Escrito por Luiz Antonio Magalhães
17-Nov-2009
O sistema de comunicação do Brasil está mudando. De forma rápida e, provavelmente, sem caminho de volta. Muita gente já percebeu, mas talvez não tenha ainda a real dimensão do que está ocorrendo. A cada dia que passa, fica mais claro o posicionamento das operadoras de telefonia - fixa e móvel -, que apenas aguardam modificações na legislação para entrar de cabeça no mercado de mídia - televisão, especialmente. Na internet, veículo em que as teles já podem atuar, é possível perceber o movimento de forma bastante clara. Vamos aos fatos concretos.
Na semana passada, o Observatório da Imprensa, site do qual este colunista é Editor Executivo, foi comunicado pelo portal iG, hoje umbilicalmente ligado à operadora Oi, que o contrato de hospedagem e fornecimento de conteúdo não seria renovado. A partir de dezembro, o Observatório estará hospedado em outro servidor e em janeiro deixará de receber a mensalidade que o iG pagava - um recurso importante para a operação do site. E não foi só o Observatório. Praticamente todos os parceiros do iG em situação semelhante à do OI já foram avisados (ou estão sendo) sobre a não-renovação dos contratos. A idéia do portal iG agora é reforçar a sua marca. Para tanto, contratou o jornalista Eduardo Oinegue, ex-Veja, que comanda a reestruturação, ou, em palavras mais chiques, o "reposicionamento da marca".
Desde que assumiu, Oinegue vem provocando um verdadeiro terremoto no mercado de trabalho jornalístico, contratando profissionais com salários bem altos. Um repórter que cobrirá o Congresso Nacional em Brasília vai receber R$ 12 mil mensais. Somando os encargos trabalhistas, é o mesmo que o iG pagava ao site parceiro Congresso em Foco, que possui uma redação bastante aguerrida e vem recebendo prêmios de jornalismo pela excelência do seu trabalho. Com dinheiro para gastar, Oinegue, porém, preferiu montar sua própria redação em Brasília, sob o comando do experiente Tales Faria. Contratou Matheus Leitão, filho de Marcelo Netto e Míriam Leitão, o repórter que deu o "furo" do caso Francenildo para a Época, e Christiane Barbieri, ex-Folha, com passagem relâmpago pelo Brasil Econômico. Em São Paulo, Eduardo Oinegue já tirou Guilherme Barros da mesma Folha e deu a ele uma coluna no portal, com dois repórteres - repórteres mesmo, não estagiários.
Mas tudo isto é na verdade apenas a ponta do iceberg, para usar um jargão proibido em qualquer redação séria. O iG está rico e forte porque por trás dele está a Oi. Isto é fato. Pouco tempo atrás, a revista Veja deu uma notinha na coluna Radar, de Lauro Jardim, informando que a Oi estaria procurando um jornal impresso para comprar. E pelo que este colunista apurou, tão logo a legislação permita, a operadora entra também no mercado de televisão.
A Telefônica, aliás, já oferece TV por assinatura, também não está parada e embora seu investimento em internet seja bem mais comedido que o do iG, o modelo é o mesmo: aposta no conteúdo próprio.
É evidente que em poucos anos o panorama da mídia brasileira será outro. A Oi nasceu com faturamento de R$ 30 bilhões ao passo que a Rede Globo, líder entre as emissoras brasileiras, não consegue mais do que R$ 8 bilhões por ano. A diferença é brutal. A Telefônica de Espanha, por exemplo, tem de lucro o que a Globo fatura por ano. Não há competição possível, é óbvio que as teles vão engolir as emissoras nacionais todas e dominar este mercado. Os mais espertos - e a Globo é espertíssima - poderão se tornar fornecedores de conteúdo para as teles, que não têm, ainda, know-how neste ramo.
E, afinal, como será o futuro da mídia brasileira com a preponderância das teles? Não dá, ainda, para saber. Vai circular mais dinheiro, porém haverá também muita sinergia entre as empresas subsidiárias, no campo de mídia, das enormes companhias de telefonia, cujo core business sempre será telefonia mesmo...
Alguns românticos terão saudade do tempo das empresas familiares, talvez esquecendo o quão ruim também foram as administrações deste tipo no jornalismo brasileiro. A questão das teles não é de todo nefasta para o mercado de trabalho dos jornalistas, por exemplo, mas o é para a construção de uma nação soberana e dona de seu próprio nariz.
Nada contra a participação de estrangeiros na mídia brasileira, que de resto, pelo menos no que se refere à televisão a cabo, já existe, é uma realidade. Porém, uma boa regulamentação que imponha certos limites ao gigantismo das teles pode equilibrar o jogo e permitir que o Brasil possua um sistema de mídia mais parecido com o europeu do que o norte-americano.
Luiz Antonio Magalhães é jornalista e Editor Executivo do Observatório da Imprensa, onde este texto foi originalmente publicado.
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