terça-feira, 15 de dezembro de 2015

O BOTECO DO PT




Sentado no Boteco do PT, entre 2003 e 2014, o brasileiro escolheu iguarias no cardápio, fartou-se e dependurou a conta – que chegou em 2015! O freguês se espantou: como? Os preços do cardápio eram baratos!

Ora, explicou a gerente do boteco, já não tenho crédito e tudo sobe – a luz, o gás, o telefone. Veja a inflação! Acha que compro, hoje, alimentos pelo mesmo preço que no passado? Já tive que despedir vários empregados.

A crise brasileira é a crise da democracia virtual que predomina no Ocidente. Desde quando se introduziu o sufrágio universal, a suposta democracia política jamais coincidiu com efetiva democracia econômica.

Na economia capitalista não existe democracia. Existe apropriação privada, competitividade, submissão aos ditames do mercado e não aos interesses da nação. Todas as vezes que se fala em democratizar a economia, como uma simples distribuição de renda, as elites puxam as armas – golpes de Estado, evasão de divisas, guerras. Hitler e Mussolini que o digam. Jamais teriam feito o que fizeram se não tivessem contado, no início de seus mandatos, com a cumplicidade das elites europeias e estadunidenses.

O PT conhecia as regras do jogo da democracia virtual. Por isso, lançou a carta ao poder econômico na campanha presidencial de 2002, conhecida como “Carta ao povo brasileiro”. Em 12 anos de governo, o Partido não promoveu nenhuma reforma estrutural, para não ameaçar o quinhão das elites. No entanto, implantou políticas sociais que, de fato, livraram da miséria 45 milhões de brasileiros.

A falta de reformas, como a agrária, impediu que as políticas sociais ganhassem sustentabilidade. E o Brasil prosseguiu na dependência do modelo econômico neocolonial: exportação de produtos primários e matérias-primas (hoje, commodities), captação de capital externo etc. Basta lembrar que, nos últimos 12 meses, o governo pagou ao sistema financeiro, de juros da dívida pública, R$ 510 bilhões, cinco vezes mais que o orçamento anual da Saúde, que é de R$ 100 bilhões.

O poder econômico aceita tudo, menos a redução de sua margem de lucros. Por isso, compra políticos e juízes, contrata lobistas, distribui propinas, interfere nas leis, manipula o noticiário.

Acuado, o governo, vendo o boteco vazio, entregou a ele o controle da política econômica – o ajuste fiscal, que penaliza apenas os mais pobres. Ora, o poder econômico é ganancioso. Agora quer também o poder político. Daí a tentativa de impeachment de Dilma, cujo fiador é o PMDB.

O PMDB vive o drama hamletiano: presidir ou não, agora, o Brasil? Se Michel Temer deixar passar o cavalo encilhado que se apresenta à sua porta, pode perder a única oportunidade de se tornar presidente e, quem sabe, retornar eleito em 2018 se lograr salvar o boteco da falência.

Se montar, sabe que corre o risco de ter em mãos um boteco inadimplente, com a crise se arrastando até 2018, vários partidos da base aliada lhe fazendo oposição, e o Executivo obrigado a saciar a gula infindável de seus correligionários por cargos e benesses.

Quem sobreviver, verá.


Frei Betto é escritor.

3 comentários :

  1. Excepcional artigo do Frei Betto. Em poucas palavras mostrou o que o PT representa durante o período que governa e o retrato para o país. Suas seleção de artigos são sempre muito boas. Parabéns.
    Paulo Campos.

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    1. Concordo Paulo, um dos melhores textos do Frei Betto que já li.
      Abraço.

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  2. Sem querer discutir Frei Betto, entendo que não é justo "dependurar" a conta desse botequim no prego do PT, senão a de não ter feito aquilo a que se propunha enquanto postulante ao cargo máximo executivo do país.
    É obvio que descumpriu promessas de campanha, assim como "neoliberalizou" o trabalhador brasileiro, inclusive negligenciando premissas da Organização Internacional do Trabalho – OIT. Mormente também não reviu os nefastos PDV promovidos pelos dois Fernandos: o Collor e o Henrique, quando trabalhadores foram atirados desempregados à própria sorte. (saiba mais em www.upd.net.br )
    A dialética Capital x Trabalho remonta à antiguidade, agravando-se sobremaneira com a Revolução Industrial, onde os “microempreendores” da época (ferreiros, ferramenteiros, padeiros, etc.) deixaram de ser autônomos e passaram a trabalhar em troca de salários.
    Ter conta pregada no boteco não é privilégio do PT, ali existem tantos pregos quanto os que o TSE autoriza colocar. Uns enferrujados por falta de uso, outros muito utilizados permanecem limpinhos e conservados. Há ainda os maiores e menores, conforme a quantidade de contas pregadas.
    Hoje temos um senador do PT preso, um ex-governador do PSDB condenado a vinte anos de prisão, um mega empreiteiro da Odebrecht encarcerado querendo passar o Natal com a família e um louco do PMDB ainda solto na presidência da Câmara Federal, todos envolvidos em escândalos magníficos, cuja fartura de dinheiro é maior que qualquer orçamento de muitos estados brasileiros, quiçá de muitos países do mundo.
    Nunca a Polícia Federal trabalhou tanto, e se trabalhou a gente não ficou sabendo, porque havia um “Engavetador Geral da República” que trabalhava por todos. Glória do PT? Não, glória de um juiz que sabe o significado da toga que veste. Ao PT cabe apenas a demissão do tal engavetador que, por certo, deve estar sendo investigado na lista do mensalão ou na lista da lava-jato.
    CESAR MONDAINI COUTINHO
    Contador

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