“ QUEM NÃO SE MOVIMENTA, NÃO SENTE AS CORRENTES QUE O PRENDEM.”
Rosa Luxemburgo
"UMA IDEIA TORNA-SE UMA FORÇA MATERIAL QUANDO GANHA AS MASSAS ORGANIZADAS".
Karl Marx
segunda-feira, 31 de janeiro de 2011
Agora é Dilma
Paulo Passarinho - 27/01/2011
Temos apenas quatro semanas incompletas de governo Dilma. Para muitos, esse ainda seria um tempo extremamente curto para a antecipação de qualquer tipo de avaliação. Há inclusive quem alegue que sequer a equipe de governo encontra-se plenamente formada, levando-se em conta que são muitos os cargos dos segundo e terceiro escalões não preenchidos.
Contudo, a própria presidente caracteriza o seu governo como de continuidade e mudança. Continuidade do governo Lula, naturalmente. Neste aspecto, portanto, já poderíamos ter alguma base para o início de uma apreciação crítica das opções adotadas pelo governo federal. Porém, é em torno de medidas já implementadas nesses primeiros dias - ou de anunciadas intenções - que acredito que já possamos iniciar o necessário reconhecimento dos caminhos que vão sendo desenhados pelo novo governo.
E o resultado não é nem um pouco animador.
Na área fiscal, o governo ainda não concluiu o estudo que faz para anunciar os chamados cortes orçamentários, mas fontes do ministério divulgam que o mesmo deverá ficar entre 35 e 40 bilhões de reais, tendo também um caráter definitivo, não existindo a possibilidade de parte desse corte vir a ser descontingenciada ao longo do ano, dependendo da arrecadação
Enquanto esses cortes não se definem, o governo Dilma já tomou a decisão inédita de apenas disponibilizar aos ministérios 1/18 do orçamento por mês, diferenciando-se da liberação de 1/12, típica desse período em que o governo ainda não definiu o orçamento final com que pretende trabalhar.
E é alegando preocupação com as contas públicas que o governo anunciou que a sua margem de manobra para rever o valor do novo salário mínimo – decretado por Medida Provisória em R$ 540,00, ao final do mandato de Lula – é mínima. Dilma admite uma revisão para R$ 545,00 (!!) e ainda tentou jogar para arrancar o apoio das Centrais Sindicais para esse novo valor, em troca da atualização dos valores da tabela de descontos do Imposto de Renda da Pessoa Física.
A manobra pegou mal. Até o Paulinho, da Força Sindical, rejeitou qualquer barganha, chamou a proposta de nefasta e cobrou a obrigação do governo em corrigir a tabela do IR, com uma defasagem em relação à inflação de mais de 60%, desde 2002. A mesma posição foi acompanhada pela CUT, e Gilberto Carvalho, secretário-geral da Presidência e negociador do governo com as Centrais, recuou e fez questão de afirmar que não existiria nenhum tipo de vínculo entre o atendimento às duas reivindicações.
O Banco Central, por sua vez, sem a menor preocupação com o impacto da medida nas contas públicas, cumpriu o seu papel neo-moderno de sancionar as previsões e recomendações do sistema financeiro, e elevou a taxa básica de juros de 10,75% ao ano para 11,25%. A alegação é, mais uma vez, as ameaças inflacionárias. O problema é que é questionável a adequação desse tipo de medida para conter variações altistas nos preços, que se manifestam principalmente em alimentos, produtos agrícolas e serviços. Além de influenciar negativamente as decisões em relação a novos investimentos, tão necessários, mas sempre aquém do que precisamos.
Elevar os juros estimula, também, a entrada de dólares e acentua a tendência à valorização do real frente ao dólar.
O problema do câmbio, assim, passa a ter mais um vetor a estimular a sua valorização e aponta para conseqüências graves nos resultados projetados para o saldo da balança comercial para esse ano. Nesse sentido, tendo como objetivo deter a queda no preço do dólar, a Secretaria do Tesouro Nacional já definiu que serão realizadas novas emissões de títulos da dívida, sem limites pré-definidos, para o financiamento da compra de dólares pelo Fundo Soberano do Brasil, o que elevará, ainda mais, o nosso explosivo endividamento.
Ao mesmo tempo, o Banco Central reintroduziu as polêmicas operações de swapp cambial reverso, equivalentes à compra de dólares no mercado futuro, entre as suas medidas para atenuar um processo – a valorização do real – que é estimulado pela própria autoridade monetária, quando eleva a taxa básica de juros.
Os dilemas e contradições, portanto, da condução da política macroeconômica ficam evidentes. E o mais grave é que tudo indica que o “deus-mercado” internacional, tão generoso com Lula em seus anos de governo, não irá contemplar Dilma com tanta bondade. Nossas exportações não serão afetadas apenas pela valorização do real. A necessidade de expansão das exportações dos Estados Unidos e a forte penetração de produtos manufaturados da China, em mercados onde o Brasil está presente, como é o caso da África e da América Latina, irá nos impactar negativamente.
Isso significa que iremos aprofundar o processo, em nossas contas externas, de redução gradual do saldo comercial ao mesmo tempo em que as despesas com a conta de serviços não param de crescer, em particular as remessas de lucros e dividendos das empresas estrangeiras.
Os números divulgados das contas externas em 2010 apontam para a tendência de forte diminuição do saldo comercial – provocado especialmente pela elevação das importações, conseqüência direta da valorização do real – combinada com o contínuo crescimento do déficit da conta de serviços. Este resultado negativo, confirmando o que já havíamos estimado, ficou em US$ 70,6 bilhões. Somente de remessas de lucros e dividendos, enviamos para fora do país US$ 30,4 bilhões.
E a tendência é que esse saldo do balanço de serviços e rendas apenas se amplie: o governo aposta em investimentos externos – diretos ou em aplicações financeiras – para continuar a manter a rota do endividamento público e da desnacionalização do parque produtivo, como formas de se fechar o balanço de pagamentos.
Mas o mais preocupante não são apenas essas medidas de curto-prazo, nas áreas fiscal, monetária ou cambial nesse início de governo que preocupam.
As intenções anunciadas são igualmente graves.
Dilma Rousseff já se manifestou favorável a uma diminuição – ainda que gradual – da contribuição previdenciária patronal sobre a folha de pessoal de 20% para 14%, ao mesmo tempo em que o ministro da Previdência defendeu a criação da idade mínima para as aposentadorias, como forma de se viabilizar o fim do fator previdenciário.
Miriam Belchior, ministra do Planejamento, declarou que o governo irá priorizar a aprovação do Projeto de Lei Complementar que estabelece um limite para o crescimento dos gastos da União com pessoal, comprometendo na prática, desse modo, qualquer processo de recuperação de perdas nos vencimentos de diversas categorias dos servidores, ou a necessária expansão do número de funcionários públicos, através da realização de concursos.
Enquanto isso, Edson Lobão, o ministro de Minas e Energia – do feudo de José Sarney no governo Dilma – declarou a sua intenção em retomar de imediato os leilões de petróleo das áreas do pós-sal, ao mesmo tempo em que espera a regulamentação do imbróglio sobre a distribuição dos royalties entre os estados para deflagrar os primeiros leilões do pré-sal.
E para quem ainda acha pouco, foi também divulgada a intenção do governo em enviar ao Congresso Nacional proposta de Emenda Constitucional alterando o atual monopólio da União sobre as atividades do setor nuclear. O objetivo seria o de contar com investimentos privados, inclusive estrangeiros, para se levar à frente a idéia de se construírem quatro novas usinas nucleares no país.
27/01/2011
Temos apenas quatro semanas incompletas de governo Dilma. Para muitos, esse ainda seria um tempo extremamente curto para a antecipação de qualquer tipo de avaliação. Há inclusive quem alegue que sequer a equipe de governo encontra-se plenamente formada, levando-se em conta que são muitos os cargos dos segundo e terceiro escalões não preenchidos.
Contudo, a própria presidente caracteriza o seu governo como de continuidade e mudança. Continuidade do governo Lula, naturalmente. Neste aspecto, portanto, já poderíamos ter alguma base para o início de uma apreciação crítica das opções adotadas pelo governo federal. Porém, é em torno de medidas já implementadas nesses primeiros dias - ou de anunciadas intenções - que acredito que já possamos iniciar o necessário reconhecimento dos caminhos que vão sendo desenhados pelo novo governo.
E o resultado não é nem um pouco animador.
Na área fiscal, o governo ainda não concluiu o estudo que faz para anunciar os chamados cortes orçamentários, mas fontes do ministério divulgam que o mesmo deverá ficar entre 35 e 40 bilhões de reais, tendo também um caráter definitivo, não existindo a possibilidade de parte desse corte vir a ser descontingenciada ao longo do ano, dependendo da arrecadação
Enquanto esses cortes não se definem, o governo Dilma já tomou a decisão inédita de apenas disponibilizar aos ministérios 1/18 do orçamento por mês, diferenciando-se da liberação de 1/12, típica desse período em que o governo ainda não definiu o orçamento final com que pretende trabalhar.
E é alegando preocupação com as contas públicas que o governo anunciou que a sua margem de manobra para rever o valor do novo salário mínimo – decretado por Medida Provisória em R$ 540,00, ao final do mandato de Lula – é mínima. Dilma admite uma revisão para R$ 545,00 (!!) e ainda tentou jogar para arrancar o apoio das Centrais Sindicais para esse novo valor, em troca da atualização dos valores da tabela de descontos do Imposto de Renda da Pessoa Física.
A manobra pegou mal. Até o Paulinho, da Força Sindical, rejeitou qualquer barganha, chamou a proposta de nefasta e cobrou a obrigação do governo em corrigir a tabela do IR, com uma defasagem em relação à inflação de mais de 60%, desde 2002. A mesma posição foi acompanhada pela CUT, e Gilberto Carvalho, secretário-geral da Presidência e negociador do governo com as Centrais, recuou e fez questão de afirmar que não existiria nenhum tipo de vínculo entre o atendimento às duas reivindicações.
O Banco Central, por sua vez, sem a menor preocupação com o impacto da medida nas contas públicas, cumpriu o seu papel neo-moderno de sancionar as previsões e recomendações do sistema financeiro, e elevou a taxa básica de juros de 10,75% ao ano para 11,25%. A alegação é, mais uma vez, as ameaças inflacionárias. O problema é que é questionável a adequação desse tipo de medida para conter variações altistas nos preços, que se manifestam principalmente em alimentos, produtos agrícolas e serviços. Além de influenciar negativamente as decisões em relação a novos investimentos, tão necessários, mas sempre aquém do que precisamos.
Elevar os juros estimula, também, a entrada de dólares e acentua a tendência à valorização do real frente ao dólar.
O problema do câmbio, assim, passa a ter mais um vetor a estimular a sua valorização e aponta para conseqüências graves nos resultados projetados para o saldo da balança comercial para esse ano. Nesse sentido, tendo como objetivo deter a queda no preço do dólar, a Secretaria do Tesouro Nacional já definiu que serão realizadas novas emissões de títulos da dívida, sem limites pré-definidos, para o financiamento da compra de dólares pelo Fundo Soberano do Brasil, o que elevará, ainda mais, o nosso explosivo endividamento.
Ao mesmo tempo, o Banco Central reintroduziu as polêmicas operações de swapp cambial reverso, equivalentes à compra de dólares no mercado futuro, entre as suas medidas para atenuar um processo – a valorização do real – que é estimulado pela própria autoridade monetária, quando eleva a taxa básica de juros.
Os dilemas e contradições, portanto, da condução da política macroeconômica ficam evidentes. E o mais grave é que tudo indica que o “deus-mercado” internacional, tão generoso com Lula em seus anos de governo, não irá contemplar Dilma com tanta bondade. Nossas exportações não serão afetadas apenas pela valorização do real. A necessidade de expansão das exportações dos Estados Unidos e a forte penetração de produtos manufaturados da China, em mercados onde o Brasil está presente, como é o caso da África e da América Latina, irá nos impactar negativamente.
Isso significa que iremos aprofundar o processo, em nossas contas externas, de redução gradual do saldo comercial ao mesmo tempo em que as despesas com a conta de serviços não param de crescer, em particular as remessas de lucros e dividendos das empresas estrangeiras.
Os números divulgados das contas externas em 2010 apontam para a tendência de forte diminuição do saldo comercial – provocado especialmente pela elevação das importações, conseqüência direta da valorização do real – combinada com o contínuo crescimento do déficit da conta de serviços. Este resultado negativo, confirmando o que já havíamos estimado, ficou em US$ 70,6 bilhões. Somente de remessas de lucros e dividendos, enviamos para fora do país US$ 30,4 bilhões.
E a tendência é que esse saldo do balanço de serviços e rendas apenas se amplie: o governo aposta em investimentos externos – diretos ou em aplicações financeiras – para continuar a manter a rota do endividamento público e da desnacionalização do parque produtivo, como formas de se fechar o balanço de pagamentos.
Mas o mais preocupante não são apenas essas medidas de curto-prazo, nas áreas fiscal, monetária ou cambial nesse início de governo que preocupam.
As intenções anunciadas são igualmente graves.
Dilma Rousseff já se manifestou favorável a uma diminuição – ainda que gradual – da contribuição previdenciária patronal sobre a folha de pessoal de 20% para 14%, ao mesmo tempo em que o ministro da Previdência defendeu a criação da idade mínima para as aposentadorias, como forma de se viabilizar o fim do fator previdenciário.
Miriam Belchior, ministra do Planejamento, declarou que o governo irá priorizar a aprovação do Projeto de Lei Complementar que estabelece um limite para o crescimento dos gastos da União com pessoal, comprometendo na prática, desse modo, qualquer processo de recuperação de perdas nos vencimentos de diversas categorias dos servidores, ou a necessária expansão do número de funcionários públicos, através da realização de concursos.
Enquanto isso, Edson Lobão, o ministro de Minas e Energia – do feudo de José Sarney no governo Dilma – declarou a sua intenção em retomar de imediato os leilões de petróleo das áreas do pós-sal, ao mesmo tempo em que espera a regulamentação do imbróglio sobre a distribuição dos royalties entre os estados para deflagrar os primeiros leilões do pré-sal.
E para quem ainda acha pouco, foi também divulgada a intenção do governo em enviar ao Congresso Nacional proposta de Emenda Constitucional alterando o atual monopólio da União sobre as atividades do setor nuclear. O objetivo seria o de contar com investimentos privados, inclusive estrangeiros, para se levar à frente a idéia de se construírem quatro novas usinas nucleares no país.
27/01/2011
sexta-feira, 21 de janeiro de 2011
O atraso do progresso
Chico Alencar - O Globo - 14/01/2011
‘No lugar dos valores da vida, preferiu-se o poder, o sucesso e a riqueza por si mesmos’ (Freud, 1930)
Quem analisa o século passado, da urbanização mundial, encontra um traço profético nessa afirmação do ‘pai da psicanálise’. No Brasil, o desenvolvimento econômico também tem se baseado na exacerbação da cultura individualista e na degradação da esfera pública. Mas não há progresso real se não se supera a desigualdade e o atraso político. Nesses aspectos essenciais continuamos mal.
Entre nós, onde os 10% mais ricos ainda ganham 40 vezes mais que os 10% mais pobres, o abismo social ganha tom de tragédia: enlutados, vejamos a condição da maioria absoluta dos vitimados nas enchentes de verão.
Não se culpe o destino ou uma fatalista ‘ira divina’ e sim a falta de prioridade para políticas públicas que poderiam amenizar essa dor indizível. Não se atribua tudo a fenômenos naturais, alguns de fato inéditos. O imprescindível planejamento urbano raramente desce de virtuosas Leis Orgânicas, Planos Diretores e Estatuto das Cidades para a vida. Os insuficientes investimentos em macro-drenagens, contenções e programas habitacionais contrastam com os custos adicionais bilionários da reforma do recém-reformado Maracanã, por exemplo. No plano global, as políticas contra o aquecimento, que implicariam em mudanças drásticas do nosso modo de produzir e consumir, não avançam com a celeridade das crescentes oscilações climáticas.
O país emergente que celebra crescimento tem sua dimensão política soterrada pela avalanche do interesse menor, alimentado pela enchente do desinteresse coletivo. A comovente e episódica onda de solidariedade não tem conseguido transformar-se em torrente cidadã permanente. Promessas de prevenção das autoridades vão embora com as águas de março ou fecham-se após as chuvas de abril.
Ocupar função pública, salvo exceções, não é mais missão de serviço e sim carreira promissora, inclusive com plano de vencimentos e oportunidades de negócios alentadores. Muitos no Executivo, no Legislativo e no Judiciário distanciam-se da sociedade, fechados em estamentos que se auto-regulam e tornam-se espaço de interesses privados. A moeda de troca nas alianças políticas é a distribuição de cargos e empenhos para consolidação dos ‘currais’ modernos de legitimação pelo voto – até nos recursos para a Defesa Civil! Os palácios só costumam ter alguma conexão com as praças quando ocorrem tragédias ou nos períodos bienais de captação de votos. Hannah Arendt lembrava que “a sociedade burguesa, baseada na competição e no consumismo, gerou apatia e hostilidade em relação à vida pública, não somente entre os excluídos, mas também entre elementos da própria burguesia”.
Desde os primórdios os povos enfrentam dois desafios: adequar-se à natureza, para não perecer, e limitar o poder, para as maiorias não serem escravizadas por poucos. Caminhamos entre intenções cruzadistas e suas guerras nada santas, entre avanços tecnológicos que propiciariam o bem viver e relações de dominação que excluem amplos setores desses benefícios.
É imperativo o resgate da vida pública cooperativa, transparente, participativa. Res publica livre do interesse mercantil e/ou demagógico – inclusive em relação ao solo urbano. As centenas de mortes que se repetem a cada ano nos interpelam de forma dramática.
Chico Alencar é professor de História e deputado federal (PSOL/RJ).
Publicado em O Globo em 14/01/2010
http://www.chicoalencar.com.br/_portal/artigos_do.php?codigo=854
‘No lugar dos valores da vida, preferiu-se o poder, o sucesso e a riqueza por si mesmos’ (Freud, 1930)
Quem analisa o século passado, da urbanização mundial, encontra um traço profético nessa afirmação do ‘pai da psicanálise’. No Brasil, o desenvolvimento econômico também tem se baseado na exacerbação da cultura individualista e na degradação da esfera pública. Mas não há progresso real se não se supera a desigualdade e o atraso político. Nesses aspectos essenciais continuamos mal.
Entre nós, onde os 10% mais ricos ainda ganham 40 vezes mais que os 10% mais pobres, o abismo social ganha tom de tragédia: enlutados, vejamos a condição da maioria absoluta dos vitimados nas enchentes de verão.
Não se culpe o destino ou uma fatalista ‘ira divina’ e sim a falta de prioridade para políticas públicas que poderiam amenizar essa dor indizível. Não se atribua tudo a fenômenos naturais, alguns de fato inéditos. O imprescindível planejamento urbano raramente desce de virtuosas Leis Orgânicas, Planos Diretores e Estatuto das Cidades para a vida. Os insuficientes investimentos em macro-drenagens, contenções e programas habitacionais contrastam com os custos adicionais bilionários da reforma do recém-reformado Maracanã, por exemplo. No plano global, as políticas contra o aquecimento, que implicariam em mudanças drásticas do nosso modo de produzir e consumir, não avançam com a celeridade das crescentes oscilações climáticas.
O país emergente que celebra crescimento tem sua dimensão política soterrada pela avalanche do interesse menor, alimentado pela enchente do desinteresse coletivo. A comovente e episódica onda de solidariedade não tem conseguido transformar-se em torrente cidadã permanente. Promessas de prevenção das autoridades vão embora com as águas de março ou fecham-se após as chuvas de abril.
Ocupar função pública, salvo exceções, não é mais missão de serviço e sim carreira promissora, inclusive com plano de vencimentos e oportunidades de negócios alentadores. Muitos no Executivo, no Legislativo e no Judiciário distanciam-se da sociedade, fechados em estamentos que se auto-regulam e tornam-se espaço de interesses privados. A moeda de troca nas alianças políticas é a distribuição de cargos e empenhos para consolidação dos ‘currais’ modernos de legitimação pelo voto – até nos recursos para a Defesa Civil! Os palácios só costumam ter alguma conexão com as praças quando ocorrem tragédias ou nos períodos bienais de captação de votos. Hannah Arendt lembrava que “a sociedade burguesa, baseada na competição e no consumismo, gerou apatia e hostilidade em relação à vida pública, não somente entre os excluídos, mas também entre elementos da própria burguesia”.
Desde os primórdios os povos enfrentam dois desafios: adequar-se à natureza, para não perecer, e limitar o poder, para as maiorias não serem escravizadas por poucos. Caminhamos entre intenções cruzadistas e suas guerras nada santas, entre avanços tecnológicos que propiciariam o bem viver e relações de dominação que excluem amplos setores desses benefícios.
É imperativo o resgate da vida pública cooperativa, transparente, participativa. Res publica livre do interesse mercantil e/ou demagógico – inclusive em relação ao solo urbano. As centenas de mortes que se repetem a cada ano nos interpelam de forma dramática.
Chico Alencar é professor de História e deputado federal (PSOL/RJ).
Publicado em O Globo em 14/01/2010
http://www.chicoalencar.com.br/_portal/artigos_do.php?codigo=854
segunda-feira, 10 de janeiro de 2011
Um prato de lentilha
Escrito por Gilvan Rocha
04-Jan-2011
Marx e Engels, no Manifesto Comunista, referem-se ao lumpem-proletário, camada social hoje chamada de "os excluídos", como o segmento que, dado seu estado de indigência e de desespero, estaria disposto a se vender por um prato de lentilha.
Foi justamente nesse extrato social que o partido nazista de Hitler foi recrutar os seus militantes para armá-los e adestrá-los no ofício de praticar assassinatos, promover pancadarias, dissolver manifestações políticas da classe operária, impor o terror a serviço da extrema direita. Esses agrupamentos paramilitares nazistas eram mantidos pelos capitalistas alemães que temiam um possível avanço das forças socialistas.
Diante do quadro de crise econômica e social existente naquele país e usando dos mais reprováveis métodos de ação, o nazismo conseguiu chegar ao governo e, logo após, ao poder, através do processo eleitoral que foi seguido de um golpe com o incêndio do parlamento, o Reichstag. Estava assim implantada a mais exacerbada forma de contra-revolução, e ela haveria de tentar estender os seus tentáculos por toda a Europa e, daí, para o mundo.
Não foi somente nesse episódio político que a massa lumpesina foi utilizada para fins políticos e, de uma forma ou de outra, sempre em favor dos interesses do capitalismo. Aqui no Brasil, não se deu a exploração dos excluídos para fins políticos, pela extrema direita. Não. Aqui, como na Argentina de Juan Perón e seus "descamisados", tivemos a utilização do lumpem-proletário pelo populismo, através do Bolsa Família, a um custo razoável, tomando-se como referência as grandes cifras que representam os lucros da burguesia. Construiu-se, então, um reduto eleitoral capaz de tornar vitorioso o populismo, como testemunham a recente disputa eleitoral e os altos índices de aprovação do governo Lula.
Tem-se, assim, numa ponta, um povo alegre gozando a "felicidade dos inocentes". Na outra ponta, mais alegre e consciente, está a burguesia, que "nunca antes, na história deste país", gozou de tanta tranqüilidade e fartos lucros.
Gilvan Rocha é presidente do CAEP- Centro de Atividades e Estudos Políticos.
Blog do autor: http://www.gilvanrocha.blogspot.com/.
04-Jan-2011
Marx e Engels, no Manifesto Comunista, referem-se ao lumpem-proletário, camada social hoje chamada de "os excluídos", como o segmento que, dado seu estado de indigência e de desespero, estaria disposto a se vender por um prato de lentilha.
Foi justamente nesse extrato social que o partido nazista de Hitler foi recrutar os seus militantes para armá-los e adestrá-los no ofício de praticar assassinatos, promover pancadarias, dissolver manifestações políticas da classe operária, impor o terror a serviço da extrema direita. Esses agrupamentos paramilitares nazistas eram mantidos pelos capitalistas alemães que temiam um possível avanço das forças socialistas.
Diante do quadro de crise econômica e social existente naquele país e usando dos mais reprováveis métodos de ação, o nazismo conseguiu chegar ao governo e, logo após, ao poder, através do processo eleitoral que foi seguido de um golpe com o incêndio do parlamento, o Reichstag. Estava assim implantada a mais exacerbada forma de contra-revolução, e ela haveria de tentar estender os seus tentáculos por toda a Europa e, daí, para o mundo.
Não foi somente nesse episódio político que a massa lumpesina foi utilizada para fins políticos e, de uma forma ou de outra, sempre em favor dos interesses do capitalismo. Aqui no Brasil, não se deu a exploração dos excluídos para fins políticos, pela extrema direita. Não. Aqui, como na Argentina de Juan Perón e seus "descamisados", tivemos a utilização do lumpem-proletário pelo populismo, através do Bolsa Família, a um custo razoável, tomando-se como referência as grandes cifras que representam os lucros da burguesia. Construiu-se, então, um reduto eleitoral capaz de tornar vitorioso o populismo, como testemunham a recente disputa eleitoral e os altos índices de aprovação do governo Lula.
Tem-se, assim, numa ponta, um povo alegre gozando a "felicidade dos inocentes". Na outra ponta, mais alegre e consciente, está a burguesia, que "nunca antes, na história deste país", gozou de tanta tranqüilidade e fartos lucros.
Gilvan Rocha é presidente do CAEP- Centro de Atividades e Estudos Políticos.
Blog do autor: http://www.gilvanrocha.blogspot.com/.
domingo, 9 de janeiro de 2011
quinta-feira, 6 de janeiro de 2011
POEMA DA SEMANA
“ MAS SE DESEJARMOS FORTEMENTE O MELHOR E,
PRINCIPALMENTE, SE LUTARMOS PELO MELHOR
O MELHOR VAI SE INSTALAR EM NOSSAS VIDAS
PORQUE SOU DO TAMANHO DAQUILO QUE VEJO,
E NÃO DO TAMANHO DE MINHA ALTURA. “
Carlos Drumond de Andrade
PRINCIPALMENTE, SE LUTARMOS PELO MELHOR
O MELHOR VAI SE INSTALAR EM NOSSAS VIDAS
PORQUE SOU DO TAMANHO DAQUILO QUE VEJO,
E NÃO DO TAMANHO DE MINHA ALTURA. “
Carlos Drumond de Andrade
2011
Economia e Infra-Estrutura
Paulo Passarinho
Sex, 24 de Dezembro de 2010 10:20
O que poderemos esperar do ano de 2011?
De que forma enfrentaremos o processo de crise global, cujos sintomas somente se apresentaram de forma mais nítida em nosso país ao longo de 2009, com o recuo do PIB?
Essas são perguntas que certamente devem preocupar Dilma Rousseff e a sua equipe de governo. Não sem razão, conforme lembramos em artigo anterior, Guido Mantega já vocalizou a importância de cortes nos gastos do governo, ao mesmo tempo em que voltava a repetir os compromissos assumidos com as metas fixadas para a inflação (4,5% ao ano) e para o superávit primário, e com a manutenção do sacro santo câmbio flutuante. Além disso, foi reiterada a importância da autonomia operacional do Banco Central.
A única novidade, portanto, na área macroeconômica, foi a declarada intenção de se reduzir, até o final do governo Dilma, a taxa de juros real para 2% ao ano. Para tanto, na lógica dos estrategistas do governo, seria necessário um forte ajuste das contas públicas. Dentro desse raciocínio, apenas com uma redução significativa do déficit nominal – conceito de resultado fiscal que inclui as despesas com juros da dívida pública – seria possível a queda das taxas de juros, variável essencial para a rolagem dos títulos públicos. Para a redução desse déficit nominal, o caminho seria a diminuição das despesas de custeio e de investimento do governo.
Mas, de qualquer forma, para o início do governo que toma posse em janeiro, o Banco Central já acena com uma nova elevação da taxa Selic...Com isso, entraremos no novo ano com a combinação de controles quantitativos da moeda e do crédito, cortes orçamentários e juros em alta.
Trata-se, a rigor, de uma política que irá se manter de acordo com o ponto de vista dos interesses do setor financeiro.
Tendo como objetivo a redução da taxa Selic, não há nenhuma comprovação empírica, para as condições atuais da economia brasileira, da vinculação existente entre o montante do déficit público e a taxa de juros em vigor. Ao contrário, mesmo sob as graves condições em que se encontram as economias dos países mais desenvolvidos, por exemplo, com seus gigantescos déficits orçamentários, o que observamos pelo mundo afora são baixíssimas taxas de juros, algumas inclusive menores do que as taxas de inflação em curso nas suas respectivas economias.
Contudo, isso não significa que não tenhamos sérios desafios pela frente.
Os maiores problemas a serem enfrentados se relacionam com as condições das nossas contas externas. Depois do período entre 2003 e 2007, quando obtivemos saldos positivos de nossa conta corrente – por conta da magnitude alcançada pelos saldos comerciais obtidos nesses anos – voltamos agora a registrar crescentes déficits. A razão desse quadro é a combinação representada pela forte redução do saldo comercial – ditada mais pela valorização do real do que pela crise que afetou nossas exportações – e a continuidade do crescimento de nossas despesas com serviços.
Essa evolução do saldo da conta de serviços, por sua vez, é de fato muito grave. Em 2003, primeiro ano do mandato de Lula, alcançou a cifra de US$ 23,5 bilhões, e em 2009 chegou ao montante de US$ 52,9 bilhões. Para esse ano de 2010, a estimativa é de um déficit em torno de US$ 70 bilhões e para 2011 a perspectiva é de continuidade desse processo.
É evidente que não há saldo comercial suficiente para se cobrir uma dinâmica econômica capaz de produzir rombos externos da conta de serviços dessa magnitude, por mais que aproveitemos nossas "vantagens comparativas" e continuemos a exportar matérias-primas, produtos agrícolas e minérios, mesmo com os preços dessas mercadorias turbinados pela demanda chinesa.
A razão dessa evolução do déficit da conta de serviços é diretamente relacionada ao grau de abertura da economia, em particular à desnacionalização do parque produtivo do país e o conseqüente crescimento das remessas de lucros e dividendos das empresas estrangeiras aqui instaladas. Afora o pagamento dos juros decorrentes do endividamento externo (que continua de vento em popa, especialmente pelo lado das empresas privadas), das despesas com fretes, e os gastos dos brasileiros com viagens para o exterior.
A forma que vem sendo encontrada para a cobertura desses déficits, também não é nada animadora. Atraímos recursos especulativos ou investimentos diretos. Investimentos diretos implicam, ao longo do tempo, o aumento das despesas com remessas de lucros. Aplicações financeiras especulativas levam ao aumento de nossa vulnerabilidade externa, frente a qualquer instabilidade no humor dos aplicadores.
Entretanto, alterar esse quadro implicaria mudar o atual modelo econômico de abertura e integração financeira do Brasil, combinado com a especialização regressiva que caracteriza o papel do país na atual divisão internacional do trabalho. Esse é um horizonte, na ótica de Dilma e seus aliados, absolutamente inviável.
O governo a assumir o comando do país a partir de 2011 será apenas uma continuidade do que já vem sendo feito pelo governo Lula, seguidor fiel da política macroeconômica do segundo mandato de FHC, mesmo com as variações fiscais que o agravamento da crise internacional nos impôs.
A preocupação maior dos dirigentes do governo parece ser a inflação e a sua funcionalidade para se justificar a manutenção de uma política de juros altos e garantia de lucros fáceis aos capitais rentistas.
Porém, talvez esteja chegando à hora de se desfazerem as fantasias e o povo despertar para o que de fato está em jogo. A apologia do crescimento econômico sustentado pelo endividamento do Estado e das famílias poderá começar a ser questionado. Para um país com mais de 190 milhões de brasileiros, e com o grau de desigualdades e carecimentos que temos, um padrão de cidadania baseado no crediário e no acesso aos supermercados e shopping centers é por demais limitado. Além de arriscado no médio prazo, pelo grau de endividamento – ao custo elevado das taxas de juros em vigor - das famílias que já se manifesta.
E, nesse aspecto, o comportamento predominante entre os nossos políticos, as negociações escancaradamente fisiológicas que marcam a formação do ministério de Dilma, ou a continuidade do processo de degradação dos serviços públicos voltados à população poderão despertar o povo, finalmente, para os equívocos que temos assistido na condução do país.
Que 2011 seja, portanto, a esperança de novos tempos para a política brasileira, a partir de um reinício de mobilizações e posicionamentos críticos dos trabalhadores e de seus aliados.
Afinal, os problemas de natureza econômica que temos acumulado, somente poderão começar a ser enfrentados a partir de uma nova postura dos segmentos populares, e de uma nova consciência política sobre a nossa realidade.
16/12/2010
Paulo Passarinho é economista e conselheiro do CORECON-RJ
Paulo Passarinho
Sex, 24 de Dezembro de 2010 10:20
O que poderemos esperar do ano de 2011?
De que forma enfrentaremos o processo de crise global, cujos sintomas somente se apresentaram de forma mais nítida em nosso país ao longo de 2009, com o recuo do PIB?
Essas são perguntas que certamente devem preocupar Dilma Rousseff e a sua equipe de governo. Não sem razão, conforme lembramos em artigo anterior, Guido Mantega já vocalizou a importância de cortes nos gastos do governo, ao mesmo tempo em que voltava a repetir os compromissos assumidos com as metas fixadas para a inflação (4,5% ao ano) e para o superávit primário, e com a manutenção do sacro santo câmbio flutuante. Além disso, foi reiterada a importância da autonomia operacional do Banco Central.
A única novidade, portanto, na área macroeconômica, foi a declarada intenção de se reduzir, até o final do governo Dilma, a taxa de juros real para 2% ao ano. Para tanto, na lógica dos estrategistas do governo, seria necessário um forte ajuste das contas públicas. Dentro desse raciocínio, apenas com uma redução significativa do déficit nominal – conceito de resultado fiscal que inclui as despesas com juros da dívida pública – seria possível a queda das taxas de juros, variável essencial para a rolagem dos títulos públicos. Para a redução desse déficit nominal, o caminho seria a diminuição das despesas de custeio e de investimento do governo.
Mas, de qualquer forma, para o início do governo que toma posse em janeiro, o Banco Central já acena com uma nova elevação da taxa Selic...Com isso, entraremos no novo ano com a combinação de controles quantitativos da moeda e do crédito, cortes orçamentários e juros em alta.
Trata-se, a rigor, de uma política que irá se manter de acordo com o ponto de vista dos interesses do setor financeiro.
Tendo como objetivo a redução da taxa Selic, não há nenhuma comprovação empírica, para as condições atuais da economia brasileira, da vinculação existente entre o montante do déficit público e a taxa de juros em vigor. Ao contrário, mesmo sob as graves condições em que se encontram as economias dos países mais desenvolvidos, por exemplo, com seus gigantescos déficits orçamentários, o que observamos pelo mundo afora são baixíssimas taxas de juros, algumas inclusive menores do que as taxas de inflação em curso nas suas respectivas economias.
Contudo, isso não significa que não tenhamos sérios desafios pela frente.
Os maiores problemas a serem enfrentados se relacionam com as condições das nossas contas externas. Depois do período entre 2003 e 2007, quando obtivemos saldos positivos de nossa conta corrente – por conta da magnitude alcançada pelos saldos comerciais obtidos nesses anos – voltamos agora a registrar crescentes déficits. A razão desse quadro é a combinação representada pela forte redução do saldo comercial – ditada mais pela valorização do real do que pela crise que afetou nossas exportações – e a continuidade do crescimento de nossas despesas com serviços.
Essa evolução do saldo da conta de serviços, por sua vez, é de fato muito grave. Em 2003, primeiro ano do mandato de Lula, alcançou a cifra de US$ 23,5 bilhões, e em 2009 chegou ao montante de US$ 52,9 bilhões. Para esse ano de 2010, a estimativa é de um déficit em torno de US$ 70 bilhões e para 2011 a perspectiva é de continuidade desse processo.
É evidente que não há saldo comercial suficiente para se cobrir uma dinâmica econômica capaz de produzir rombos externos da conta de serviços dessa magnitude, por mais que aproveitemos nossas "vantagens comparativas" e continuemos a exportar matérias-primas, produtos agrícolas e minérios, mesmo com os preços dessas mercadorias turbinados pela demanda chinesa.
A razão dessa evolução do déficit da conta de serviços é diretamente relacionada ao grau de abertura da economia, em particular à desnacionalização do parque produtivo do país e o conseqüente crescimento das remessas de lucros e dividendos das empresas estrangeiras aqui instaladas. Afora o pagamento dos juros decorrentes do endividamento externo (que continua de vento em popa, especialmente pelo lado das empresas privadas), das despesas com fretes, e os gastos dos brasileiros com viagens para o exterior.
A forma que vem sendo encontrada para a cobertura desses déficits, também não é nada animadora. Atraímos recursos especulativos ou investimentos diretos. Investimentos diretos implicam, ao longo do tempo, o aumento das despesas com remessas de lucros. Aplicações financeiras especulativas levam ao aumento de nossa vulnerabilidade externa, frente a qualquer instabilidade no humor dos aplicadores.
Entretanto, alterar esse quadro implicaria mudar o atual modelo econômico de abertura e integração financeira do Brasil, combinado com a especialização regressiva que caracteriza o papel do país na atual divisão internacional do trabalho. Esse é um horizonte, na ótica de Dilma e seus aliados, absolutamente inviável.
O governo a assumir o comando do país a partir de 2011 será apenas uma continuidade do que já vem sendo feito pelo governo Lula, seguidor fiel da política macroeconômica do segundo mandato de FHC, mesmo com as variações fiscais que o agravamento da crise internacional nos impôs.
A preocupação maior dos dirigentes do governo parece ser a inflação e a sua funcionalidade para se justificar a manutenção de uma política de juros altos e garantia de lucros fáceis aos capitais rentistas.
Porém, talvez esteja chegando à hora de se desfazerem as fantasias e o povo despertar para o que de fato está em jogo. A apologia do crescimento econômico sustentado pelo endividamento do Estado e das famílias poderá começar a ser questionado. Para um país com mais de 190 milhões de brasileiros, e com o grau de desigualdades e carecimentos que temos, um padrão de cidadania baseado no crediário e no acesso aos supermercados e shopping centers é por demais limitado. Além de arriscado no médio prazo, pelo grau de endividamento – ao custo elevado das taxas de juros em vigor - das famílias que já se manifesta.
E, nesse aspecto, o comportamento predominante entre os nossos políticos, as negociações escancaradamente fisiológicas que marcam a formação do ministério de Dilma, ou a continuidade do processo de degradação dos serviços públicos voltados à população poderão despertar o povo, finalmente, para os equívocos que temos assistido na condução do país.
Que 2011 seja, portanto, a esperança de novos tempos para a política brasileira, a partir de um reinício de mobilizações e posicionamentos críticos dos trabalhadores e de seus aliados.
Afinal, os problemas de natureza econômica que temos acumulado, somente poderão começar a ser enfrentados a partir de uma nova postura dos segmentos populares, e de uma nova consciência política sobre a nossa realidade.
16/12/2010
Paulo Passarinho é economista e conselheiro do CORECON-RJ
terça-feira, 4 de janeiro de 2011
POEMA DA SEMANA
O ANALFABETO POLÍTICO
O pior analfabeto é o analfabeto político. Ele não ouve, não fala, nem participa dos acontecimentos políticos. Ele não sabe que o custo de vida, o preço do feijão, do peixe, da farinha, do aluguel, do sapato e do remédio dependem das decisões políticas.
O analfabeto político é tão burro que se orgulha e estufa o peito dizendo que odeia a política. Não sabe o imbecil que, da sua ignorância política, nasce a prostituta, o menor abandonado, e o pior de todos os bandidos, que é o político vigarista, pilantra, corrupto e lacaio dos exploradores do povo.
Bertolt Brecht
Poeta e dramaturgo alemão
O pior analfabeto é o analfabeto político. Ele não ouve, não fala, nem participa dos acontecimentos políticos. Ele não sabe que o custo de vida, o preço do feijão, do peixe, da farinha, do aluguel, do sapato e do remédio dependem das decisões políticas.
O analfabeto político é tão burro que se orgulha e estufa o peito dizendo que odeia a política. Não sabe o imbecil que, da sua ignorância política, nasce a prostituta, o menor abandonado, e o pior de todos os bandidos, que é o político vigarista, pilantra, corrupto e lacaio dos exploradores do povo.
Bertolt Brecht
Poeta e dramaturgo alemão
Um partido imprescindível
Segurança Pessoal e Direitos Humanos
Chico Alencar
Ter, 14 de Dezembro de 2010 10:59
O intimorato Marcelo Freixo – que inspira o 'deputado Fraga', do Tropa de Elite II – só pode propor e presidir a CPI das Milícias porque é do PSOL. E o partido, reconheça-se, como força orgânica e mobilização, devia ter se empenhado mais nessa dura empreitada. Mas a legenda, ainda em formação, é a única que não tinha e não tem 'mediações' com o esquema mafioso que, há pouco, era reconhecido por quase todos da institucionalidade política como 'auto-defesa comunitária'. Estrutura criminosa que segue em ascensão, com a conivência de muitas forças políticas do Estado do Rio de Janeiro, frente às quais o PSOL diz um radical 'não'.
O PSOL, um novo partido contra a velha política, se constitui como alternativa de esquerda na sociedade brasileira. E isso implica em não compactuar com qualquer processa que, em nome da Segurança Pública, implique em negociatas, ilegalidades, prepotência, corrupção e, ao fim e ao cabo, ódio aos pobres.
O PSOL não enxerga, como quase todos os outros partidos políticos e seu conhecido viés eleitoreiro, as áreas desassistidas pelo Poder Público como currais de votos, espaço de manipulação, campo da demagogia que prolifera na carência e na desinformação induzida.
O PSOL não aceita que, em nome do 'pragmatismo', se rompam fronteiras éticas e ideológicas. Uma governabilidade corrompida, que restaura poder e prestígio de oligarcas, caciques e coronéis urbanos, jamais será transformadora. E não contribuirá para que as maiorias sociais se constituam em maiorias políticas.
A atuação do deputado Marcelo Freixo, com sua história de militância dedicada aos Direitos Humanos e ao estímulo à organização dos 'de baixo' (forte expressão do saudoso Florestan Fernandes), materializa a proposta do PSOL e compõe, ela própria, o significado maior do partido: instrumento, meio, canal de elevação do protagonismo popular contra todas as injustiças e desigualdades.
Marcelo Freixo e sua equipe – só assim, coletivamente, funcionamos! – ressignificou a defesa intransigente dos Direitos Humanos na urbi conflitada como expressão contemporânea da luta de classes. A proclamação da indivisibilidade e universalidade dos Direitos Humanos questiona o sistema capitalista fundado na discriminação e na exploração. As relações do capital nas grandes concentrações urbanas se manifestam na própria reprodução da cidade segmentada e nas políticas públicas que privilegiam alguns bairros em detrimento de muitos outros. O solo urbano, na ótica do valor absoluto da propriedade sem qualquer função social, é mercadoria, e os seres humanos que ali vivem meros objetos da dinâmica mercantil dessa apropriação.
O Programa do PSOL, jamais peça acabada e dogmática, é, a um só tempo, cumprido fielmente e fecundado criativamente pela atuação parlamentar de Marcelo Freixo – e de todo(a)s que militam nesses marcos. Partido vivo e programa dinâmico são reelaborados permanentemente, sem ferir os princípios fundamentais do Socialismo e da Liberdade.
O eixo programático do PSOL é sustentado pela prática da mobilização social dos oprimidos e dos libertários. É isso que nutre a defesa de medidas de repartição dos bens socialmente produzidos, o cuidado ambiental e o projeto de poder político para os trabalhadore(a)s. Programa de ruptura com o sistema que ameaça a existência da humanidade e do planeta, hoje reconhecidos como indissociáveis. Programa que articula, de um lado, as iniciativas de radical desmercantilização da vida e, de outro, as demandas imediatas – às vezes setoriais e defensivas – da maioria do povo, sem cingir-se ao corporativismo e ao economicismo.
Para o PSOL de Freixo e de mais 50 mil filiados, igualmente importantes, o combate à corrupção é um tema estratégico, pois envolve a utilização dos recursos públicos geridos pelo Estado Brasileiro (tão serviçal dos grandes interesses privados) pela classe dominante. Por isso, Marcelo Freixo do PSOL foi e continuará sendo um incômodo para aqueles que fazem dos seus mandatos meios de engorda patrimonial através de espúrias negociatas. Que o digam o ex-chefe de polícia civil e ex-deputado do RJ Álvaro Lins, e as ex-deputadas fluminenses do 'Bolsa Educação'... Historiador, Marcelo sabe do caráter estrutural e sistêmico da corrupção: "aqui o verbo roubar é conjugado em todos os tempos, modos e lugares", pregava o padre Antonio Vieira, no século XVII.
Marcelo Freixo só podia ser do PSOL, como tantos de nós, porque sabe que partidos, governos e parlamentos estão se tornando, cada vez mais, 'organizações totais', fechadas, empresariais, baseadas na 'lealdade' ao poder dominante e na 'competência' da vitória a qualquer preço, com muito dinheiro sujo e sem escrúpulos. O PSOL não aceita a privatização da política e sua submissão aos interesses do Capital, que retribui com propinas e reprodução de mandatos através das campanhas milionárias, que registraram a média de gastos de R$1,1 milhão na última eleição para a Câmara dos Deputados e 54% dos congressistas eleitos bancados por empreiteiras.
Marcelo Freixo é o PSOL que investiga, denuncia e anuncia: polícias e políticos, para dar alguma segurança de vida à população tão vulnerável, têm que parar de traficar armas e de praticar crimes, imbricados com máfias e milícias.
O PSOL e Marcelo Freixo sabem: o 'diretor de arte' daquela cena macabra de centenas de traficantes com chinelos nos pés e fuzis de alta precisão nos ombros, caminhando de uma favela a outra, no subúrbio do Rio, no dia 25 de novembro de 2010, é um só, nada genial: a omissão do Poder Público. Omissão que, no outro lado da moeda podre, estampa sua cumplicidade com a manutenção das áreas de miséria e de afronta à dignidade humana.
O PSOL só tem sentido de existir se combater, sem tréguas, essa sociedade do 'desvínculo', do individualismo, do hiperconsumo, da invisibilidade de tantos que sustenta o luxo e a pós-cidadania dos privilégios de uns poucos. Freixo encarna essa estúpida luta. E por isso os estúpidos e canalhas tentam calá-lo. Em vão.
Chico Alencar é professor de História e deputado federal pelo PSol-RJ
http://socialismo.org.br/portal/seguranca-pessoal-e-direitos-humanos/179-artigo/1840-um-partido-imprescindivel
Chico Alencar
Ter, 14 de Dezembro de 2010 10:59
O intimorato Marcelo Freixo – que inspira o 'deputado Fraga', do Tropa de Elite II – só pode propor e presidir a CPI das Milícias porque é do PSOL. E o partido, reconheça-se, como força orgânica e mobilização, devia ter se empenhado mais nessa dura empreitada. Mas a legenda, ainda em formação, é a única que não tinha e não tem 'mediações' com o esquema mafioso que, há pouco, era reconhecido por quase todos da institucionalidade política como 'auto-defesa comunitária'. Estrutura criminosa que segue em ascensão, com a conivência de muitas forças políticas do Estado do Rio de Janeiro, frente às quais o PSOL diz um radical 'não'.
O PSOL, um novo partido contra a velha política, se constitui como alternativa de esquerda na sociedade brasileira. E isso implica em não compactuar com qualquer processa que, em nome da Segurança Pública, implique em negociatas, ilegalidades, prepotência, corrupção e, ao fim e ao cabo, ódio aos pobres.
O PSOL não enxerga, como quase todos os outros partidos políticos e seu conhecido viés eleitoreiro, as áreas desassistidas pelo Poder Público como currais de votos, espaço de manipulação, campo da demagogia que prolifera na carência e na desinformação induzida.
O PSOL não aceita que, em nome do 'pragmatismo', se rompam fronteiras éticas e ideológicas. Uma governabilidade corrompida, que restaura poder e prestígio de oligarcas, caciques e coronéis urbanos, jamais será transformadora. E não contribuirá para que as maiorias sociais se constituam em maiorias políticas.
A atuação do deputado Marcelo Freixo, com sua história de militância dedicada aos Direitos Humanos e ao estímulo à organização dos 'de baixo' (forte expressão do saudoso Florestan Fernandes), materializa a proposta do PSOL e compõe, ela própria, o significado maior do partido: instrumento, meio, canal de elevação do protagonismo popular contra todas as injustiças e desigualdades.
Marcelo Freixo e sua equipe – só assim, coletivamente, funcionamos! – ressignificou a defesa intransigente dos Direitos Humanos na urbi conflitada como expressão contemporânea da luta de classes. A proclamação da indivisibilidade e universalidade dos Direitos Humanos questiona o sistema capitalista fundado na discriminação e na exploração. As relações do capital nas grandes concentrações urbanas se manifestam na própria reprodução da cidade segmentada e nas políticas públicas que privilegiam alguns bairros em detrimento de muitos outros. O solo urbano, na ótica do valor absoluto da propriedade sem qualquer função social, é mercadoria, e os seres humanos que ali vivem meros objetos da dinâmica mercantil dessa apropriação.
O Programa do PSOL, jamais peça acabada e dogmática, é, a um só tempo, cumprido fielmente e fecundado criativamente pela atuação parlamentar de Marcelo Freixo – e de todo(a)s que militam nesses marcos. Partido vivo e programa dinâmico são reelaborados permanentemente, sem ferir os princípios fundamentais do Socialismo e da Liberdade.
O eixo programático do PSOL é sustentado pela prática da mobilização social dos oprimidos e dos libertários. É isso que nutre a defesa de medidas de repartição dos bens socialmente produzidos, o cuidado ambiental e o projeto de poder político para os trabalhadore(a)s. Programa de ruptura com o sistema que ameaça a existência da humanidade e do planeta, hoje reconhecidos como indissociáveis. Programa que articula, de um lado, as iniciativas de radical desmercantilização da vida e, de outro, as demandas imediatas – às vezes setoriais e defensivas – da maioria do povo, sem cingir-se ao corporativismo e ao economicismo.
Para o PSOL de Freixo e de mais 50 mil filiados, igualmente importantes, o combate à corrupção é um tema estratégico, pois envolve a utilização dos recursos públicos geridos pelo Estado Brasileiro (tão serviçal dos grandes interesses privados) pela classe dominante. Por isso, Marcelo Freixo do PSOL foi e continuará sendo um incômodo para aqueles que fazem dos seus mandatos meios de engorda patrimonial através de espúrias negociatas. Que o digam o ex-chefe de polícia civil e ex-deputado do RJ Álvaro Lins, e as ex-deputadas fluminenses do 'Bolsa Educação'... Historiador, Marcelo sabe do caráter estrutural e sistêmico da corrupção: "aqui o verbo roubar é conjugado em todos os tempos, modos e lugares", pregava o padre Antonio Vieira, no século XVII.
Marcelo Freixo só podia ser do PSOL, como tantos de nós, porque sabe que partidos, governos e parlamentos estão se tornando, cada vez mais, 'organizações totais', fechadas, empresariais, baseadas na 'lealdade' ao poder dominante e na 'competência' da vitória a qualquer preço, com muito dinheiro sujo e sem escrúpulos. O PSOL não aceita a privatização da política e sua submissão aos interesses do Capital, que retribui com propinas e reprodução de mandatos através das campanhas milionárias, que registraram a média de gastos de R$1,1 milhão na última eleição para a Câmara dos Deputados e 54% dos congressistas eleitos bancados por empreiteiras.
Marcelo Freixo é o PSOL que investiga, denuncia e anuncia: polícias e políticos, para dar alguma segurança de vida à população tão vulnerável, têm que parar de traficar armas e de praticar crimes, imbricados com máfias e milícias.
O PSOL e Marcelo Freixo sabem: o 'diretor de arte' daquela cena macabra de centenas de traficantes com chinelos nos pés e fuzis de alta precisão nos ombros, caminhando de uma favela a outra, no subúrbio do Rio, no dia 25 de novembro de 2010, é um só, nada genial: a omissão do Poder Público. Omissão que, no outro lado da moeda podre, estampa sua cumplicidade com a manutenção das áreas de miséria e de afronta à dignidade humana.
O PSOL só tem sentido de existir se combater, sem tréguas, essa sociedade do 'desvínculo', do individualismo, do hiperconsumo, da invisibilidade de tantos que sustenta o luxo e a pós-cidadania dos privilégios de uns poucos. Freixo encarna essa estúpida luta. E por isso os estúpidos e canalhas tentam calá-lo. Em vão.
Chico Alencar é professor de História e deputado federal pelo PSol-RJ
http://socialismo.org.br/portal/seguranca-pessoal-e-direitos-humanos/179-artigo/1840-um-partido-imprescindivel
Assinar:
Postagens
(
Atom
)