"UMA IDEIA TORNA-SE UMA FORÇA MATERIAL QUANDO GANHA AS MASSAS ORGANIZADAS".
Karl Marx
quinta-feira, 30 de junho de 2011
segunda-feira, 27 de junho de 2011
FRASE DA SEMANA
" EDUCAR É CRESCER. E CRESCER É VIVER. EDUCAÇÃO É ASSIM, VIDA NO SENTIDO MAIS AUTÊNTICO DA PALAVRA."
Anísio Teixeira
Anísio Teixeira
domingo, 26 de junho de 2011
A inflação e a dívida pública
Economia e Infra-Estrutura
Maria Lucia Fattorelli
Qui, 16 de Junho de 2011 11:11
É evidente que toda a sociedade apoia o controle da inflação, porém os instrumentos utilizados pelo Banco Central não estão de fato combatendo a alta de preços, mas se prestam a promover uma brutal transferência de recursos públicos para o setor financeiro privado, a elevadíssimo custo, tanto financeiro como social
Maria Lucia FattorelliMaria Lucia FattorelliEm razão da marca negativa deixada pela inflação galopante dos anos 1980 até início dos anos 1990, não foi difícil convencer a população, parlamentares e poderes constituídos de que o país necessitava de um "Regime de Metas de Inflação".
Na realidade, tal regime foi imposto pelo FMI, em ambiente econômico afetado por crises financeiras que abalaram diversas economias no final da década de 1990.
A opção do governo brasileiro de recorrer ao Fundo em 1998 abriu caminho para a interferência da instituição em diversos assuntos internos do país, entre eles a exigência de que a definição de metas inflacionárias deveria ser uma das principais diretrizes da política monetária. Colocando em prática o compromisso assumido com o FMI, foi editado o Decreto 3.088, em junho de 1999, estabelecendo a sistemática de "metas de inflação" como diretriz para fixação do regime de política monetária.
Na mesma época, o Banco Central editou a Circular 2.868/99, por meio da qual criou a taxa Selic e, desde então, tem utilizado a referida taxa de juros como instrumento de controle da inflação, forçando sua elevação toda vez que a expectativa de alta de preços ameaça superar as metas estabelecidas.
Outro instrumento colocado em prática pelo Banco Central para regular a inflação tem sido o controle do volume de moeda em circulação, realizando as chamadas "operações de mercado aberto", por meio das quais entrega títulos da dívida pública às instituições financeiras em troca de eventual excesso, informado pelos bancos, de moeda nacional ou estrangeira.
Dados oficiais demonstram o equívoco desses dois instrumentos utilizados pelo Banco Central:
1. A elevação da Selic não ajuda a controlar o tipo de inflação de preços existente no país. Tal medida tem servido para elevar continuamente as já altíssimas taxas de juros, impactando no crescimento acelerado da dívida pública, além de prejudicar a distribuição de recursos para todas as áreas do orçamento e impedir investimentos na economia real.
2. As operações de mercado aberto estão servindo para trocar dólares especulativos, que ingressam no país sem controle, por títulos da dívida pública, que pagam os juros mais elevados do mundo. Tal mecanismo tem provocado megaprejuízos operacionais ao Banco Central − R$ 147 bilhões em 2009 e R$ 50 bilhões em 2010 −, o que representa significativo dano ao patrimônio público.
É evidente que toda a sociedade apoia o controle da inflação, porém os instrumentos que vêm sendo utilizados pelo Banco Central não estão de fato combatendo a alta de preços, mas se prestam a promover uma brutal transferência de recursos públicos para o setor financeiro privado – nacional e internacional – a elevadíssimo custo interno, tanto financeiro como social, e por isso precisam ser revistos.
Selic não controla a inflação
A teoria ortodoxa que defende a elevação da taxa de juros como remédio para controlar a inflação se aplicaria somente quando a alta de preços decorresse de excesso de demanda. Em tese, a elevação dos juros tentaria dificultar o consumo e frear a demanda, buscando conter a subida de preços provocada pelo excesso de procura dos produtos e serviços.
Essa teoria não é unânime, pois mesmo diante de processo inflacionário causado por excesso de demanda, a solução recomendável não seria a elevação dos juros, pois essa alta provoca aumento dos custos financeiros das empresas, que são repassados aos preços dos produtos. Além disso, juros altos provocam a queda dos investimentos de longo prazo em novas plantas produtivas. Isso reduz a oferta futura de produtos e serviços, dando margem a leituras equivocadas de que a demanda estaria mais alta que a oferta, o que justificaria novas elevações de juros em um círculo vicioso e danoso para a economia.
No Brasil, ao contrário do que alegam governo e rentistas, a inflação atual não é causada por suposto excesso de demanda, mas tem sido provocada por contínuos e elevados reajustes dos preços de alimentos e preços administrados, tais como combustíveis, energia elétrica, telefonia, transporte público, serviços bancários.1 Esses itens afetam todos os preços de bens e serviços vendidos no país, pois fazem parte da composição de seus custos. Adicionalmente, o preço dos alimentos e demais preços administrados não são reduzidos quando o governo promove uma elevação da taxa Selic.
Para combater esse tipo de inflação – denominada inflação de preços –, o remédio adequado é o efetivo controle de tais preços, o que poderia ser feito pelo governo sem grandes dificuldades, já que estamos falando justamente de preços administrados, que em tese devem ser geridos pelo poder público.
O problema é que a maioria desses setores passou pelo processo de privatização – cuja justificativa, na década de 1990, era o pagamento da dívida externa. Em mãos privadas, a reivindicação de lucros cada vez maiores leva ao fornecimento de serviços cada vez mais caros. É o caso, por exemplo, da telefonia no Brasil, que após a privatização passou a ser a mais cara do mundo, ao mesmo tempo que é campeã de reclamações dos consumidores. As empresas de telefonia auferem lucros espantosos anualmente e não realizam os investimentos necessários. O mesmo ocorre com empresas de energia elétrica e transportes públicos, serviços altamente lucrativos, em decorrência do alto preço das tarifas cobradas. A elevação contínua desses preços tem pesado no cômputo da inflação e não sofre redução quando os juros sobem.
Os combustíveis, então, nem se fala: exercem influência direta na composição de todos os preços e serviços no país. O preço da gasolina é um dos maiores do mundo, apesar de nossa autossuficiência, das recentes descobertas de imensas jazidas e dos significativos lucros da Petrobras. A parcela dos lucros correspondentes às ações da Petrobras vendidas ao setor privado é distribuída na forma de dividendos, mas a fração do lucro correspondente ao capital estatal é destinada ao pagamento da dívida pública. Isso porque a Lei 9.530 trata do privilégio na destinação de recursos para o pagamento da dívida, determinando que todos os lucros das estatais destinados ao governo, superávits financeiros e demais disponibilidades de estatais, fundos e autarquias têm essa finalidade.
Da forma como está regulamentado o "Regime de Metas de Inflação", toda vez que a inflação ameaça ultrapassar a meta estabelecida (atualmente em 4,5% ao ano), seu controle é feito por meio da elevação da taxa Selic, desconsiderando-se as verdadeiras causas do aumento de preços no Brasil.
O resultado tem sido o crescimento explosivo da dívida pública, cujo montante supera R$ 2,5 trilhões, enquanto o pagamento de juros e amortizações consumiu 45% dos recursos do orçamento federal em 2010, conforme mostra o gráfico.
A Comissão Parlamentar de Inquérito (CPI) da Dívida Pública, concluída em 2010 na Câmara dos Deputados, comprovou que as altas taxas de juros foram o principal fator responsável pelo contínuo crescimento da dívida pública, apesar dos vultosos pagamentos anuais de juros e amortizações. A CPI comprovou que a dívida pública brasileira não tem contrapartida real em bens ou serviços, mas se multiplica em função de mecanismos e artifícios meramente financeiros, bem como da incidência de "juros sobre juros", o que configura "anatocismo", prática considerada ilegal pelo Supremo Tribunal Federal.
Em resumo, as mesmas autoridades monetárias que defendem a elevação das taxas de juros com a justificativa de controle inflacionário permitem contínua elevação nos preços administrados, o que é um total contrassenso. Adicionalmente, os órgãos de defesa da livre concorrência não têm conseguido combater adequadamente os cartéis privados que também afetam a formação dos preços.
Como são definidas as taxas de juros
A CPI da Dívida realizou importante e inédita investigação sobre aspectos do endividamento interno e externo brasileiro, tendo se dedicado também a investigar como são determinadas as taxas Selic, já que os juros são o principal responsável pelo crescimento acelerado da dívida brasileira.
O Banco Central informou à CPI que para estabelecer o patamar das taxas de juros não utiliza fórmulas científicas, mas realiza consultas a "analistas independentes", em reuniões periódicas. O resultado dessas reuniões constitui o fundamento para a definição da Selic pelo Comitê de Política Monetária (Copom), pois nelas são apresentadas estimativas sobre a evolução futura de variáveis como inflação, evolução de preços e taxa de juros.
A CPI requereu ao Banco Central os nomes dos participantes dessas reuniões. A resposta permitiu confirmar o que já se esperava: a imensa maioria deles (95%) faz parte do setor financeiro, ou seja, são representantes de bancos, fundos de investimento ou consultores de mercado. São justamente os maiores interessados nas elevadas taxas de juros, que lhes proporcionam elevados lucros, configurando evidente conflito de interesses.
O mais grave é que muitos desses participantes das reuniões do Banco Central são também os mesmos analistas consultados por grandes meios de comunicação, que passam a alardear temores relacionados ao temerário crescimento da inflação e a necessidade de combater tal previsão, recomendando sempre a elevação das taxas de juros como se fosse o único remédio eficaz para frear o retorno inflacionário.
Em poucos dias de governo, ao mesmo tempo que a presidente Dilma Rousseff procedeu ao contingenciamento recorde de R$ 50 bilhões para fazer "ajuste fiscal", a taxa Selic subiu três vezes com a justificativa de que tal medida era necessária para reduzir o ritmo da atividade econômica, diminuir a demanda e controlar a inflação.
As operações de mercado aberto
Desde a aprovação da Lei de Responsabilidade Fiscal (LRF), o Banco Central ficou proibido de emitir títulos da dívida brasileira, o que é feito exclusivamente pelo Tesouro Nacional. Na prática, essa proibição não tem valor, pois o Tesouro emite títulos e os entrega ao Banco Central, sem qualquer contrapartida ou limite, para que aquela autarquia exerça a política monetária.
A justificativa para essa prática, que dribla a LRF, é, mais uma vez, a necessidade de o Banco Central "enxugar" o excesso de moeda em circulação, tendo em vista que isso pode provocar inflação.
O volume dessas operações de mercado aberto já ultrapassa a cifra dos R$ 500 bilhões, e estatísticas oficiais costumam não incluir esse valor no saldo da dívida, com a justificativa de que seriam títulos da dívida em poder do Banco Central. Isso não corresponde à realidade, pois tais títulos são entregues aos bancos em troca do "excesso de moeda" nacional ou estrangeira e fazem parte dos compromissos assumidos pela República.
Desde que o dólar começou a se desvalorizar em todo o mundo, o volume dessas operações de mercado aberto passou a aumentar aceleradamente, pois os especuladores viram o gatilho acionado pelo "Regime de Metas de Inflação" como uma tremenda oportunidade para trazer seus dólares para o Brasil e trocá-los por títulos da dívida pública brasileira, que pagam os maiores juros do mundo, isentos de qualquer tributo, podendo fugir do país quando bem entenderem, engordados pela variação cambial.2
Como esse gatilho é acionado? O Banco Central acompanha o volume das reservas bancárias – principalmente depósitos e saldos de caixa – dos bancos e das instituições financeiras instaladas no país. Se esse volume supera determinado patamar, entende-se que há excesso de moeda em circulação que precisa ser enxugado a fim de evitar o risco inflacionário. Para diminuir esse excesso, o Banco Central realiza as chamadas operações de mercado aberto, entregando títulos da dívida aos bancos e ficando com a moeda excedente, que ultimamente pode ser representada por montanhas diárias de dólares que vêm para o país em busca do negócio mais generoso do mundo: troca de dólares por títulos da dívida brasileira.
Por sua vez, o Banco Central fica com os dólares e os destina às Reservas Internacionais, que já superam US$ 300 bilhões e não rendem quase nada ao país, pois estão aplicadas em grande parte em títulos da dívida norte-americana, que pagam juros próximos de zero. Além disso, ainda temos de arcar com os custos de senhoriagem.
Conforme citado anteriormente, esse mecanismo tem sido um dos principais responsáveis pelo enorme prejuízo operacional do Banco Central – R$ 147 bilhões em 2009 e R$ 50 bilhões em 2010 –, que é repassado para o Tesouro Nacional e pago com recursos do orçamento que deixam de ser destinados ao atendimento de necessidades urgentes do povo brasileiro, ou pago mediante a emissão de mais títulos da dívida pública.
Em resumo, para combater o risco inflacionário, estamos "enxugando" o excesso de moeda que evidentemente não decorre de superaquecimento da atividade econômica no país, mas de movimento especulativo que tem beneficiado escandalosamente o setor financeiro nacional e internacional, cujos lucros batem recordes anuais e superam dezenas de bilhões de dólares.
Com essas reflexões, verificamos a necessidade urgente de rever a política monetária vigente no país. Com o rótulo de combater a inflação, estamos garantindo os maiores lucros do mundo ao setor financeiro privado, por meio da escandalosa transferência de recursos públicos, que fazem muita falta no combate à infame miséria que acomete mais de 100 milhões de brasileiros. Estes nem sequer têm acesso a saneamento básico, apesar de arcarem com pesada carga tributária embutida em todos os produtos de primeira necessidade que conseguem comprar com esmolas, Bolsa Família ou pífios salários.
Alternativas para o efetivo combate à inflação existem e são muito mais eficientes: redução da taxa de juros; controle e redução dos preços administrados; reforma agrária para garantir a produção de alimentos não sujeitos à variação internacional dos preços de commodities; controle de capitais para evitar o ingresso de capitais abutres, meramente especulativos, e fugas nocivas à economia real; adoção de medidas tributárias apropriadas ao controle de preços. Para que essas medidas sejam adotadas, é necessário enfrentar o endividamento público, cancro que adoece nosso rico país e impede o curso da Justiça.
Maria Lucia Fattorelli, graduada em Administração e Ciências Contábeis, é Auditora Fiscal da Receita Federal desde 1982, coordenadora da Auditoria Cidadã da Dívida e membro do CAIC (Comisión para la Auditoría Integral de Crédito Público) criada pelo Presidente Rafael Correa em 2007.
Notas:
1 Dados do IBGE sobre a inflação de janeiro a abril de 2011 comprovam que 73% da inflação verificada no período e medida pelo Índice Nacional de Preços ao Consumidor Amplo (IPCA) foi causada por problemas de oferta de alimentos ou por preços administrados pelo próprio governo. Na expressiva parcela de 73% está considerada a variação dos preços de alimentação, taxa de água e esgoto, transporte público, combustíveis de veículos, educação, plano de saúde, energia elétrica, telefonia, serviço bancário. Interessante observar que até mesmo o setor bancário – que mais se beneficia com a elevação da Selic, pois é aquele que detém a maior parte dos títulos da dívida – promoveu a elevação de suas tarifas em 5,46% no período, número muito acima da média geral da inflação estabelecida, de 3,23%. Tal fato denota a contradição entre o discurso e a prática do referido setor.
2 A variação cambial tem favorecido os investidores e especuladores que trazem dólares para o Brasil e convertem tais dólares em reais, aplicando-os na Bolsa ou em títulos da dívida. Considerando que o dólar tem se desvalorizado continuamente em relação ao real, decorrido algum tempo, quando resgatam suas aplicações e as reconvertem a uma taxa de dólar mais baixo, obtêm um volume de dólares bem maior.
Maria Lucia Fattorelli
Qui, 16 de Junho de 2011 11:11
É evidente que toda a sociedade apoia o controle da inflação, porém os instrumentos utilizados pelo Banco Central não estão de fato combatendo a alta de preços, mas se prestam a promover uma brutal transferência de recursos públicos para o setor financeiro privado, a elevadíssimo custo, tanto financeiro como social
Maria Lucia FattorelliMaria Lucia FattorelliEm razão da marca negativa deixada pela inflação galopante dos anos 1980 até início dos anos 1990, não foi difícil convencer a população, parlamentares e poderes constituídos de que o país necessitava de um "Regime de Metas de Inflação".
Na realidade, tal regime foi imposto pelo FMI, em ambiente econômico afetado por crises financeiras que abalaram diversas economias no final da década de 1990.
A opção do governo brasileiro de recorrer ao Fundo em 1998 abriu caminho para a interferência da instituição em diversos assuntos internos do país, entre eles a exigência de que a definição de metas inflacionárias deveria ser uma das principais diretrizes da política monetária. Colocando em prática o compromisso assumido com o FMI, foi editado o Decreto 3.088, em junho de 1999, estabelecendo a sistemática de "metas de inflação" como diretriz para fixação do regime de política monetária.
Na mesma época, o Banco Central editou a Circular 2.868/99, por meio da qual criou a taxa Selic e, desde então, tem utilizado a referida taxa de juros como instrumento de controle da inflação, forçando sua elevação toda vez que a expectativa de alta de preços ameaça superar as metas estabelecidas.
Outro instrumento colocado em prática pelo Banco Central para regular a inflação tem sido o controle do volume de moeda em circulação, realizando as chamadas "operações de mercado aberto", por meio das quais entrega títulos da dívida pública às instituições financeiras em troca de eventual excesso, informado pelos bancos, de moeda nacional ou estrangeira.
Dados oficiais demonstram o equívoco desses dois instrumentos utilizados pelo Banco Central:
1. A elevação da Selic não ajuda a controlar o tipo de inflação de preços existente no país. Tal medida tem servido para elevar continuamente as já altíssimas taxas de juros, impactando no crescimento acelerado da dívida pública, além de prejudicar a distribuição de recursos para todas as áreas do orçamento e impedir investimentos na economia real.
2. As operações de mercado aberto estão servindo para trocar dólares especulativos, que ingressam no país sem controle, por títulos da dívida pública, que pagam os juros mais elevados do mundo. Tal mecanismo tem provocado megaprejuízos operacionais ao Banco Central − R$ 147 bilhões em 2009 e R$ 50 bilhões em 2010 −, o que representa significativo dano ao patrimônio público.
É evidente que toda a sociedade apoia o controle da inflação, porém os instrumentos que vêm sendo utilizados pelo Banco Central não estão de fato combatendo a alta de preços, mas se prestam a promover uma brutal transferência de recursos públicos para o setor financeiro privado – nacional e internacional – a elevadíssimo custo interno, tanto financeiro como social, e por isso precisam ser revistos.
Selic não controla a inflação
A teoria ortodoxa que defende a elevação da taxa de juros como remédio para controlar a inflação se aplicaria somente quando a alta de preços decorresse de excesso de demanda. Em tese, a elevação dos juros tentaria dificultar o consumo e frear a demanda, buscando conter a subida de preços provocada pelo excesso de procura dos produtos e serviços.
Essa teoria não é unânime, pois mesmo diante de processo inflacionário causado por excesso de demanda, a solução recomendável não seria a elevação dos juros, pois essa alta provoca aumento dos custos financeiros das empresas, que são repassados aos preços dos produtos. Além disso, juros altos provocam a queda dos investimentos de longo prazo em novas plantas produtivas. Isso reduz a oferta futura de produtos e serviços, dando margem a leituras equivocadas de que a demanda estaria mais alta que a oferta, o que justificaria novas elevações de juros em um círculo vicioso e danoso para a economia.
No Brasil, ao contrário do que alegam governo e rentistas, a inflação atual não é causada por suposto excesso de demanda, mas tem sido provocada por contínuos e elevados reajustes dos preços de alimentos e preços administrados, tais como combustíveis, energia elétrica, telefonia, transporte público, serviços bancários.1 Esses itens afetam todos os preços de bens e serviços vendidos no país, pois fazem parte da composição de seus custos. Adicionalmente, o preço dos alimentos e demais preços administrados não são reduzidos quando o governo promove uma elevação da taxa Selic.
Para combater esse tipo de inflação – denominada inflação de preços –, o remédio adequado é o efetivo controle de tais preços, o que poderia ser feito pelo governo sem grandes dificuldades, já que estamos falando justamente de preços administrados, que em tese devem ser geridos pelo poder público.
O problema é que a maioria desses setores passou pelo processo de privatização – cuja justificativa, na década de 1990, era o pagamento da dívida externa. Em mãos privadas, a reivindicação de lucros cada vez maiores leva ao fornecimento de serviços cada vez mais caros. É o caso, por exemplo, da telefonia no Brasil, que após a privatização passou a ser a mais cara do mundo, ao mesmo tempo que é campeã de reclamações dos consumidores. As empresas de telefonia auferem lucros espantosos anualmente e não realizam os investimentos necessários. O mesmo ocorre com empresas de energia elétrica e transportes públicos, serviços altamente lucrativos, em decorrência do alto preço das tarifas cobradas. A elevação contínua desses preços tem pesado no cômputo da inflação e não sofre redução quando os juros sobem.
Os combustíveis, então, nem se fala: exercem influência direta na composição de todos os preços e serviços no país. O preço da gasolina é um dos maiores do mundo, apesar de nossa autossuficiência, das recentes descobertas de imensas jazidas e dos significativos lucros da Petrobras. A parcela dos lucros correspondentes às ações da Petrobras vendidas ao setor privado é distribuída na forma de dividendos, mas a fração do lucro correspondente ao capital estatal é destinada ao pagamento da dívida pública. Isso porque a Lei 9.530 trata do privilégio na destinação de recursos para o pagamento da dívida, determinando que todos os lucros das estatais destinados ao governo, superávits financeiros e demais disponibilidades de estatais, fundos e autarquias têm essa finalidade.
Da forma como está regulamentado o "Regime de Metas de Inflação", toda vez que a inflação ameaça ultrapassar a meta estabelecida (atualmente em 4,5% ao ano), seu controle é feito por meio da elevação da taxa Selic, desconsiderando-se as verdadeiras causas do aumento de preços no Brasil.
O resultado tem sido o crescimento explosivo da dívida pública, cujo montante supera R$ 2,5 trilhões, enquanto o pagamento de juros e amortizações consumiu 45% dos recursos do orçamento federal em 2010, conforme mostra o gráfico.
A Comissão Parlamentar de Inquérito (CPI) da Dívida Pública, concluída em 2010 na Câmara dos Deputados, comprovou que as altas taxas de juros foram o principal fator responsável pelo contínuo crescimento da dívida pública, apesar dos vultosos pagamentos anuais de juros e amortizações. A CPI comprovou que a dívida pública brasileira não tem contrapartida real em bens ou serviços, mas se multiplica em função de mecanismos e artifícios meramente financeiros, bem como da incidência de "juros sobre juros", o que configura "anatocismo", prática considerada ilegal pelo Supremo Tribunal Federal.
Em resumo, as mesmas autoridades monetárias que defendem a elevação das taxas de juros com a justificativa de controle inflacionário permitem contínua elevação nos preços administrados, o que é um total contrassenso. Adicionalmente, os órgãos de defesa da livre concorrência não têm conseguido combater adequadamente os cartéis privados que também afetam a formação dos preços.
Como são definidas as taxas de juros
A CPI da Dívida realizou importante e inédita investigação sobre aspectos do endividamento interno e externo brasileiro, tendo se dedicado também a investigar como são determinadas as taxas Selic, já que os juros são o principal responsável pelo crescimento acelerado da dívida brasileira.
O Banco Central informou à CPI que para estabelecer o patamar das taxas de juros não utiliza fórmulas científicas, mas realiza consultas a "analistas independentes", em reuniões periódicas. O resultado dessas reuniões constitui o fundamento para a definição da Selic pelo Comitê de Política Monetária (Copom), pois nelas são apresentadas estimativas sobre a evolução futura de variáveis como inflação, evolução de preços e taxa de juros.
A CPI requereu ao Banco Central os nomes dos participantes dessas reuniões. A resposta permitiu confirmar o que já se esperava: a imensa maioria deles (95%) faz parte do setor financeiro, ou seja, são representantes de bancos, fundos de investimento ou consultores de mercado. São justamente os maiores interessados nas elevadas taxas de juros, que lhes proporcionam elevados lucros, configurando evidente conflito de interesses.
O mais grave é que muitos desses participantes das reuniões do Banco Central são também os mesmos analistas consultados por grandes meios de comunicação, que passam a alardear temores relacionados ao temerário crescimento da inflação e a necessidade de combater tal previsão, recomendando sempre a elevação das taxas de juros como se fosse o único remédio eficaz para frear o retorno inflacionário.
Em poucos dias de governo, ao mesmo tempo que a presidente Dilma Rousseff procedeu ao contingenciamento recorde de R$ 50 bilhões para fazer "ajuste fiscal", a taxa Selic subiu três vezes com a justificativa de que tal medida era necessária para reduzir o ritmo da atividade econômica, diminuir a demanda e controlar a inflação.
As operações de mercado aberto
Desde a aprovação da Lei de Responsabilidade Fiscal (LRF), o Banco Central ficou proibido de emitir títulos da dívida brasileira, o que é feito exclusivamente pelo Tesouro Nacional. Na prática, essa proibição não tem valor, pois o Tesouro emite títulos e os entrega ao Banco Central, sem qualquer contrapartida ou limite, para que aquela autarquia exerça a política monetária.
A justificativa para essa prática, que dribla a LRF, é, mais uma vez, a necessidade de o Banco Central "enxugar" o excesso de moeda em circulação, tendo em vista que isso pode provocar inflação.
O volume dessas operações de mercado aberto já ultrapassa a cifra dos R$ 500 bilhões, e estatísticas oficiais costumam não incluir esse valor no saldo da dívida, com a justificativa de que seriam títulos da dívida em poder do Banco Central. Isso não corresponde à realidade, pois tais títulos são entregues aos bancos em troca do "excesso de moeda" nacional ou estrangeira e fazem parte dos compromissos assumidos pela República.
Desde que o dólar começou a se desvalorizar em todo o mundo, o volume dessas operações de mercado aberto passou a aumentar aceleradamente, pois os especuladores viram o gatilho acionado pelo "Regime de Metas de Inflação" como uma tremenda oportunidade para trazer seus dólares para o Brasil e trocá-los por títulos da dívida pública brasileira, que pagam os maiores juros do mundo, isentos de qualquer tributo, podendo fugir do país quando bem entenderem, engordados pela variação cambial.2
Como esse gatilho é acionado? O Banco Central acompanha o volume das reservas bancárias – principalmente depósitos e saldos de caixa – dos bancos e das instituições financeiras instaladas no país. Se esse volume supera determinado patamar, entende-se que há excesso de moeda em circulação que precisa ser enxugado a fim de evitar o risco inflacionário. Para diminuir esse excesso, o Banco Central realiza as chamadas operações de mercado aberto, entregando títulos da dívida aos bancos e ficando com a moeda excedente, que ultimamente pode ser representada por montanhas diárias de dólares que vêm para o país em busca do negócio mais generoso do mundo: troca de dólares por títulos da dívida brasileira.
Por sua vez, o Banco Central fica com os dólares e os destina às Reservas Internacionais, que já superam US$ 300 bilhões e não rendem quase nada ao país, pois estão aplicadas em grande parte em títulos da dívida norte-americana, que pagam juros próximos de zero. Além disso, ainda temos de arcar com os custos de senhoriagem.
Conforme citado anteriormente, esse mecanismo tem sido um dos principais responsáveis pelo enorme prejuízo operacional do Banco Central – R$ 147 bilhões em 2009 e R$ 50 bilhões em 2010 –, que é repassado para o Tesouro Nacional e pago com recursos do orçamento que deixam de ser destinados ao atendimento de necessidades urgentes do povo brasileiro, ou pago mediante a emissão de mais títulos da dívida pública.
Em resumo, para combater o risco inflacionário, estamos "enxugando" o excesso de moeda que evidentemente não decorre de superaquecimento da atividade econômica no país, mas de movimento especulativo que tem beneficiado escandalosamente o setor financeiro nacional e internacional, cujos lucros batem recordes anuais e superam dezenas de bilhões de dólares.
Com essas reflexões, verificamos a necessidade urgente de rever a política monetária vigente no país. Com o rótulo de combater a inflação, estamos garantindo os maiores lucros do mundo ao setor financeiro privado, por meio da escandalosa transferência de recursos públicos, que fazem muita falta no combate à infame miséria que acomete mais de 100 milhões de brasileiros. Estes nem sequer têm acesso a saneamento básico, apesar de arcarem com pesada carga tributária embutida em todos os produtos de primeira necessidade que conseguem comprar com esmolas, Bolsa Família ou pífios salários.
Alternativas para o efetivo combate à inflação existem e são muito mais eficientes: redução da taxa de juros; controle e redução dos preços administrados; reforma agrária para garantir a produção de alimentos não sujeitos à variação internacional dos preços de commodities; controle de capitais para evitar o ingresso de capitais abutres, meramente especulativos, e fugas nocivas à economia real; adoção de medidas tributárias apropriadas ao controle de preços. Para que essas medidas sejam adotadas, é necessário enfrentar o endividamento público, cancro que adoece nosso rico país e impede o curso da Justiça.
Maria Lucia Fattorelli, graduada em Administração e Ciências Contábeis, é Auditora Fiscal da Receita Federal desde 1982, coordenadora da Auditoria Cidadã da Dívida e membro do CAIC (Comisión para la Auditoría Integral de Crédito Público) criada pelo Presidente Rafael Correa em 2007.
Notas:
1 Dados do IBGE sobre a inflação de janeiro a abril de 2011 comprovam que 73% da inflação verificada no período e medida pelo Índice Nacional de Preços ao Consumidor Amplo (IPCA) foi causada por problemas de oferta de alimentos ou por preços administrados pelo próprio governo. Na expressiva parcela de 73% está considerada a variação dos preços de alimentação, taxa de água e esgoto, transporte público, combustíveis de veículos, educação, plano de saúde, energia elétrica, telefonia, serviço bancário. Interessante observar que até mesmo o setor bancário – que mais se beneficia com a elevação da Selic, pois é aquele que detém a maior parte dos títulos da dívida – promoveu a elevação de suas tarifas em 5,46% no período, número muito acima da média geral da inflação estabelecida, de 3,23%. Tal fato denota a contradição entre o discurso e a prática do referido setor.
2 A variação cambial tem favorecido os investidores e especuladores que trazem dólares para o Brasil e convertem tais dólares em reais, aplicando-os na Bolsa ou em títulos da dívida. Considerando que o dólar tem se desvalorizado continuamente em relação ao real, decorrido algum tempo, quando resgatam suas aplicações e as reconvertem a uma taxa de dólar mais baixo, obtêm um volume de dólares bem maior.
PORQUE CONTINUAR NA MILITÂNCIA POLÍTICA ?
Alguns amigos e familiares, volta e meia, me perguntam do por que insistir na militância política por um partido pequeno, de esquerda e socialista que tem a pretensa proposta de romper com o modelo vigente, dada as condições pragmáticas e pouco republicanas de se fazer política nos dias de hoje. Alegam também que a população de uma maneira geral coloca todo mundo que participa do ambiente político na vala comum e não reconhece nesta “geléia geral” pessoas que realmente pretendem defender verdadeiramente o interesse coletivo.
A resposta que dou é sempre inspirada numa frase de um cidadão que admiro muito: Frei Betto. “ Posso não ficar para a colheita, mas insisto em morrer semente.”
Este é o sentimento que me move. Compreendo a dificuldade das pessoas de acreditarem que possa ter pessoas bem intencionadas participando do enfrentamento político. Há várias pessoas sérias na luta política dando exemplo todo dia. A grande mídia divulga pouco estas pessoas, por isso, requer por parte dos cidadãos um esforço maior em busca destas informações. Há também pessoas que preferem a crítica fácil, de que todos são iguais sem ter a mínima vontade de antes de emitirem pareceres gerais se aprofundar um pouco na análise e conhecimento do histórico do postulante a cargo público eletivo. Toda generalização é tremendamente injusta.
Outros tentam ridicularizar tal militância, entendendo que só deve participar do jogo político quem tiver a certeza de uma boa votação, reduzindo o conteúdo político apenas a questão eleitoral. Não reconhecem que a provocação de um debate mais amplo de temas podem favorecer e contribuir para a elevação da cidadania e do nível de informação da sociedade.
São muros altos que normalmente fazem muitos desistirem. Tenho presenciado a capitulação de vários companheiros nesta luta. Lamento muito estas perdas. Entretanto, quero dizer a estas pessoas que tais muros e dificuldades jamais me impediram de continuar minha luta por mudanças. Quer acreditem ou não vão me encontrar participando da vida política da cidade que escolhi para viver, independente das “armas e instrumentos” que estiverem disponíveis para esta atuação.
Resultados negativos sob o ponto de vista eleitoral não vão me abater. Gozações, piadinhas, maledicências, menos ainda. Sou maior que estas coisas. Não tenho pretensão de realização pessoal na política. Repito: o que me move é o sentimento coletivo.
Se quissesse trilhar um caminho fácil, e convites não faltaram para isso, não estaria no PSOL, na trincheira ao lado dos trabalhadores, categoria ao qual me orgulho de pertencer. Cargo público para mim tem que estar associado a um processo de avanços e mudanças que possam trazer melhoras para a sociedade de maneira geral, mas preferenciamente, ao conjunto da classe trabalhadora.
Não me vejo militando na estrutura conservadora dos grandes partidos, onde a subserviência à manutenção do status quo é total. Eles não querem mudar nada. Prometem e não cumprem, e a população anestesiada os reelege para mandatos sucessivos de obediência ao grande capital e interesses privados.
Voltando a frase do Frei Betto, alegra-me saber que já deixei algumas sementes: Na minha família e filhos, no sindicato regional que fundei e participo, na federação nacional da minha categoria profissional que fundei e fui presidente e também em algumas pessoas que ajudei e encaminhei.
Espero também deixar alguma semente no campo político. Me recuso a abandonar meus sonhos e minhas utopias a despeito da opinião e da descrença de muitos.
“ Temos que opor ao pessimismo da razão o otimismo da vontade.”
Antonio Gramsci
Cláudio Leitão é economista, propagandista, dirigente sindical e presidente do diretório municipal do PSOL em Cabo Frio.
A resposta que dou é sempre inspirada numa frase de um cidadão que admiro muito: Frei Betto. “ Posso não ficar para a colheita, mas insisto em morrer semente.”
Este é o sentimento que me move. Compreendo a dificuldade das pessoas de acreditarem que possa ter pessoas bem intencionadas participando do enfrentamento político. Há várias pessoas sérias na luta política dando exemplo todo dia. A grande mídia divulga pouco estas pessoas, por isso, requer por parte dos cidadãos um esforço maior em busca destas informações. Há também pessoas que preferem a crítica fácil, de que todos são iguais sem ter a mínima vontade de antes de emitirem pareceres gerais se aprofundar um pouco na análise e conhecimento do histórico do postulante a cargo público eletivo. Toda generalização é tremendamente injusta.
Outros tentam ridicularizar tal militância, entendendo que só deve participar do jogo político quem tiver a certeza de uma boa votação, reduzindo o conteúdo político apenas a questão eleitoral. Não reconhecem que a provocação de um debate mais amplo de temas podem favorecer e contribuir para a elevação da cidadania e do nível de informação da sociedade.
São muros altos que normalmente fazem muitos desistirem. Tenho presenciado a capitulação de vários companheiros nesta luta. Lamento muito estas perdas. Entretanto, quero dizer a estas pessoas que tais muros e dificuldades jamais me impediram de continuar minha luta por mudanças. Quer acreditem ou não vão me encontrar participando da vida política da cidade que escolhi para viver, independente das “armas e instrumentos” que estiverem disponíveis para esta atuação.
Resultados negativos sob o ponto de vista eleitoral não vão me abater. Gozações, piadinhas, maledicências, menos ainda. Sou maior que estas coisas. Não tenho pretensão de realização pessoal na política. Repito: o que me move é o sentimento coletivo.
Se quissesse trilhar um caminho fácil, e convites não faltaram para isso, não estaria no PSOL, na trincheira ao lado dos trabalhadores, categoria ao qual me orgulho de pertencer. Cargo público para mim tem que estar associado a um processo de avanços e mudanças que possam trazer melhoras para a sociedade de maneira geral, mas preferenciamente, ao conjunto da classe trabalhadora.
Não me vejo militando na estrutura conservadora dos grandes partidos, onde a subserviência à manutenção do status quo é total. Eles não querem mudar nada. Prometem e não cumprem, e a população anestesiada os reelege para mandatos sucessivos de obediência ao grande capital e interesses privados.
Voltando a frase do Frei Betto, alegra-me saber que já deixei algumas sementes: Na minha família e filhos, no sindicato regional que fundei e participo, na federação nacional da minha categoria profissional que fundei e fui presidente e também em algumas pessoas que ajudei e encaminhei.
Espero também deixar alguma semente no campo político. Me recuso a abandonar meus sonhos e minhas utopias a despeito da opinião e da descrença de muitos.
“ Temos que opor ao pessimismo da razão o otimismo da vontade.”
Antonio Gramsci
Cláudio Leitão é economista, propagandista, dirigente sindical e presidente do diretório municipal do PSOL em Cabo Frio.
terça-feira, 21 de junho de 2011
FRASE DA SEMANA
“O HOMEM NÃO TERIA ALCANÇADO O POSSÍVEL SE, REPETIDAS VEZES, NÃO TIVESSE TENTADO O IMPOSSÍVEL.”
Max Weber
Max Weber
quarta-feira, 15 de junho de 2011
É o dinheiro, estúpido!
CHICO ALENCAR
Enriquecimento patrimonial atípico não causa desconforto sequer em partido que tem inspiração socialista, cada vez mais ligado às corporações
A famosa exclamação do publicitário James Carville -"É a economia, estúpido!"- aventando a derrota de Bush pai para Bill Clinton, em 1992, admite paráfrase sobre o Brasil de hoje. O caso Palocci vai muito além da consultoria milionária que prestou enquanto exercia mandato de deputado federal.
O essencial da questão produz, recorrentemente, características regressistas à nossa República: a total promiscuidade entre negócios privados e interesse público.
O deus dinheiro dogmatiza a afirmação de que a vivência como gestor público "é experiência única, que dá enorme valor de mercado".
Enriquecimento patrimonial atípico não provoca desconforto sequer em partido de inspiração socialista, cada vez mais vinculado às grandes corporações. Afinal, "enriquecer não é crime", e até para o procurador não há o que procurar.
Um autor muito caro aos petistas de antigamente, Karl Marx, em "As Lutas de Classe na França", com sua análise acurada do contexto europeu da metade do século 19, ainda joga luz ao que acontece aqui: "As enormes somas que passavam pelas mãos do Estado davam a oportunidade para fraudulentos contratos de fornecimento, corrupção, subornos, malversações e ladroeiras de todo gênero. A pilhagem por atacado do Estado pelos financistas repetia-se a varejo nas obras públicas".
Ontem como hoje, o Estado não é fortalecido para prover à população os serviços fundamentais, mas, sim, para viabilizar riquezas e a perpetuação dos seus operadores.
Privatiza-se a política: os fetiches de dinheiro e prosperidade, ícones da cultura dominante, estão inoculados no nosso sistema eleitoral.
A eleição de representantes da população demanda crescentes recursos, restritivos a que maiorias sociais se tornem maiorias políticas. Dos eleitos para o Congresso, 55% tiveram financiamentos de grandes empreiteiras.
Os amálgamas das bancadas parlamentares não são doutrinas e projetos, mas interesses imediatos: do banco, da bola, da bala, da motosserra. Todos os chamados "grandes candidatos" ao Executivo têm os mesmos provedores: instituições financeiras, mineradoras, construtoras, agroindústrias.
Os partidos políticos, desideologizados, consórcios para ocupação de espaços clientelistas da administração, são empresas que produzem a mercadoria voto, cujo combustível de fidelização é a política de clientela e um governismo atávico. A militância de ideias e de causas encolhe diante do poder dissolvente do dinheiro.
No Brasil, cumprir a lei é revolucionário. Na administração pública, a simples prática dos princípios constitucionais da legalidade, da moralidade, da impessoalidade e da publicidade, em todos os níveis, seria transformadora. Esses preceitos já deviam ter vedado qualquer atividade empresarial privada concorrente com a função pública, que exige dedicação integral.
Sob a aparente "normalidade", entretanto, algo se move. As revoltas populares nos países árabes e as praças ocupadas por jovens e desempregados na Europa, em especial na Espanha, na Grécia e em Portugal, chegam até nós.
A cobrança mobilizadora tem eixos culturais mudancistas, como eliminação de privilégios, serviços públicos de qualidade, garantia de direitos sociais, combate às desigualdades, controle das movimentações financeiras e democracia participativa. Questionando o sistema político e o cinismo partidário, a multidão na Porta do Sol, em Madri, proclama: "Nossos sonhos não cabem nas suas urnas".
Por diversas formas, esse clamor também crescerá aqui.
CHICO ALENCAR é deputado federal (PSOL/RJ).
Enriquecimento patrimonial atípico não causa desconforto sequer em partido que tem inspiração socialista, cada vez mais ligado às corporações
A famosa exclamação do publicitário James Carville -"É a economia, estúpido!"- aventando a derrota de Bush pai para Bill Clinton, em 1992, admite paráfrase sobre o Brasil de hoje. O caso Palocci vai muito além da consultoria milionária que prestou enquanto exercia mandato de deputado federal.
O essencial da questão produz, recorrentemente, características regressistas à nossa República: a total promiscuidade entre negócios privados e interesse público.
O deus dinheiro dogmatiza a afirmação de que a vivência como gestor público "é experiência única, que dá enorme valor de mercado".
Enriquecimento patrimonial atípico não provoca desconforto sequer em partido de inspiração socialista, cada vez mais vinculado às grandes corporações. Afinal, "enriquecer não é crime", e até para o procurador não há o que procurar.
Um autor muito caro aos petistas de antigamente, Karl Marx, em "As Lutas de Classe na França", com sua análise acurada do contexto europeu da metade do século 19, ainda joga luz ao que acontece aqui: "As enormes somas que passavam pelas mãos do Estado davam a oportunidade para fraudulentos contratos de fornecimento, corrupção, subornos, malversações e ladroeiras de todo gênero. A pilhagem por atacado do Estado pelos financistas repetia-se a varejo nas obras públicas".
Ontem como hoje, o Estado não é fortalecido para prover à população os serviços fundamentais, mas, sim, para viabilizar riquezas e a perpetuação dos seus operadores.
Privatiza-se a política: os fetiches de dinheiro e prosperidade, ícones da cultura dominante, estão inoculados no nosso sistema eleitoral.
A eleição de representantes da população demanda crescentes recursos, restritivos a que maiorias sociais se tornem maiorias políticas. Dos eleitos para o Congresso, 55% tiveram financiamentos de grandes empreiteiras.
Os amálgamas das bancadas parlamentares não são doutrinas e projetos, mas interesses imediatos: do banco, da bola, da bala, da motosserra. Todos os chamados "grandes candidatos" ao Executivo têm os mesmos provedores: instituições financeiras, mineradoras, construtoras, agroindústrias.
Os partidos políticos, desideologizados, consórcios para ocupação de espaços clientelistas da administração, são empresas que produzem a mercadoria voto, cujo combustível de fidelização é a política de clientela e um governismo atávico. A militância de ideias e de causas encolhe diante do poder dissolvente do dinheiro.
No Brasil, cumprir a lei é revolucionário. Na administração pública, a simples prática dos princípios constitucionais da legalidade, da moralidade, da impessoalidade e da publicidade, em todos os níveis, seria transformadora. Esses preceitos já deviam ter vedado qualquer atividade empresarial privada concorrente com a função pública, que exige dedicação integral.
Sob a aparente "normalidade", entretanto, algo se move. As revoltas populares nos países árabes e as praças ocupadas por jovens e desempregados na Europa, em especial na Espanha, na Grécia e em Portugal, chegam até nós.
A cobrança mobilizadora tem eixos culturais mudancistas, como eliminação de privilégios, serviços públicos de qualidade, garantia de direitos sociais, combate às desigualdades, controle das movimentações financeiras e democracia participativa. Questionando o sistema político e o cinismo partidário, a multidão na Porta do Sol, em Madri, proclama: "Nossos sonhos não cabem nas suas urnas".
Por diversas formas, esse clamor também crescerá aqui.
CHICO ALENCAR é deputado federal (PSOL/RJ).
ATENÇÃO BOMBEIROS !
A recente greve e os atos reivindicatórios dos bombeiros têm provocado uma série de debates e divergências na sociedade sobre a legalidade e a legitimidade do movimento.
Sob o ponto de vista legal, constitucional, a greve é ilegal. Desde a Constituição de 1988, o Corpo de Bombeiros deixou de ser uma instituição civil e passou a ser uma instituição militar, logo, sem direito de greve. Neste caso, a decretação de greve provoca um rompimento institucional e abre sempre precedentes perigosos. Os setores que defendem a greve alegam que o próprio Estado também deixa de cumprir vários preceitos constitucionais quando não proporciona ao povo políticas públicas satisfatórias em várias áreas, como por exemplo, na saúde e na educação.
É importante ressaltar que nos principais regimes democráticos do mundo também existem restrições à greve de instituições militares, principalmente as Forças Armadas.
Entretanto, ao avaliarmos a questão salarial dos bombeiros o movimento tende a ganhar legitimidade, já que o soldo é incompatível com a importância dos bombeiros para a sociedade. È um salário indigno, principalmente quando comparado ao salário da corporação nos outros Estados com o potencial econômico do Estado do Rio de Janeiro. No Distrito Federal, por exemplo, o piso situa-se na faixa de 4.000,00 reais.
Deixando o muro de lado, o meu posicionamento político e também do meu partido, o PSOL, é de apoio à greve. Entretanto, entendo que o melhor caminho não era a greve e nem a invasão do quartel central para manter o movimento dentro da legalidade e legitimidade. Acho que deveria ser tentado primeiro um movimento de paralisação de certas atividades, mas mantendo os serviços essenciais, em respeito a população, que mesmo assim tem apoiado, em sua maioria, o movimento grevista, que nos últimos dias passou a contar também com apoio da Polícia Militar, mas sem fazer greve, outra instituição que no nosso Estado recebe salários também irrisórios, bem abaixo da média nacional.
O que é importante frisar e neste ponto os bombeiros precisam fazer uma reflexão, é que, historicamente, seus integrantes votam exatamente nestes políticos conservadores que se revezam no poder e que não promovem políticas de valorização de seus salários, além de um conjunto de políticas públicas que poderiam mudar a realidade de suas famílias. Uma vez melhoradas as condições salariais vão continuar elegendo sempre os mesmos e os velhos dilemas irão continuar. Os partidos de esquerda, entre eles o PSOL, sabem que não tem o voto e nem o apoio eleitoral da corporação, mas por uma questão de corte de classe não se furtam de expressar seus respectivos posicionamentos políticos e ideológicos em defesa dos trabalhadores.
A truculenta ação do Governo Sergio Cabral refletiu as mesmas ações que por exemplo, a Polícia Militar exerceu contra os professores numa recente greve no final do ano passado. Pimenta nos olhos dos outros não pode ser refresco.
“ A emancipação dos trabalhadores será obra dos próprios trabalhadores.”
Karl Marx
Cláudio Leitão é economista, propagandista, dirigente sindical e presidente do diretório municipal do PSOL em Cabo Frio.
Sob o ponto de vista legal, constitucional, a greve é ilegal. Desde a Constituição de 1988, o Corpo de Bombeiros deixou de ser uma instituição civil e passou a ser uma instituição militar, logo, sem direito de greve. Neste caso, a decretação de greve provoca um rompimento institucional e abre sempre precedentes perigosos. Os setores que defendem a greve alegam que o próprio Estado também deixa de cumprir vários preceitos constitucionais quando não proporciona ao povo políticas públicas satisfatórias em várias áreas, como por exemplo, na saúde e na educação.
É importante ressaltar que nos principais regimes democráticos do mundo também existem restrições à greve de instituições militares, principalmente as Forças Armadas.
Entretanto, ao avaliarmos a questão salarial dos bombeiros o movimento tende a ganhar legitimidade, já que o soldo é incompatível com a importância dos bombeiros para a sociedade. È um salário indigno, principalmente quando comparado ao salário da corporação nos outros Estados com o potencial econômico do Estado do Rio de Janeiro. No Distrito Federal, por exemplo, o piso situa-se na faixa de 4.000,00 reais.
Deixando o muro de lado, o meu posicionamento político e também do meu partido, o PSOL, é de apoio à greve. Entretanto, entendo que o melhor caminho não era a greve e nem a invasão do quartel central para manter o movimento dentro da legalidade e legitimidade. Acho que deveria ser tentado primeiro um movimento de paralisação de certas atividades, mas mantendo os serviços essenciais, em respeito a população, que mesmo assim tem apoiado, em sua maioria, o movimento grevista, que nos últimos dias passou a contar também com apoio da Polícia Militar, mas sem fazer greve, outra instituição que no nosso Estado recebe salários também irrisórios, bem abaixo da média nacional.
O que é importante frisar e neste ponto os bombeiros precisam fazer uma reflexão, é que, historicamente, seus integrantes votam exatamente nestes políticos conservadores que se revezam no poder e que não promovem políticas de valorização de seus salários, além de um conjunto de políticas públicas que poderiam mudar a realidade de suas famílias. Uma vez melhoradas as condições salariais vão continuar elegendo sempre os mesmos e os velhos dilemas irão continuar. Os partidos de esquerda, entre eles o PSOL, sabem que não tem o voto e nem o apoio eleitoral da corporação, mas por uma questão de corte de classe não se furtam de expressar seus respectivos posicionamentos políticos e ideológicos em defesa dos trabalhadores.
A truculenta ação do Governo Sergio Cabral refletiu as mesmas ações que por exemplo, a Polícia Militar exerceu contra os professores numa recente greve no final do ano passado. Pimenta nos olhos dos outros não pode ser refresco.
“ A emancipação dos trabalhadores será obra dos próprios trabalhadores.”
Karl Marx
Cláudio Leitão é economista, propagandista, dirigente sindical e presidente do diretório municipal do PSOL em Cabo Frio.
quarta-feira, 8 de junho de 2011
FRASE DA SEMANA
“SÓ QUANDO A ÚLTIMA ÁRVORE FOR DERRUBADA, O ÚLTIMO PEIXE FOR MORTO E O ÚLTIMO RIO FOR POLUÍDO É QUE O HOMEM PERCEBERÁ QUE NÃO PODE COMER DINHEIRO.”
Provérbio indígena
Provérbio indígena
Baile de Máscaras
Baile de Máscaras PDF Imprimir E-mail
Política
Chico Alencar
Sex, 10 de Junho de 2011 11:53
"Dancei a música que tocava no baile". Em acorde de sinceridade, o ex-governador do Distrito Federal José Roberto Arruda agitou, no fim do ano passado, a batuta de maestro para explicar os dobrados dissonantes da corrupção. O baile em questão é o sistema político brasileiro. E a orquestra, segundo ele, é a de "empresas e lobistas que ajudam nas campanhas para terem retorno, por meio de facilidades na obtenção de contratos com o governo". Mais retumbante impossível. Palocci que o diga, se estivesse disposto a ser vocalista do "projeto" que regeu.
O baile de máscaras da política, que frauda a festa da democracia participativa e barra a cidadania, prossegue madrugada do país adentro. Músicos da moeda sonante seguem tocando alto, com seu diversificado repertório: consultorias, licitações dirigidas. Às suas costas, telões registram polpudos cachês. Como cantou o regente do mensalão do DEM, "ninguém se elege pela força de suas ideias, mas pelo tamanho do bolso".
Nesse baile da Ilha Fiscal do século XXI, o prefeito da maior cidade da América do Sul, em carreira solo, rompe com sua banda originária e declara-se disposto a formar outra – a trigésima do Brasil. Os sets de dança ainda não foram selecionados, pois não está claro o gosto dos convivas. O crooner do Partido Sem Definição promete música para todo gosto: nem esquerda nem direita, nem governo nem oposição. E, dois pra lá, dois pra cá, referencia-se em JK, irritando a família do saudoso pé de valsa, ao tocar de ouvido o governismo de quem não existe sem a companhia do poder: "Como pode o peixe vivo viver fora da água fria?" Haja fôlego para tanto trombone, sax e trompete...
Súbito, a percussão se agiganta, anunciando mais embalo na festança. Com a tranquilidade de quem toca o violino afinado não mais em palhoças mas em palácios, a voz hoje silente do conselheiro de mansões pouco civis recomendava ao par interesse público-negócio privado que dançasse bem colado. Quando as garrafas das barganhas partidárias já entulham mesas e os dançarinos parecem começar a se cansar dos hits da podridão, eis que adentram o sarau, animadíssimos, os fichas-sujas de 2010! Brotos de barbalhos, tocando bumbos, pandeiros e chocalhos. Tiram cordas – não tão apertadas – do pescoço, para fazê-las vibrar, agudas, no baixo, em violões e guitarras. Ninguém mais irá segurá-los na portaria, pois sua credencial vem da alta Corte, na qual seis músicos eruditos definiram a partitura na contramão do coral de milhões de cidadãos, de muitos tribunais e do Ministério Público Federal. Apoteose da politicalha, murmuram os cansados com tamanho chá de cadeira. Saudosistas do romantismo pré-delubiano observam, desolados, o revival do antigo sucesso que atravessa, pelo esquecimento, a harmonia da ética: "É ou não é, piada de salão?" Para quem quer festa de largo, forró pé de serra e samba na praça, a Reforma Política, em novos cenários, oferecerá tons mais adequados? Afinal, os músicos serão os mesmos de agora, pagos pelos que só querem a dança inter pares, para sua própria diversão.
Mas está em curso um debate, sobre propostas de Reforma Política apresentadas pela plataforma dos movimentos sociais. Também a Frente Parlamentar de Combate à Corrupção listou 94 projetos que reforçam os controles contra o roubo de dinheiro público e pressiona por sua votação. Daí sairá o ritmo para mudanças reais no nosso sistema político, para o qual se busca mobilização similar à da Lei da Ficha Limpa. A multidão de barrados no baile dos 'eleitos' precisa, enfim, tocar seu próprio instrumento, compor sua canção e dançar no balanço afroguarani, eurotupi e judárabe tão brasileiro. Só assim conquistaremos uma democracia de alta intensidade, e a festa infame dos refestelados com dinheiro público começará a acabar.
09/06/2011
Fonte: Congresso em Foco
Política
Chico Alencar
Sex, 10 de Junho de 2011 11:53
"Dancei a música que tocava no baile". Em acorde de sinceridade, o ex-governador do Distrito Federal José Roberto Arruda agitou, no fim do ano passado, a batuta de maestro para explicar os dobrados dissonantes da corrupção. O baile em questão é o sistema político brasileiro. E a orquestra, segundo ele, é a de "empresas e lobistas que ajudam nas campanhas para terem retorno, por meio de facilidades na obtenção de contratos com o governo". Mais retumbante impossível. Palocci que o diga, se estivesse disposto a ser vocalista do "projeto" que regeu.
O baile de máscaras da política, que frauda a festa da democracia participativa e barra a cidadania, prossegue madrugada do país adentro. Músicos da moeda sonante seguem tocando alto, com seu diversificado repertório: consultorias, licitações dirigidas. Às suas costas, telões registram polpudos cachês. Como cantou o regente do mensalão do DEM, "ninguém se elege pela força de suas ideias, mas pelo tamanho do bolso".
Nesse baile da Ilha Fiscal do século XXI, o prefeito da maior cidade da América do Sul, em carreira solo, rompe com sua banda originária e declara-se disposto a formar outra – a trigésima do Brasil. Os sets de dança ainda não foram selecionados, pois não está claro o gosto dos convivas. O crooner do Partido Sem Definição promete música para todo gosto: nem esquerda nem direita, nem governo nem oposição. E, dois pra lá, dois pra cá, referencia-se em JK, irritando a família do saudoso pé de valsa, ao tocar de ouvido o governismo de quem não existe sem a companhia do poder: "Como pode o peixe vivo viver fora da água fria?" Haja fôlego para tanto trombone, sax e trompete...
Súbito, a percussão se agiganta, anunciando mais embalo na festança. Com a tranquilidade de quem toca o violino afinado não mais em palhoças mas em palácios, a voz hoje silente do conselheiro de mansões pouco civis recomendava ao par interesse público-negócio privado que dançasse bem colado. Quando as garrafas das barganhas partidárias já entulham mesas e os dançarinos parecem começar a se cansar dos hits da podridão, eis que adentram o sarau, animadíssimos, os fichas-sujas de 2010! Brotos de barbalhos, tocando bumbos, pandeiros e chocalhos. Tiram cordas – não tão apertadas – do pescoço, para fazê-las vibrar, agudas, no baixo, em violões e guitarras. Ninguém mais irá segurá-los na portaria, pois sua credencial vem da alta Corte, na qual seis músicos eruditos definiram a partitura na contramão do coral de milhões de cidadãos, de muitos tribunais e do Ministério Público Federal. Apoteose da politicalha, murmuram os cansados com tamanho chá de cadeira. Saudosistas do romantismo pré-delubiano observam, desolados, o revival do antigo sucesso que atravessa, pelo esquecimento, a harmonia da ética: "É ou não é, piada de salão?" Para quem quer festa de largo, forró pé de serra e samba na praça, a Reforma Política, em novos cenários, oferecerá tons mais adequados? Afinal, os músicos serão os mesmos de agora, pagos pelos que só querem a dança inter pares, para sua própria diversão.
Mas está em curso um debate, sobre propostas de Reforma Política apresentadas pela plataforma dos movimentos sociais. Também a Frente Parlamentar de Combate à Corrupção listou 94 projetos que reforçam os controles contra o roubo de dinheiro público e pressiona por sua votação. Daí sairá o ritmo para mudanças reais no nosso sistema político, para o qual se busca mobilização similar à da Lei da Ficha Limpa. A multidão de barrados no baile dos 'eleitos' precisa, enfim, tocar seu próprio instrumento, compor sua canção e dançar no balanço afroguarani, eurotupi e judárabe tão brasileiro. Só assim conquistaremos uma democracia de alta intensidade, e a festa infame dos refestelados com dinheiro público começará a acabar.
09/06/2011
Fonte: Congresso em Foco
A DESFAÇATEZ DA MÁQUINA PÚBLICA
O recente e tímido anúncio por parte do governo municipal do aumento do funcionalismo da ordem de 7%, insuficiente para cobrir a defasagem ocorrida ao longo dos anos, permite algumas reflexões.
Os defensores do executivo municipal se apressaram em dizer que foi o esforço possível, dentro da realidade financeira do município, tendo em vista, as limitações impostas pela famigerada e engessadora Lei de Responsabilidade Fiscal.
Ainda assim, ficou muito claro o desconforto de vários setores do governo, diante da visível decepção daqueles funcionários que verdadeiramente trabalham e fazem funcionar a máquina pública em benefício da população.
Nenhuma política complementar foi anunciada para tentar avaliar possibilidades de valorização diante de salários tão baixos.
A Lei de Responsabilidade Fiscal vendida para o povo como eficaz instrumento de controle de gastos públicos, esconde mecanismos de cortes nos investimentos sociais para gerar superávits fiscais para pagamento de juros da dívida pública. Aplica também um limitador nos gastos com a folha de pagamento, inviabilizando a contratação de servidores por concurso, mas permite a terceirização fraudulenta e as empreiteiras superfaturadas. Trata-se de um bom debate para um outro texto.
A verdadeira causa do baixo índice de aumento é o “inchaço da máquina” com a excessiva contratação de cargos comissionados e portarias, grande parte delas com interesse político privado.
Criam-se grandes estruturas no comando com farta distribuição de cargos aos amigos do poder, alguns inclusive, sem capacitação técnica para exercê-los, e com salários bem acima da média do funcionalismo municipal.
Criam-se também inúmeras portarias “baixo clero” para os cabos eleitorais que operam politicamente para vereadores e secretários com futuras pretensões de poder. Gente que jamais prestou qualquer serviço a coletividade e mamam nas tetas do governo descaradamente, sob o olhar complacente de grande parte do eleitorado, que mesmo admitindo que isto acontece, nada faz para mudar este modelo de má gestão do dinheiro público. Alguns inclusive, torcem pela derrubada de alguns portariados para ver se não entram também na “boquinha”, dependendo da troca de comando no governo. Trocam os comandantes, mas o embuste político permanece.
Cabe ao verdadeiro funcionário público, principalmente aos concursados, que tem independência, dar um basta nesta situação através da ação soberana do voto. A outra alternativa é ficar lamentando nas praças, nos bares e nos encontros do dia a dia.
Seria importante também que parte da sociedade civil organizada que percebe o funcionamento deste esquema que se apropria dos recursos públicos em benefíciodo interesse privado pudesse se mobilizar e participar de um movimento de mudança real para romper com esta estrutura viciada.
O momento já não é mais de meias-medidas e omissão leniente.
O bem público tem que pertencer a todos e não a uma elite covarde que enriquece velozmente em detrimento do empobrecimento de grande parte da população.
“Confundir o público com o privado é o mais reles equívoco de quem exerce uma função pública representativa.”
Maria Ângela Coelho Mirault Pinto
Cláudio Leitão é economista, propagandista, dirigente sindical e presidente do diretório municipal do PSOL em Cabo Frio.
Os defensores do executivo municipal se apressaram em dizer que foi o esforço possível, dentro da realidade financeira do município, tendo em vista, as limitações impostas pela famigerada e engessadora Lei de Responsabilidade Fiscal.
Ainda assim, ficou muito claro o desconforto de vários setores do governo, diante da visível decepção daqueles funcionários que verdadeiramente trabalham e fazem funcionar a máquina pública em benefício da população.
Nenhuma política complementar foi anunciada para tentar avaliar possibilidades de valorização diante de salários tão baixos.
A Lei de Responsabilidade Fiscal vendida para o povo como eficaz instrumento de controle de gastos públicos, esconde mecanismos de cortes nos investimentos sociais para gerar superávits fiscais para pagamento de juros da dívida pública. Aplica também um limitador nos gastos com a folha de pagamento, inviabilizando a contratação de servidores por concurso, mas permite a terceirização fraudulenta e as empreiteiras superfaturadas. Trata-se de um bom debate para um outro texto.
A verdadeira causa do baixo índice de aumento é o “inchaço da máquina” com a excessiva contratação de cargos comissionados e portarias, grande parte delas com interesse político privado.
Criam-se grandes estruturas no comando com farta distribuição de cargos aos amigos do poder, alguns inclusive, sem capacitação técnica para exercê-los, e com salários bem acima da média do funcionalismo municipal.
Criam-se também inúmeras portarias “baixo clero” para os cabos eleitorais que operam politicamente para vereadores e secretários com futuras pretensões de poder. Gente que jamais prestou qualquer serviço a coletividade e mamam nas tetas do governo descaradamente, sob o olhar complacente de grande parte do eleitorado, que mesmo admitindo que isto acontece, nada faz para mudar este modelo de má gestão do dinheiro público. Alguns inclusive, torcem pela derrubada de alguns portariados para ver se não entram também na “boquinha”, dependendo da troca de comando no governo. Trocam os comandantes, mas o embuste político permanece.
Cabe ao verdadeiro funcionário público, principalmente aos concursados, que tem independência, dar um basta nesta situação através da ação soberana do voto. A outra alternativa é ficar lamentando nas praças, nos bares e nos encontros do dia a dia.
Seria importante também que parte da sociedade civil organizada que percebe o funcionamento deste esquema que se apropria dos recursos públicos em benefíciodo interesse privado pudesse se mobilizar e participar de um movimento de mudança real para romper com esta estrutura viciada.
O momento já não é mais de meias-medidas e omissão leniente.
O bem público tem que pertencer a todos e não a uma elite covarde que enriquece velozmente em detrimento do empobrecimento de grande parte da população.
“Confundir o público com o privado é o mais reles equívoco de quem exerce uma função pública representativa.”
Maria Ângela Coelho Mirault Pinto
Cláudio Leitão é economista, propagandista, dirigente sindical e presidente do diretório municipal do PSOL em Cabo Frio.
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