segunda-feira, 15 de dezembro de 2014

A PONTUALIDADE COM A DÍVIDA PÚBLICA E O CALOTE NA DÍVIDA SOCIAL




A PONTUALIDADE COM A DÍVIDA PÚBLICA E O CALOTE NA DÍVIDA SOCIAL.

Caros leitores, conforme prometido num post anterior e fugindo um pouco das questões políticas locais, até mesmo porque a mesmice impera em nossa bela Cabo Frio com a repetição de velhas práticas, como por exemplo, falta de transparência, nepotismo, violência urbana crescente, obras faraônicas, perdulárias e não prioritárias e a sinalização da continuidade de ações políticas conservadoras, evidenciando que houve uma mudança de seis por meia dúzia, quero novamente forçar um debate esquecido (de propósito) pela grande mídia e por setores importantes da nossa sociedade civil organizada.

A Dívida Pública Brasileira.

A análise de alguns dados obtidos através da Auditoria Cidadã da Dívida:

1. A dívida externa paga por Lula em seu primeiro mandato restringiu-se à dívida de US$ 15,5 bilhões ao FMI. Todo o restante da dívida externa continua aí, aumentando velozmente. O pagamento ao FMI rendeu muitos frutos políticos, apesar de ter sido uma medida danosa às finanças do país, pois a dívida com o FMI era pactuada a juros de 4% ao ano. Para pagá-la, o governo emitiu dívida interna que na época pagava juros de 19% ao ano. E o pior, apesar de quitar a dívida financeira com o FMI, continuamos atrelados às suas imposições de realização de reformas neoliberais.

2. A dívida interna já ultrapassou a casa dos R$ 2.9 trilhões e está em grande parte nas mãos de estrangeiros que trazem seus dólares para aplicar em títulos da dívida interna que pagam uma das maiores taxas de juros do mundo. O Banco Central fica com os dólares e os aplica em reservas internacionais, especialmente em títulos da dívida norte-americana, que não rendem quase nada ao país. É por isso que o prejuízo operacional do Banco Central em 2013 foi da ordem de R$ 129 bilhões. A expectativa é que aumente para 2014.

3. O pagamento de juros e amortizações da dívida pública interna em 2014 consumiu cerca de 950 bilhões de reais, à custa da subtração de recursos de todas as demais rubricas, inclusive nas áreas sociais, além de emissão de nova dívida.

4. AMEAÇAS EM ANDAMENTO: O atual governo federal continua aplicando medidas para restringir gastos sociais para possibilitar o pagamento dos juros dessa monstruosa dívida pública. Algumas medidas já estão em fase de aprovação no Congresso:

a. PLP 549/2009, que congela os salários dos servidores públicos por 10 anos, enquanto a dívida pública recebe remuneração garantida todos os anos pelos maiores juros do mundo;
b. Anúncio pelo Ministério da Previdência, da “necessidade” de nova Reforma da Previdência dos servidores e regime geral, aumentando ainda mais a idade para aposentadoria e redução de benefícios ( importante ressaltar que o Presidente Lula vetou no dia da estréia do Brasil na Copa do Mundo em 2010 o fim do fator previdenciário que havia sido aprovado no Congresso Nacional);
c. PEC 233/2008, que propõe uma reforma tributária que altera o financiamento da Seguridade Social, transformando as contribuições sociais que tem destinação vinculada por determinação constitucional, em impostos, que não tem vinculação e o governo pode direcionar para várias outras áreas.
d. Limitação dos “gastos primários”, ou seja, limitação de vários gastos sociais, inclusive o crédito agrícola, seguro desemprego e o auxílio-doença, enquanto para os gastos com a dívida não são estabelecidos quaisquer limites.

5. CPI DA DÍVIDA NA CÂMARA DOS DEPUTADOS: A CPI da Dívida Pública realizada na Câmara dos Deputados em 2010 por iniciativa do PSOL ( Vocês ouviram falar dela ?) foi completamente “abafada” pelo Congresso e pela grande mídia, mas realizou importantes descobertas, tendo apontado uma série de graves indícios de ilegalidades e ilegitimidades no processo de endividamento brasileiro. O Relatório Final da CPI reconheceu em seu diagnóstico:

a. As elevadíssimas taxas de juros (não-civilizadas) foi o fator mais importante para o crescimento da dívida, inclusive dos estados e municípios;
b. A dívida interna cresceu nos últimos anos para financiar a compra de dólares das reservas internacionais, com grande custo para as contas públicas. A desculpa do controle inflacionário é apenas razão secundária e pouco efetiva.
c. O Senado Federal renunciou a sua competência constitucional, pois permitiu emissões de títulos sem especificar suas características;
d. Falta de transparência na divulgação dos números da dívida, bem como falta de informações e documentos à CPI.

6. GRAVE DIAGNÓSTICO DA CPI: Apesar do grave diagnóstico, contraditoriamente o Relatório Final não admitiu ter encontrado irregularidades no endividamento, não recomendou a auditoria da dívida (prevista na Constituição) e também não recomendou acionar o Ministério Público para o aprofundamento das investigações. Porém, a pressão de entidades da sociedade civil que acompanharam os trabalhos da CPI, fez com que somente 1/3 dos 24 membros da CPI votassem a favor deste “Relatório-Pizza”, que foi aprovado pelo apertado placar de 8 a 5.

7. RELATÓRIO ALTERNATIVO DA CPI JÁ ENTREGUE AO MINISTÉRIO PÚBLICO: A pressão das entidades também fez com que 8 deputados da CPI assinassem o “Voto em Separado” do Dep. Ivan Valente (PSOL/SP), que pede a auditoria da dívida, e o encaminhamento ao Ministério Público de diversos indícios de ilegalidades apuradas, dentre elas:
• Juros sobre Juros (Anatocismo), ilegal segundo o STF;
• Juros flutuantes na dívida externa, ilegais segundo a Convenção de Viena;
• Ausência de contratos e documentos; ausência de conciliação de cifras; clausulas ilegítimas;
• A grande destinação dos recursos orçamentários para o pagamento da dívida viola os direitos humanos e sociais;
• O Banco Central faz reuniões com os bancos e outros rentistas para definir as previsões de inflação que por sua vez definem as taxas de juros.
* Este “Voto em Separado” foi entregue ao Ministério Público para que fossem aprofundadas as investigações e elaboradas as ações judiciais cabíveis. Até hoje “dorme tranquilo” nas gavetas do MP.

8. PRIVILÉGIO DOS PAGAMENTOS DA DÍVIDA: A despeito das diversas ilicitudes apontadas pela CPI, o pagamento do serviço da dívida goza de imenso privilégio, em detrimento do sacrifício do povo brasileiro, que arca com elevada carga tributária e não recebe o devido retorno em serviços públicos, tendo em vista, os crescentes contingenciamentos efetuados para produzir o superávit primário. Merece ser lembrada a denúncia do Professor da UNB, Adriano Benayon, no seu livro “Anatomia de uma fraude à Constituição” (já citado anteriormente neste blog), onde cita a ação fraudulenta do ex-deputado e ex-ministro Nelson Jobim, na época da Constituinte, sub-relator da Comissão de Sistematização, que a serviço da banca financeira, introduziu um inciso não aprovado e não votado, garantindo o pagamento do serviço da dívida como uma obrigação do Orçamento no mesmo nível da dotação de pessoal e transferência de recursos a Estados e Municípios.

9 - Diversas outras fontes alimentam o pagamento dos juros e amortizações da dívida, principalmente os seguintes:

a- Lucros das estatais (por isso é que elas se endividam para realizar investimentos). Apesar de altamente lucrativas, a maior parte dos seus lucros não são destinados a reinvestimentos, mas sim para pagar dívida);
b- Lucro do Banco Central. Quando há lucro, esse vai para pagar dívida; quando dá prejuízo, o Tesouro Nacional cobre com recursos decorrentes de excesso de arrecadação ou emissão de novos títulos da dívida;
c- Recebimento de juros e amortizações da questionável dívida dos estados e municípios com a União, um sacrifício dos entes federados, pois cerca de 13% de suas receitas são destinadas para o pagamento da dívida;
d- Emissão de novos títulos;
e- As Medidas Provisórias 435 e 450 (já foram transformadas em lei) determinam que toda sobra de recursos orçamentários vinculados por lei a áreas sociais que não chegaram a ser executados podem ser destinados ao pagamento da dívida. Assim ao final do ano, há uma “limpa geral” no caixa e os recursos vão para pagar juros e amortizações, através do famigerado superávit primário.

10 - SANGRIA DE RECURSOS PARA O PAGAMENTO DA DÍVIDA: Apesar da sangria anual de recursos para o pagamento de juros e amortizações da dívida pública, esta não para de crescer, tendo ultrapassado a marca histórica dos R$ 2.9 trilhões neste final de 2014, enquanto a dívida externa ultrapassou a também marca histórica dos US$ 500 bilhões. É evidente que quanto maior o estoque da dívida, maior será a exigência de recursos para cumprir com os pagamentos de juros e amortizações.
Em 2014, os juros e amortizações da dívida consumiram 45% dos recursos do Orçamento Geral da União. Enquanto isso, para a Saúde foram destinados apenas 4,24%, para a Educação 3,98% e para Saneamento somente 0,08%. Não é a toa que mais da metade dos brasileiros sequer tem acesso a saneamento básico.

Para que se compreenda a lógica deste “cassino”, o governo Lula recebeu a dívida pública do FHC em 600 bilhões de reais, pagou ao longo dos oito anos, 1.3 trilhões de reais só de juros e deixou como herança para o governo Dilma a estratosférica cifra de 1.8 trilhões de reais. Nestes 04 anos de governo, apesar do pagamento de quase 2 trilhões de reais de juros, a dívida já ultrapassa 2.9 trilhões.

É impagável.

Peço desculpas pelo excesso de números, mas acredito que eles possam fazer a gente pensar um pouco, até porque durante as eleições presidenciais os “ditos principais candidatos”, Dilma e Aécio, jamais passaram perto deste tema na campanha e nos debates. As bases macroeconômicas estão mantidas para a alegria e regozijo da banca financeira nacional e transnacional.

E o povo ?
Bem, o povo aguenta calado, até porque em sua grande maioria desconhece os mecanismos que o faz cada vez mais explorado e oprimido, reelegendo para mandatos sucessivos aqueles que apertam cada vez mais o “nó do seu cadafalso”.

Aguenta povo brasileiro. UFA !!

Cláudio Leitão é economista, graduando em história e membro da executiva municipal do PSOL em Cabo Frio.

Um comentário :

  1. Parabéns pela belíssima análise! Seu blog é uma aula de história, cidadania e comprometimento com os trabalhadores, funcionários públicos, classe oprimida e grupos marginalizados. O meu voto e o da minha família é seu!

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