros para projetos de Redução de Emissões por Desmatamento e Degradação Florestal (Redd), (que como aponta as 50 propostas do PSOL) "podem financiar agressões socioambientais como os chamados "desertos verdes".

Essas resoluções são um perigo, pois trazem consigo mudanças importantes de conceitos. Um deles é substituir o conceito de florestas por plantações industriais como sumidouros de carbono, o que significa que as empresas plantadoras de eucaliptos poderão disputar fundos e depois transformar as árvores em celulose. O segundo perigo são fundos bilionários para governos corruptos, sem nenhum controle social. Isso coloca como uma das nossas tarefas a defesa e criação de um Tribunal Internacional do Clima e de Conselhos locais de acompanhamento. Apresentamos essas propostas no documento do PSOL entregue aos movimentos sociais presentes no Klima Fórum.

Infelizmente, o documento final da conferência oficial em Copenhague, redigido pelos países ricos e industrializados, é patético. Não prevê nenhum acordo obrigatório, apenas promete uma adaptação dos países ricos a uma meta de redução de 20% das emissões de CO2, e orienta os países emergentes a elaborarem suas metas, ficando estes sujeitos ao monitoramento dos países ricos.

Ora, nada de concreto, nenhum prazo definitivo para a substituição dos combustíveis fósseis, nenhum tribunal internacional sobre as questões climáticas, nenhuma penalidade aos maiores poluentes, como apresentamos na proposta do PSOL. O acordo de Copenhague ainda favorece a possibilidade da ingerência do imperialismo norte-americano sobre os países em desenvolvimento.

Fracasso foi o signo de Copenhague. Já existe tecnologia suficiente para o uso de energias renováveis. Já existem protótipos de carros movidos a hidrogênio, tecnologia e ciência para substituir o uso dos combustíveis fósseis. Entretanto, os mesmos estão sob patente, mais uma vez, dos países desenvolvidos. Ou seja, mantida a lógica das "vantagens comparativas" do comércio internacional capitalista, seguem os países pobres exportando matéria-prima e produtos de baixa tecnologia enquanto os países ricos concentram a produção científica e tecnológica de ponta.

Lula: discursos ambientais e práticas predatórias

Enquanto Lula fez um discurso de que os ricos devem pagar a conta da crise ambiental - pois foram os maiores poluidores do planeta, defendendo para esses países a redução em 39% as emissões de CO2 -, internamente o país segue com o PAC passando por cima da natureza e das populações originárias, como é o caso de Belo Monte e da transposição do rio São Francisco. E o que ainda é mais grave: amplia para 18 meses o prazo para que os latifundiários delimitem as áreas de preservação permanente (que além de ser sumidouros de carbono, permitiriam a preservação de ecossistemas inteiros e ajudariam a dar equilíbrio ambiental ao planeta).

Ademais, vale destacar que apesar das ótimas propostas apresentadas pela Venezuela, Bolívia e Equador (que debateremos depois) o governo brasileiro segue se distanciando deste bloco para atuar em conjunto com o capitalismo europeu. Não temos dúvida que o verdadeiro intercâmbio homem-natureza, que permita a transformação das formas de utilização dos recursos naturais para beneficiar a humanidade, seguindo a lógica de sua preservação, só poderá ser desenvolvido em uma nova sociedade, na qual a produção esteja voltada às necessidades das populações e os objetivos finais sejam o bem comum e não a acumulação de alguns.

Está mais do que na hora da ciência estar voltada à preservação do meio ambiente, assim como da humanidade. Do ponto de vista científico e tecnológico a humanidade pode, a partir de um sistema igualitário, socialista, ter um novo rumo na relação entre as sociedades e a natureza. Para salvar o planeta a luta anticapitalista deve se fortalecer. Para isso precisamos elaborar propostas concretas para a situação atual e para o futuro.

Antes e Depois de Copenhague: o encontro entre a luta anticapitalista com a luta ambiental

Copenhague foi um marco na politização do debate ecológico. Enquanto os governos preparavam belos discursos nada concretos no Bella Center, produziu-se um encontro paralelo, chamado Klima Fórum. Neste evento, assim como no Fórum Social Mundial, houve uma grande participação dos movimentos sociais e da juventude. Este foi o grande diferencial de Copenhague: o salto de qualidade, a quantidade de pessoas radicalizadas para lutar em defesa do meio ambiente, combinando tarefas anticapitalistas e ambientais. Desde a minha chegada, até o último dia, a grande surpresa foi a dimensão das lutas que aconteciam diariamente, de forma espontânea ou organizada e duramente reprimidas pela Polícia.

O marco ou o divisor de águas foi a marcha do dia 12 de dezembro, que, apesar da pouca divulgação, reuniu 100 mil ativistas. Assim como Seattle iniciou a massificação das lutas antiglobalização, o dia 12 de dezembro marcou uma nova fase de mobilizações, colocando no centro da pauta a crise ambiental. Existe um antes e um depois de Copenhague. E a pauta é cada vez mais concreta para as populações mundiais.

As palavras de ordem, os cartazes e a radicalização desta nova geração mostra o caráter anticapitalista presente nesta disputa: "Nosso clima não é seu negócio", "Mude o sistema e não o clima". A cobrança política aos Estados Unidos mostra o caráter antiimperialista desta frente.

Outro ponto alto foi o debate promovido pela Rede Ecossocialista no Fórum do Clima, organizado por Michael Löwy, intelectual militante do nosso partido irmão NPA e que há tempos tem buscado combinar a pauta socialista com a pauta ecológica. A mesa era composta por Peter (da Red Green Alliance), Torisa Turner (Eco-Socialist Internacional Network), Yorgos Galanis (membro da Respect da Inglaterra e da Eco-Socialist Internacional Network), Klaus da Alemanha (da Eco-Socialist Internacional Network e da SU) e por fim, Michael Löwy. Foi uma boa atividade sobre a necessidade da mudança da estrutura da sociedade e do modelo de produção, e sobre a importância de os trabalhadores assumirem o controle para, de fato, a humanidade estabelecer outra relação com a natureza.

Também participamos da mesa sobre a "Alternativa Verde", que contava, entre outras lideranças, com a senadora Marina Silva e com o militante internacionalmente reconhecido José Bové. A senadora defendeu a Amazônia e a luta contra o desmatamento, a necessidade de ter um compromisso real na COP-15 e a responsabilidade também dos países em desenvolvimento. Bové fez uma grande fala sobre as mobilizações, comparando-as com Seattle e reafirmou a necessidade de ter um intenso movimento de massas para não permitir que o meio ambiente se consolide como uma mercadoria no âmbito do comércio internacional e das multinacionais. No final, entregamos para a senadora (que nos recebeu muito bem, elogiando o PSOL e a nossa presidente Heloísa Helena) as 50 propostas do PSOL, assim como para Bové.

As 50 propostas apresentadas pelo PSOL, elaboradas com exímia qualidade pelos companheiros Kenzo Jucá e Marcelo Barra e aportado pela juventude do Rio Grande do Sul, empalmou com as reivindicações expressas pelos movimentos e, sobretudo, com as propostas de Chávez, Morales e Correa.

Temos agora o desafio de manter a propaganda do ecossocialismo, denunciar sistematicamente o capitalismo, mas definir como eixos centrais de nossa agitação: 1. Dívida Externa do Clima sobre as nações e corporações poluidoras; 2. Tribunal Mundial do Clima para julgar e penalizar os crimes ambientais e mecanismos de controle popular, globais, regionais e locais sobre as políticas ambientais e seus financiamentos; 3. Redefinição dos critérios e parâmetros atuais dos Mecanismos de Desenvolvimento Limpo (projetos MDL); 4. Defesa da Amazônia, luta contra o desmatamento e roubo de espécies e matéria-prima para as grandes corporações da indústria farmacêutica; 5. Defesa dos povos da Amazônia, das populações ribeirinhas, quilombolas e indígenas.

Com essas consignas podemos empalmar e incidir sobre os novos ativistas e ainda apresentar estrategicamente uma saída socialista. Caso contrário, podemos nos perder apenas na propaganda e esquecer da agitação política apoiada em um programa de transição ecológico, irrealizável do ponto de vista do capital, mas que arme para a mobilização.

Outro aspecto determinante foi o peso que a Alternativa Bolivariana para as Américas (ALBA) teve no Klima Fórum, aparecendo com uma alternativa para milhares de jovens desta geração. Copenhague estava tomada por cartazes convocando amplamente a participação na atividade da ALBA. Além disso, o antiimperialismo e a denúncia do capitalismo presente no discurso de Chávez na COP-15 foi a apresentação de uma alternativa real e a conformação de um bloco de esquerda antiimperialista e anticapitalista que localiza a questão ambiental no âmbito de uma luta global contra o capital.

Os desafios do PSOL pós-Copenhague

No Brasil, impõe-se a necessidade de mais pessoas envolverem-se nesta luta. Reafirmamos: existe um antes e um depois de Copenhague. O fato é que as mudanças climáticas já sentidas em 2009 e a politização do tema nos coloca grandes desafios e perspectivas.

Agora temos que nos apoiar nas 50 propostas para agitar politicamente em todos âmbitos, conformar uma corrente radical e plural, com elementos anticapitalistas e de defesa do meio ambiente para disputar nas escolas, nas universidades, nos locais de trabalho e moradia.

Na nossa agenda também precisa estar a divulgação e a propaganda das propostas da ALBA, em conjunto com a elaboração do PSOL, tratando de nos aproximar deste campo e inserir nosso partido como o pólo conseqüente da luta latino-americana no Brasil.

Fernanda Melchionna é vereadora do PSOL em Porto Alegre

segunda-feira, 21 de dezembro de 2009

sexta-feira, 18 de dezembro de 2009

"Povo na merda" em fim de mandato?

Política
Milton Temer
Sex, 11 de dezembro de 2009 21:44

Nada mais justo do que reconhecer a peremptória declaração do presidente Lula. Fundamental é "tirar o povo da merda". Só alguém de muita sensibilidade popular, portador de imenso senso de comunicação com o coração e a alma dos mais humildes, é capaz de expressar de forma tão profunda onde realmente chafurda o povo miserável do nosso país.

Mas fica no ar a pergunta óbvia que nenhum repórter "astuto", lamentavelmente, se propôs fazer a propósito da afirmação. Depois de tantos anos no governo, a quem Lula dirigia o oportuno impropério? A quem responsabilizava pelo que, de forma correta, estabelecia como prioridade naquele instante de retórica bem popular? Havia ali algum propósito de auto-crítica contra sua própria administração? Ou havia ali um ato falho, tendo em vista estar ele ao lado de Roseana Sarney, parte decisiva da família que não só assola os dramáticos espaços geográficos do estado do Maranhão, mas de todas as instituições ditas republicanas desta malfadada República? E com cuja família Lula mantém estreitos laços de aliança política.

Quem responder AMBOS terá, sem contestação, acertado.

Porque não chafurdam na merda outros segmentos - não tão numerosos, mas seguramente bem mais providos de poder sobre a riqueza nacional - ao qual, tanto Lula quanto Sarney prestam absoluta vassalagem. Recebendo, evidentemente, os bonus do que escapole às abas do chapéu que acoberta os privilégios que são constantemente ofertados a seus mentores.

Não chafurdam na merda os banqueiros que determinam, a partir dos prepostos bem distribuídos pelos postos-chave da economia nacional, a partir Conselho Monetário e do Banco Central, as linhas mestras de uma macroeconomia diretamente voltada para a defesa de seus interesses. São os juros, recorde em todo o mundo, dos títulos de nossa dívida pública que lhes enche, sem riscos, as burras com lucros pantagruélicos.

Não chafurdam na merda os ruralistas e latifundiários do agronegócio, a partir do papel de garoto-propaganda que o presidente da República lhes oferta em suas infindáveis viagens por todos os continentes. E a partir das infindáveis anistias para inadimplências fraudulentas que impõem, principalmente, ao Banco do Brasil. Estão aí os R$ 10 bilhões de multas perdoadas, por Lula, aos desmatadores, na contramão das desculpas esfarrapadas do ridículo ministro do Meio Ambiente, em seu esforço para demonstrar não ter sido bigodeado pela decisão presidencial à sua revelia.

Não chafurdam na merda os especuladores do famigerado "mercado", os de fora e seus cúmplices e dependentes internos, certos de que, a qualquer abalo no fluxo de ganhos sem produção de que se favorecem na esteira dos juros-recorde que o governo patrocina, o dinheiro público estará às ordens para garantir os lucros. Certos de que nada mudará na esteira de isenções tributárias com que são premiados, cada vez mais.

Não chafurdam na merda as grandes multinacionais, principalmente as montadoras de automóveis, com as constantes isenções de IPÌ que estimulam um consumismo predador, e incessante. Que terminam por transformar nossos espaços urbanos em corredores de eterno e fatigante engarrafamento. Um consumismo que cria ilusões permanentes nessa insaciável classe média concentrada na idéia de que é preciso ter o novo, jogando fora o velho, mesmo que continue funcionando bem.

Não chafurdam na merda as grandes empreiteiras, linhas de transmissão de um incessante e crescente processo de transferência de recursos públicos para poucos bolsos privados, em obras não raro desnecessárias, mas essenciais na manutenção das mamatas e comissões que as emendas ao Orçamento propiciam a eminentes parlamentares sem escrúpulos, mas com imensa capacidade de vender seus votos.

Chafurdam na merda, junto com o povo, a educação e a saúde públicas, sem recursos para atender demandas mínimas da população que mais delas necessita, por conta das migalhas que lhes são destinadas na sobra do que é destinado aos pagamentos dos serviços da ilegal dívida pública.Chafurdam na merda os que dependem da seguridade social pública, tendo em vista o ataque permanente que sofrem as instituições que a constituem, com a divulgação constante de falsos déficits para justificar maiores arrochos.

Sobre isto é que deveriam refletir os que tudo apostam, sem senso crítico, nas reduzidas e limitadas políticas públicas do atual governo. E sobre isto deve operar a esquerda combativa, que não se rendeu nem se vendeu. Sem sectarismo. Não se deixando embolar na hipocrisia e na cretinice que marcam os comportamentos de PSDB, dem-PFL,PMDB e PPS - a direita em todos os seus matizes -. Porque estes são totalmente identificados com as medidas mais reacionárias e concentradoras de riqueza da atual política, e só fazem oposição ao pouco que deve ser estimuladosó a avançar: a diplomacia independente para questões fundamentais da conjuntura internacional, tais como a ação correta no Oriente Médio e na América Latina. No essencial, combatem Lula pelo viés do mais desprezível preconceito, ou para com ele disputar o controle privado das verbas e cargos públicos do aparelho do Estado.

Milton Temer é jornalista

9º Programa Cidadania e Socialismo

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quarta-feira, 16 de dezembro de 2009

FRASE DA SEMANA

“ SÓ QUANDO A ÚLTIMA ÁRVORE FOR DERRUBADA, O ÚLTIMO PEIXE FOR MORTO E O ÚLTIMO RIO FOR POLUÍDO É QUE O HOMEM PERCEBERÁ QUE NÃO PODE COMER DINHEIRO “

Provérbio indígena

O consumismo e o desaquecimento humano

Ecologia
Chico Alencar
Qua, 09 de dezembro de 2009 15:17

Estudiosos da UFRJ, USP, Unicamp e Embrapa alertam: mantidas as condições do atual modelo econômico, até o fim deste século a Amazônia sofrerá perda de 40% da cobertura florestal da área sul-sudeste-leste, que se transformará em savana. O Rio Amazonas terá redução da sua vazão em até 30%, o rio Paraná em 53% e o rio São Francisco minguará 70%. No Nordeste, cuja temperatura aumentará até 8 graus, é prevista uma diminuição das chuvas entre 2 e 2,5 milímetros por dia até 2100! Isso afetará todo o país - lar de um quinto das espécies do planeta, espaço da maior biodiversidade da Terra.

Na contramão desse aquecimento, que só não acontecerá se mudarmos radicalmente o modelo de organização produtiva hoje vigente, há um esfriamento de valores constitutivos do ser humano.

A crise ambiental está na ordem do dia e nunca houve tanto debate sobre a doença do planeta. Para ser elevado, porém, ele precisa estar vinculado a visão de mundo, aos destinos da Humanidade, ao tipo de ser humano e de sociedade que até aqui forjamos e que aspiramos. Comprometer quem analisa.

É urgente questionar os estímulos da vida cotidiana no mundo urbano-capitalista. Somos permanentemente seduzidos pelo individualismo consumista, pela cultura da vaidade e da notoriedade, pela lógica do efêmero e da novidade, pela ânsia da compensação financeira. Cada um precisa ser um "vencedor" dentro do novo código da alma, que é o do "dize-me o que compras que dir-te-ei quem és". Afogamo-nos num poluído mar de necessidades artificiais.

Há um ser humano padrão constituído pela negação da esfera pública da existência e da política. Esta é, cada vez mais, atividade tecnificada, previsível, programada, sem dinamismo, prisioneira do ambiente de negócios e, nas campanhas das cifras milionárias. Não magnetiza, não atrai, não fascina e não alimenta os desejos da pessoa comum, do homo-consumericus. "Telemáquinas criadoras do consenso", na feliz definição de Joel Rufino dos Santos, preenchem o vazio do presente e do futuro. O grande ideólogo da atualidade é a publicidade que reforça a ilusão do ter.

Neste quadro dramático, cabe reiterar a urgência de uma nova sociedade, tópica e utópica, e sem divórcio entre valores idealizados e prática concreta, conjuntural. É preciso forjar novos paradigmas de pensamento, promovendo a "descolonização do imaginário", aposentando dogmas. Marx e Lênin, com suas formulações que seguem nos auxiliando para a análise da sociedade de classes, viveram num tempo em que inexistiam a energia atômica, a televisão, a indústria cultural, os sindicatos de massa, a matéria plástica, o computador... O proletariado de seu tempo, e mesmo o de meio século atrás, não é igual ao de agora.

Os setores mobilizáveis para as transformações sociais, na perspectiva de uma sociedade igualitária, são hoje mais amplos e diversos, por um lado. E mais dominados, por outro, pelas sutilezas da exploração, pelo vigor simbólico das forças da alienação. A indicação ao conformismo é eletrônica e massiva: neofatalismo. A imoralidade permanente do capital reside na exploração e alienação do trabalho, na reprodução da desigualdade (sob a farsa da "igualdade de competição"), na mercantilização de tudo, na chamada "ética das trocas pagas", na corrupção sistêmica - segundo a Transparência Brasil, 70% das empresas brasileiras gastam até 3% do seu faturamento anual com propinas.

Que forças sociais e indivíduos querem, de fato, buscar novos rumos para a Humanidade?

Chico Alencar é professor de história e deputado federal (PSol-RJ).

8º Programa CIdadania e Socialismo

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quinta-feira, 10 de dezembro de 2009

FRASE DA SEMANA

“ A CIDADANIA NÃO É ATITUDE PASSIVA, MAS AÇÃO PERMANENTE EM FAVOR DA COMUNIDADE. “

Trancredo Neves

CPI da Dívida II

Paulo Passarinho
Qui, 03 de dezembro de 2009 09:29



Paulo Passarinho
Encerrei o meu último artigo neste espaço - onde me reportei à sessão da CPI da Dívida Pública em que estive presente na Câmara Federal - manifestando o meu espanto com a demonstração de fragilidade dada por Armínio Fraga. O ex-presidente do Banco Central, na ocasião, explicou aos parlamentares que, frente ao jogo duro do mercado, para aceitar rolar a dívida da União, em 2001 e 2002, não restou alternativa que não fosse atender o apetite e voracidade dos agentes financeiros por mais juros, cláusulas cambiais e prazos mais curtos de vencimento para os títulos do governo.

Rigorosamente, não se trata de debilidade da autoridade monetária de então, conforme ironicamente insinuei. Uma das principais características observada no comando da política econômica do país, já há muitos anos, e independentemente do presidente de plantão, é o absoluto controle exercido pelo sistema financeiro sobre os cargos de direção do Banco Central, o verdadeiro locus decisório dos rumos do país em termos econômicos. Neste artigo já mencionado, lembrei, por exemplo, que desde 1988 iniciou-se um processo de desmontagem de todas as restrições à livre movimentação de capitais no Brasil, aparentemente de forma absolutamente ilegal.

O próprio convite feito à Armínio Fraga por Fernando Henrique, em janeiro de 1999, para assumir o Banco Central, é uma demonstração cabal dessa subordinação do "governo" brasileiro à lógica e aos interesses do mundo das finanças. Armínio era na época um dos mais importantes gestores de fundos do grupo financeiro de George Soros, conhecido especulador financeiro internacional.

Saiu diretamente de Nova York, onde morava e trabalhava, para garantir os interesses dos credores na gestão da dívida pública do país, entre outros objetivos.

O sucessor de Armínio - já no governo de Lula -, como todos sabem, foi Henrique Meireles, até hoje no cargo, apesar inclusive das denúncias que lhe pesam, feitas pela Procuradoria Geral da República, de sonegação fiscal, evasão de divisas e falsidade ideológica. Meireles, ao ser nomeado por Lula, há pouco se aposentara como um dos presidentes mundiais do Bank of Boston, um dos grupos credores do governo brasileiro. Fora eleito também - em rápida, milionária e suspeitíssima campanha no estado de Goiás - deputado federal pelo PSDB, aparentemente o mais forte opositor do partido do presidente eleito. Com relação às acusações que lhe afetam, ele apenas se beneficiou delas: Lula lhe conferiu o status de ministro de Estado, lhe possibilitando gozar de foro privilegiado para se defender na Justiça.

Tudo isso deixa claro com quem se encontra, de fato, o poder econômico e político, no Brasil.

Explica, também, o porquê de a trajetória do endividamento brasileiro não ter sido alterada nesses anos de governo Lula. Ao assumir a presidência, Lula herdou uma dívida em títulos do governo federal de R$ 687,30 bilhões, correspondendo a 46,51% do PIB. Hoje, essa dívida ultrapassa a R$ 1,8 trilhão, mais de 55% do PIB.

Armínio Fraga, em seu depoimento à CPI da Dívida, admitiu ser elevado esse endividamento, com taxas de juros muito altas, mas declarou também ser contrário a qualquer brusca mudança nos padrões de administração da dívida pública. Manifestamente, se declarou cético a medidas de controle à livre movimentação de capitais, conforme uma das alternativas defendidas por mim, como medida preliminar para uma mudança substantiva da atual política econômica.

Com a defesa de nossas fronteiras financeiras, através de mecanismos de controle dos fluxos cambiais, retiraríamos boa parte do tal poder do mercado em impor taxas, juros e outras condições draconianas à gestão da dívida por parte do Banco Central. Permitiria reduzir a taxa de juros e alongar os prazos de vencimento dos títulos, atenuando a carga de juros que garante alta rentabilidade aos detentores de títulos públicos.

Lembrei aos parlamentares que o governo, assim como o faz em relação à dívida externa, apresenta dados da dívida interna em títulos que subestimam o valor real desse passivo. O Banco Central não inclui em seus comunicados à imprensa sobre o volume do endividamento mobiliário as chamadas Operações de Mercado Aberto. Essas operações são realizadas pelo Banco Central para enxugar o volume em excesso de reais, em circulação na economia, por conta da entrada de dólares ou pelo simples fato do Banco Central pagar em dinheiro parte dos juros devido aos credores.

Em novembro, essas operações já envolviam um montante superior a R$ 500 bilhões, e as taxas de juros utilizadas para a rolagem dessa dívida ultrapassam em muito a taxa Selic, conforme ocorreu em 12 de novembro último, quando o Banco Central pagou mais de 13% para a remuneração de parte dessas operações.

Mas, especialmente, procurei também demonstrar aos integrantes da CPI que o modelo que nos endivida é o mesmo que nos condena a baixas taxas de crescimento econômico. O próprio ciclo de crescimento que experimentamos entre 2004 e 2008 deixa claro o que ocorre quando começamos a crescer acima de 4,5% ao ano - diga-se de passagem, uma taxa bastante aquém do que poderíamos crescer e do que necessitamos. Com a diminuição do saldo comercial, por conta do crescimento das importações acima da expansão das exportações, motivada pela valorização do real frente ao dólar, tendemos a voltar a contrair fortes deficits em conta-corrente. A valorização do real é uma consequência direta dos fortes fluxos de entrada de dólares na economia, incentivada pela facilidade de negócios e taxas de juros atraentes. O deficit em conta-corrente é o resultado do saldo comercial diminuído frente às despesas com a conta de serviços, cada vez mais pesada em uma economia crescentemente desnacionalizada, pagadora de juros aos credores da dívida externa e importadora de serviços, como fretes, por exemplo.

Baixas taxas de crescimento e péssima estrutura fiscal

O Balanço Geral do Orçamento da União, em 2008, mostra de forma implacável quais são as prioridades do governo. Mais de 30% dos recursos foram gastos com o pagamento de juros e amortizações, sem incluir a parte refinanciada da dívida, ao mesmo tempo em que a Saúde (4,81%), a Educação (2,57%), a Habitação (0,02%), o Saneamento (0,05%) e a Organização Agrária (0,27%) juntos não chegaram a absorver 7,8% do total das despesas da União.

Defendi, por fim, que a CPI venha a se desdobrar em um trabalho sério de auditorias das dívidas externa e interna. Lembrei a necessidade de cumprimento do artigo 26, das Disposições Transitórias da Constituição Federal em vigor, que prevê justamente a realização da auditoria da dívida externa, até hoje não realizada. Este esforço, e exigência constitucional, deve envolver hoje a auditagem também do endividamento interno, pelo fato de parte desses débitos externos ter sido saldada nos últimos anos pela absorção de recursos externos, a um alto custo e com o endividamento interno galopante, em títulos, que demonstramos estar em curso.

Foi uma oportunidade importante, embora a participação dos parlamentares tenha se mostrado extremamente esvaziada. Apesar de ter um deputado como presidente da CPI, o PT não participou com nenhum de seus parlamentares dessa sessão, que contou, lembro mais uma vez, com a participação de Armínio Fraga, ex-presidente do Banco Central. Nem mesmo os seus aliados do PCdoB e do PSB se fizeram presentes.

Talvez esse seja o sinal mais cabal de como as prioridades dos principais partidos de esquerda que sustentam o governo Lula se modificaram, por completo, nesses últimos anos.

02/12/2009

Paulo Passarinho é economista e presidente do CORECON-RJ

Modelo de financiamento eleitoral é garantia de permanentes atos de corrupção

Escrito por Léo Lince
04-Dez-2009



O "mensalão" do DEM, mostrado com riqueza de detalhes, ocupa todos os espaços na imprensa escrita, falada e televisada. É a bola da vez. Na secura do planalto central, ganha contornos tenebrosos a última, no sentido de mais recente, feição da escalada sem fim da corrupção na política brasileira. Depois dos tucanos e petistas, chegou a vez dos "demos" exibirem seus "valores não contabilizados" e entrarem na fila lenta que antecede a barra dos tribunais.



Alguns se surpreendem por imaginar que a execração pública observada por ocasião dos escândalos anteriores pudesse inibir a repetição das mesmas práticas. Ledo engano. Afinal, até agora nenhum dos antigos mensaleiros foi preso ou sequer condenado. A lentidão da justiça sugere impunidade. Mas, para além de tais aspectos, há uma questão de fundo que explica a persistência do fenômeno. A seqüência interminável de "fatos isolados que se repetem", para usar uma expressão cara aos que se ocupam em dourar a pílula, é uma decorrência inevitável do modelo dominante, que fornece proteína e só se reproduz azeitado pela lógica da corrupção sistêmica.



Quando o presidente Lula, do alto da sua súbita projeção como personagem salvífico do capitalismo mundial, afirma que "as imagens não falam por si", ele não está apenas tentando livrar a cara dos que foram filmados com a boca na botija. O presidente, por certo, não haveria de se condoer com a sorte do DEM, seu opositor aparente, mas com a carga que pesa sobre suas próprias costas. Ao desqualificar o poder das imagens, ele deve ter pensado no Delúbio, nas declarações anteriores sobre inevitabilidade dos "recursos não contabilizados", na grana que precisa arrecadar para a próxima campanha.



E, por outro lado, na base do reflexo que sustentou a espontaneidade da resposta, falou mais alto a função de garantidor geral do sistema dominante.



O presidente sabe perfeitamente em que bases está cravado o pedestal que o sustenta. E opera com desenvoltura a condição de "pau que sustenta a lona do circo". Qualquer sentença firmada sobre a cabeça do indigitado Arruda, sem margem para qualquer dúvida, se destina a pairar como uma ameaça sobre os demais sócios do seleto clube.



Daí porque, invertendo os termos do ditado famoso, a palavra do presidente, nas circunstâncias em que foi dita, falou mais que mil imagens.



O esforço no sentido de minimizar, abafar e circunscrever o alcance do episódio foi replicado na voz de outras figuras proeminentes do mesmo esquema. Ricardo Berzoini, ainda presidente em exercício do PT, Candido Vaccarezza, líder do partido na Câmara, além da candidata Dilma Rousseff, fizeram declarações absolutamente sintonizadas com a voz do dono. Não querem fazer marola, dizem tratar-se de fato isolado, "não é corrupção do DEM, é do governador", não deve ser explorado politicamente. Tudo bem de acordo com a idéia de preservar os grandes partidos da ordem e os fluxos que lhes financiam as campanhas eleitorais cada vez mais caras.



As manifestações populares que pedem o fim da impunidade, tipo "Arruda na papuda e PO no xilindró", estão corretas. Falta agregar, como dimensão permanente da mesma luta, o desmonte do formato atual de financiamento de campanha eleitoral, fator incontrolável de corrupção e matriz de quase todos os escândalos da nossa história recente.



Não se trata, apenas, de formar um fundo público. Ele deve ser exclusivo e, além de definir um teto de gastos para cada tipo de campanha, deve vir acompanhado do mais rigoroso esquema de fiscalização, que incorpore aos tribunais eleitorais, o Ministério Público, a Receita Federal e estruturas outras da sociedade civil. É a única maneira de quebrar o ciclo vicioso que privatiza o poder público e sustenta a atual política do padrão podre.



Léo Lince é sociólogo.

7º Programa Cidadania e Socialismo

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Parte 5:


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Parte 8:

sábado, 5 de dezembro de 2009

POEMA DA SEMANA

CIDADANIA

Cidadania
É fazer democracia.
É ato de repúdio.
Contra a demagogia.
Contra a tirania.
Contra a oligarquia.
É luta solidária
Pela inclusão da soberania.

Cidadania
É dever solidário de um povo.
De ter clareza de consciência
Em saber dar o poder de povo
A quem merece poder de povo.

Cidadania
É cantarmos a mesma canção.
Caminharmos no mesmo chão.
É termos o mesmo sonho de nação.
É construirmos a mesma obrigação
Para termos uma grande nação.


Autor : Everaldo Cerqueira
Poeta baiano

sexta-feira, 4 de dezembro de 2009

Quatro frases que fazem crescer o nariz do Pinóquio

Escrito por Eduardo Galeano
13-Ago-2007





1. Somos todos culpáveis pela ruína do planeta.



A saúde do mundo está um asco. 'Somos todos responsáveis', clamam a vozes de alarme universal, e esta generalização absolve: se todos nós somos responsáveis, ninguém o é. Tais como coelhos, reproduzem-se os novos tecnocratas do meio ambiente. É a taxa de natalidade mais alta do mundo: os peritos geram peritos e mais peritos, que se ocupam em envolver o tema no papel celofane da ambigüidade.



Eles fabricam a brumosa linguagem das exortações ao 'sacrifício de todos' nas declarações dos governos e nos solenes acordos internacionais que ninguém cumpre. Estas cataratas de palavras – inundação que ameaçam converter-se numa catástrofe ecológica comparável ao buraco na camada de ozônio – não se desencadeiam gratuitamente. A linguagem oficial afoga a realidade para conceder impunidade à sociedade de consumo, a qual é imposta como modelo em nome do desenvolvimento e das grandes empresas que lhes extraem o sumo.



Mas as estatísticas confessam. Os dados ocultos debaixo do palavrório revelam que 20 por cento da humanidade comete 80 por cento das agressões contra a natureza, crime a que os assassinos chamam suicídio e é a humanidade inteira quem paga as conseqüências da degradação da terra, da intoxicação do ar, do envenenamento da água, do enlouquecimento do clima e da dilapidação dos recursos naturais não renováveis.



A senhora Harlem Bruntland, que dirige o governo da Noruega, comprovou recentemente que se os 7 bilhões de habitantes do planeta consumissem o mesmo que os países desenvolvidos do Ocidente, "fariam falta 10 planetas como o nosso para satisfazer todas as suas necessidades". Uma experiência impossível. Mas os governantes dos países do Sul que prometem a entrada no Primeiro Mundo, passaporte mágico que tornará ricos e felizes todos nós, não deveriam apenas ser processados por roubo. Não estão apenas nos gozando, não: além disso, esses governantes estão cometendo o delito de apologia do crime. Porque este sistema de vida que se apresenta como paraíso, fundado na exploração do próximo e na aniquilação da natureza, é o que nos está enfermando o corpo, envenenando a alma e nos deixando sem mundo.



2. É verde o que se pinta de verde.



Agora os gigantes da indústria química fazem a sua publicidade em cor verde, e o Banco Mundial lava a sua imagem repetindo a palavra ecologia a cada página dos seus relatórios e tingindo de verde os seus empréstimos. "Nas condições dos nossos empréstimos há normais ambientais estritas", esclarece o presidente do supremo banco do mundo.



Somos todos ecologistas, até que alguma medida concreta limite a liberdade de contaminação. Quando o Parlamento do Uruguai aprovou uma tímida lei de defesa do meio ambiente, as empresas que lançam veneno para o ar e apodrecem as águas sacaram subitamente a sua recém comprada máscara verde e gritaram a sua verdade em termos que poderiam ser assim resumidos: "os defensores da natureza são advogados da pobreza, dedicados a sabotar o desenvolvimento econômico e a espantar o investimento estrangeiro".



O Banco Mundial, em contrapartida, é o principal promotor da riqueza, do desenvolvimento e do investimento estrangeiro. Talvez por reunir tantas virtudes, o Banco manejará, junto à ONU, o recém criado Fundo para o Meio Ambiente Mundial. Este imposto sobre a má consciência disporá de pouco dinheiro, 100 vezes menos do que haviam pedido os ecologistas, para financiar projetos que não destruam a natureza.



Intenção inquestionável, conclusão inevitável: se esses projetos requerem um fundo especial, o Banco Mundial está a admitir, de fato, que todos os seus demais projetos fazem um fraco favor ao meio ambiente. O Banco se chama Mundial, assim como o Fundo Monetário se chama Internacional, mas estes irmãos gêmeos vivem, cobram e decidem em Washington. Quem paga, manda, e a numerosa tecnocracia jamais cospe no prato onde come.



Sendo, como é, o principal credor do chamado Terceiro Mundo, o Banco Mundial governa nossos países cativos que a título de serviço da dívida pagam aos seus credores externos 250 mil dólares por minuto, e lhes impõe a sua política econômica em função do dinheiro que concede e promete.



A divinização do mercado, que compra cada vez menos e paga cada vez pior, permite estufar de quinquilharias as grandes cidades do mundo, drogadas pela religião do consumo, enquanto os campos se esgotam, apodrecem as águas que os alimentam e uma crosta seca cobre desertos que antes foram florestas.



3. Entre o capital e o trabalho, a ecologia é neutra.



Pode-se dizer tudo de Al Capone, mas ele era um cavalheiro: o bom Al sempre enviava flores aos velórios das suas vítimas. As empresas gigantes da indústria química, petrolífera e automobilística pagaram boa parte das despesas da Eco 92, a conferência internacional que no Rio de Janeiro se ocupou da agonia do planeta.



E essa conferência, chamada Cimeira da Terra, não condenou as transnacionais que produzem poluição e dela vivem, e nem sequer pronunciou uma palavra contra a ilimitada liberdade de comércio que torna possível a venda de veneno. No grande baile de máscaras do fim do milênio, até a indústria química veste-se de verde.



A angústia ecológica perturba o sono dos maiores laboratórios do mundo, que para ajudar a natureza estão inventando novos cultivos biotecnológicos. Mas estes desvelos científicos não se propõem encontrar plantas mais resistentes às pragas sem ajuda química, procuram sim novas plantas capazes de resistir aos praguicidas e herbicidas que esses mesmos laboratórios produzem. Das 10 maiores empresas de sementes do mundo, seis fabricam pesticidas (Sandoz, Ciba-Geigy, Dekalb, Pfiezer, Upjohn, Shell, ICI). A indústria química não tem tendências masoquistas.



A recuperação do planeta ou o que nos resta dele implica a denúncia da impunidade do dinheiro e a liberdade humana. A ecologia neutral, que se parece antes com a jardinagem, faz-se cúmplice da injustiça de um mundo onde a comida sã, a água limpa, o ar puro e o silêncio não sã direitos de todos e sim privilégios dos poucos que podem pagá-los.



Chico Mendes, operário da borracha, caiu assassinado em fins de 1988, na Amazônia brasileira, por crer naquilo que acreditava: que a militância ecológica não pode ser divorciada da luta social. Chico acreditava que a floresta amazônica não poderá ser salva enquanto não se fizer a reforma agrária no Brasil. Cinco anos depois do crime, os bispos brasileiros denunciaram que mais de 100 trabalhadores rurais morrem assassinados a cada ano na luta pela terra, e calcularam que quatro milhões de camponeses sem trabalho vão para as cidades abandonando as plantações do interior.



Adaptando os números de cada país, a declaração dos bispos retrata toda a América Latina. As grandes cidades latino-americanas, inchadas até arrebentar pela invasão incessante de exilados do campo, são uma catástrofe ecológica: uma catástrofe que não se pode entender nem mudar dentro dos limites da ecologia, surda perante o clamor social e cega perante o compromisso político.



4. A natureza está fora de nós.



Nos seus 10 mandamentos, Deus esqueceu de mencionar a natureza. Dentre as ordens que nos enviou do monte Sinai, o Senhor teria podido acrescentar, por exemplo: "Honrarás a natureza da qual fazes parte". Mas isso não lhe ocorreu.



Há cinco séculos, quando a América foi apresada pelo mercado mundial, a civilização invasora confundiu a ecologia com a idolatria. A comunhão com a natureza era pecado. E merecia castigo. Segundo as crônicas da Conquista, os índios nômades que usavam cascas para se vestir jamais descascavam o tronco inteiro, para não aniquilar a árvore, e os índios sedentários plantavam cultivos diversos e com períodos de descanso, para não cansar a terra.



A civilização que vinha impor as devastadoras monoculturas de exportação não podia entender as culturas integradas na natureza, e confundiu-as com a vocação demoníaca ou a ignorância. Para a civilização que se diz ser ocidental e cristã, a natureza era uma besta feroz que era preciso domar e castigar a fim de que funcionasse como uma máquina, posta ao nosso serviço desde sempre e para sempre.



A natureza, que era eterna, devia-nos escravatura. Muito recentemente soubemos que a natureza se cansa, como nós, seus filhos, e soubemos que, como nós, pode morrer assassinada. Já não se fala em submeter a natureza, agora até os seus verdugos dizem que há que protegê-la. Mas tanto num como noutro caso, natureza submetida e natureza protegida, ela está fora de nós.



A civilização que confunde os relógios com o tempo, o crescimento com o desenvolvimento e o grandote com a grandeza, também confunde a natureza com a paisagem, enquanto o mundo, labirinto sem centro, dedica-se a romper o seu próprio céu.





Eduardo Galeano, escritor uruguaio, é autor de “As veias aberta da América Latina”, entre outros livros.



Publicado originalmente em http://www.resumenlatinoamericano.org/

http://www.correiocidadania.com.br/content/view/709/

6º Programa Cidadania e Socialismo

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