quarta-feira, 24 de junho de 2015

A PONTUALIDADE COM A DÍVIDA PÚBLICA E O CALOTE NA DÍVIDA SOCIAL




A PONTUALIDADE COM A DÍVIDA PÚBLICA E O CALOTE NA DÍVIDA SOCIAL

Caros leitores, conforme prometido num post anterior, fugindo um pouco das questões políticas locais, até mesmo porque a mesmice impera na cidade com as velhas práticas não republicanas que se repetem há 20 anos, quero novamente forçar um debate esquecido(de propósito) pela grande mídia e por setores importantes da nossa sociedade civil organizada: A Dívida Pública Brasileira.

Acho importante fazermos uma análise de alguns dados obtidos através da Auditoria Cidadã da Dívida:

1. A dívida externa paga por Lula em seu primeiro mandato restringiu-se à dívida de US$ 15,5 bilhões ao FMI. Todo o restante da dívida externa continua aí, aumentando velozmente. O pagamento ao FMI rendeu muitos frutos políticos, apesar de ter sido uma medida danosa às finanças do país, pois a dívida com o FMI era pactuada a juros de 4% ao ano. Para pagá-la, o governo emitiu dívida interna que na época pagava juros de 19% ao ano. E o pior, apesar de quitar a dívida financeira com o FMI, continuamos atrelados de forma disfarçada às suas imposições de realização de reformas neoliberal. O atual ajuste fiscal está aí para confirmar este fato.

2. A dívida interna já ultrapassou a casa dos R$ 2.9 trilhões e está em grande parte nas mãos de estrangeiros que trazem seus dólares para aplicar em títulos da dívida interna que pagam uma das maiores taxas de juros do mundo. Neste momento a maior, fruto do recente aumento da taxa Selic. O Banco Central fica com os dólares e os aplica em reservas internacionais, especialmente em títulos da dívida norte-americana, que não rendem quase nada ao país. É por isso que o prejuízo operacional do Banco Central em 2014 foi da ordem de R$ 109 bilhões. A expectativa é que aumente para 2015.

3. O pagamento de juros e amortizações da dívida pública interna em 2015 consumiu cerca de 750 bilhões de reais, à custa da subtração de recursos de todas as demais rubricas, inclusive nas áreas sociais, além de emissão de nova dívida.

4. AMEAÇAS EM ANDAMENTO: O atual governo federal continua aplicando medidas para restringir gastos sociais para possibilitar o pagamento dos juros dessa monstruosa dívida pública. É o tal ajuste fiscal que penaliza o trabalhador para atingir a meta do superávit primário, pactuado com os donos do capital.

a. PLP 549/2009, que congela os salários dos servidores públicos por 10 anos, enquanto a dívida pública recebe remuneração garantida todos os anos pelos maiores juros do mundo;
b. Anúncio pelo Ministério da Previdência, da “necessidade” de nova Reforma da Previdência dos servidores e regime geral, aumentando ainda mais a idade para aposentadoria e redução de benefícios ( importante ressaltar que Dilma na semana passada vetou projeto de lei aprovado pelo Congresso, “85/95”, que amenizava os danos do fator previdenciário e o Presidente Lula vetou no dia da estreia do Brasil na Copa do Mundo em 2010 o fim do fator que também havia sido aprovado no Congresso Nacional);
c. PEC 233/2008, que propõe uma reforma tributária que altera o financiamento da Seguridade Social, transformando as contribuições sociais que tem destinação vinculada por determinação constitucional, em impostos, que não tem vinculação e o governo pode direcionar para várias outras áreas.
d. Limitação dos “gastos primários”, ou seja, limitação de vários gastos sociais, inclusive o seguro desemprego e o auxílio-doença, enquanto para os gastos com a dívida não são estabelecidos quaisquer limites.

5. CPI DA DÍVIDA NA CÂMARA DOS DEPUTADOS: A CPI da Dívida Pública realizada na Câmara dos Deputados em 2010 ( Vocês ouviram falar dela ?) foi completamente “abafada” pelo Congresso e pela grande mídia, mas realizou importantes descobertas, tendo apontado uma série de graves indícios de ilegalidades e ilegitimidades no processo de endividamento brasileiro. O Relatório Final da CPI reconheceu em seu diagnóstico:

a. As elevadíssimas taxas de juros (não civilizadas) foi o fator mais importante para o crescimento da dívida, inclusive dos estados e municípios;
b. A dívida interna cresceu nos últimos anos para financiar a compra de dólares das reservas internacionais, com grande custo para as contas públicas. A desculpa do controle inflacionário é apenas razão secundária e pouco efetiva.
c. O Senado Federal renunciou a sua competência constitucional, pois permitiu emissões de títulos sem especificar suas características;
d. Falta de transparência na divulgação dos números da dívida, bem como falta de informações e documentos à CPI.

6. GRAVE DIAGNÓSTICO DA CPI: Apesar do grave diagnóstico, contraditoriamente o Relatório Final não admitiu ter encontrado irregularidades no endividamento, não recomendou a auditoria da dívida (prevista na Constituição) e também não recomendou acionar o Ministério Público para o aprofundamento das investigações. Porém, a pressão de entidades da sociedade civil que acompanharam os trabalhos da CPI, fez com que somente 1/3 dos 24 membros da CPI votassem a favor deste “Relatório-Pizza”, que foi aprovado pelo apertado placar de 8 a 5.

7. RELATÓRIO ALTERNATIVO DA CPI JÁ ENTREGUE AO MINISTÉRIO PÚBLICO: A pressão das entidades também fez com que 8 deputados da CPI assinassem o “Voto em Separado” do Dep. Ivan Valente (PSOL/SP), que pede a auditoria da dívida e o encaminhamento ao Ministério Público de diversos indícios de ilegalidades apuradas, dentre elas:
• Juros sobre Juros (Anatocismo), ilegal segundo o STF;
• Juros flutuantes na dívida externa, ilegais segundo a Convenção de Viena;
• Ausência de contratos e documentos; ausência de conciliação de cifras; clausulas ilegítimas;
• A grande destinação dos recursos orçamentários para o pagamento da dívida viola os direitos humanos e sociais;
• O Banco Central faz reuniões com os bancos e outros rentistas para definir as previsões de inflação que por sua vez definem as taxas de juros.
* Este “Voto em Separado” foi entregue ao Ministério Público Federal para que fossem aprofundadas as investigações e elaboradas as ações judiciais cabíveis. Até hoje “dorme tranquilo” nas gavetas do MPF.

8. PRIVILÉGIO DOS PAGAMENTOS DA DÍVIDA: A despeito das diversas ilicitudes apontadas pela CPI, o pagamento do serviço da dívida goza de imenso privilégio, em detrimento do sacrifício do povo brasileiro, que arca com elevada carga tributária e não recebe o devido retorno em serviços públicos, tendo em vista, os crescentes contingenciamentos efetuados para produzir o superávit primário. Merece ser lembrada a denúncia do Professor da UNB, Adriano Benayon, no seu livro “Anatomia de uma fraude à Constituição” (já citado anteriormente neste blog), onde cita a ação fraudulenta do ex-deputado e ex-ministro Nelson Jobim, na época da Constituinte, subrelator da Comissão de Sistematização, que a serviço da banca financeira, introduziu um inciso não aprovado e não votado, garantindo o pagamento do serviço da dívida como uma obrigação do Orçamento no mesmo nível da dotação de pessoal e transferência de recursos a Estados e Municípios.
Diversas outras fontes alimentam o pagamento dos juros e amortizações da dívida, principalmente os seguintes:

a- Lucros das estatais (por isso é que elas se endividam para realizar investimentos). Apesar de altamente lucrativas, a maior parte de seus lucros não são destinados a reinvestimentos, mas sim para pagar dívida.
b- Lucro do Banco Central. Quando há lucro, esse vai para pagar dívida; quando dá prejuízo, o Tesouro Nacional cobre com recursos decorrentes de excesso de arrecadação ou emissão de novos títulos da dívida, ou até, através das recentes e famosas “pedaladas fiscais”, usando recursos do FGTS e do FAT para cobrir estes rombos. Lembrando que os recursos do FGTS e FAT são recursos do trabalhador.
c- Recebimento de juros e amortizações da questionável dívida dos estados e municípios com a União, um sacrifício dos entes federados, pois cerca de 13% de suas receitas são destinadas para o pagamento da dívida por imposição da “famosa” LRF- Lei de Responsabilidade Fiscal, que muita gente elogia, mas nunca tiveram o trabalho de ler e perceber suas reais intenções.
d- Emissão de novos títulos;
e- As Medidas Provisórias 435 e 450 (já foram transformadas em lei) determinam que toda sobra de recursos orçamentários vinculados por lei a áreas sociais que não chegaram a ser executados podem ser destinados ao pagamento da dívida. Assim ao final do ano, há uma “limpa geral” no caixa e os recursos vão para pagar juros e amortizações, através do famigerado superávit primário.

9. SANGRIA DE RECURSOS PARA O PAGAMENTO DA DÍVIDA: Apesar da sangria anual de recursos para o pagamento de juros e amortizações da dívida pública, esta não para de crescer, tendo ultrapassado a marca histórica dos R$ 2.9 trilhões neste final de 2014, enquanto a dívida externa ultrapassou a também marca histórica dos US$ 500 bilhões. É evidente que quanto maior o estoque da dívida, maior será a exigência de recursos para cumprir com os pagamentos de juros e amortizações.
Em 2014, os juros e amortizações da dívida consumiram 43,5% dos recursos do Orçamento Geral da União. Enquanto isso, para a Saúde foram destinados apenas 4,24%, para a Educação 3,98% e para Saneamento somente 0,08%. Não é a toa que mais da metade dos brasileiros sequer tem acesso a saneamento básico.

Para que se compreenda a lógica deste “cassino”, o governo Lula recebeu a dívida pública do FHC em 600 bilhões de reais, pagou ao longo dos oito anos, 1.3 trilhões de reais só de juros e deixou como herança para o governo Dilma a estratosférica cifra de 1.8 trilhões de reais. Nestes 04 anos de governo, apesar do pagamento de quase 2 trilhões de reais de juros, a dívida já ultrapassa 2.9 trilhões. É uma "conta de maluco". É impagável !

Peço desculpas pelo excesso de números, mas acredito que eles possam fazer a gente pensar um pouco, até porque durante as eleições presidenciais os “ditos principais candidatos”, Dilma e Aécio, jamais passaram perto deste tema na campanha e nos debates. As bases macroeconômicas estão mantidas para a alegria e regozijo da banca financeira nacional e transnacional.

E o povo ?
Bem, o povo aguenta calado, até porque em sua grande maioria desconhece os mecanismos que o faz cada vez mais explorado e oprimido, reelegendo para mandatos sucessivos em todas as esferas de poder, do município a união, aqueles que apertam cada vez mais o “nó do seu cadafalso”.

Aguenta povo brasileiro. UFA !!


Cláudio Leitão é economista, graduando em história e membro da executiva municipal do PSOL em Cabo Frio.

4 comentários :

  1. Leitão, muito bom o seu esforço de levantar este debate e colocar estes valores para conhecimento do maior número de pessoas possíveis. Já tinha visto estes dados num artigo da prof. Fatorrelli, mas não tira o seu mérito. Firme na luta.
    Paulo Campos.

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    1. Sim meu caro, os dados são da Auditoria Cidadã da Dívida. No final busquei chamar atenção para uma reflexão sobre eles. Valeu.

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  2. Leitão. Quando teremos no blog a sua opinião sobre a "ideologia de gêneros", afinal foi o assunto da semana na Câmara.

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    1. Sou a favor do projeto e vou me manifestar de forma mais objetiva na próxima "Rapidinhas" e de forma mais detalhada no próximo "Notícias, Opiniões e Fatos. Alguns segmentos conservadores e evangélicos estão fazendo uma grande confusão com o projeto, se equivocando em algumas definições conceituais. Sou a favor de uma educação inteiramente libertária.

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